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Talibans portugueses

Há uns dias referi a recente vitória civilizacional na Colômbia em que, contra os violentos protestos dos dignitários católicos neste país, foi reconhecido pelo Tribunal Constitucional a inconstitucionalidade da lei que criminalizava o aborto em todas as circunstâncias. De facto, esta lei violava os tratados internacionais subscritos por aquele país, nomeadamente a declaração internacional dos direitos do homem, que reconhece a todos o direito à vida e à saúde. A criminalização do aborto no caso em que a saúde ou mesmo a vida da mulher está em risco se a gravidez não for interrompida é uma clara violação destes direitos.

Para a misógina Igreja de Roma só a mera menção de direitos da mulher, nomeadamente o direito à vida, é uma heresia abominável, já que a mulher (excepto no estado embrionário ou fetal) é um sub-humano sem direitos, como implícito nas declarações do Cardeal Alfonso Lopez Trujillo, o dignitário colombiano que acha ser o vírus HIV mais pequeno que um átomo de hélio, já que afirma serem os preservativos permeáveis ao vírus causador da SIDA. O responsável pelo Conselho Pontifical da Família disse à rádio RCN (colombiana) que a decisão de despenalizar o aborto para salvar a vida da gestante foi «um ataque à vida humana».

Seguindo escrupulosamente as indicações do Vaticano neste tema, os piedosos clérigos colombianos já fizeram saber que o aborto é um «pecado» mortal em qualquer circunstância e que uma «boa» mulher católica deve optar por morrer no caso de a sua vida estar em risco por uma gravidez. Para além de considerarem o apelo à desobediência civil à lei, que tem poucas hipóteses de sucesso, os piedosos bispos já fizeram saber que a retaliação para o caso da não acatação das ordens do Vaticano neste país da América do Sul, supostamente laico, será a excomunhão.

Para aqueles que consideram que esta posição incompreensível da ICAR, atentória dos mais básicos princípios morais e civilizacionais, que atribui maior valor a uma célula, um óvulo fecundado, ou a um conjunto de células (o embrião) que a uma mulher, se restringe a países do Terceiro Mundo convém recordar as declarações recentes de Augusto Lopes Cardoso, o mui católico antigo bastonário da Ordem dos Advogados e actual docente da Universidade Católica, subscritor nas últimas eleições de uma carta aberta aos eleitores católicos apelando explicitamente ao voto na direita (apelo ainda mais explícito feito pela Associação Fiducia)*.

Lopes Cardoso defendeu liminarmente a imoral, diria mesmo criminosa, posição de Roma afirmando:

«Em circunstância alguma é admissível a prática de aborto. Nem mesmo quando a saúde da mãe é colocada em risco ou são diagnosticadas más formações nos fetos

*«Diante destas considerações, lançamos aqui um apelo a todos os portugueses: debatam, elucidem os seus círculos familiares, as suas relações sociais e profissionais a respeito do que verdadeiramente está em causa nas eleições do próximo dia 20 de Fevereiro: os valores básicos de uma civilização autenticamente cristã. Não cremos que seja legítimo e patriótico dar o voto a partidos cujos programas preconizem a aprovação de leis que atentem contra a essência da própria ordem moral».

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