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Luis Rodrigues e as duas cachopas casadoiras

Hoje, o mais recente colaborador do Diário Ateísta, o Luis Grave Rodrigues, irá a uma conservatória de Lisboa num esforço para que duas raparigas que vivem juntas se possam casar. Na aparente simplicidade de confrontar a Constituição igualitária com o Código Civil discriminatório, joga-se a extensão do casamento a pessoas do mesmo sexo.

Terminei o meu último artigo notando que o puritano é aquele que se horroriza com o facto de alguém, algures, procurar a felicidade de uma forma que ele não aprova. E acrescentei que o totalitário vai mais longe e tenta impedir que esse alguém, esteja onde estiver, faça algo que não afecta mais ninguém. A descrição serve tanto para o Islão como para o catolicismo: são dois exemplos de religiões totalitárias. E é pertinente neste caso: existe um preconceito social enraizado, de inspiração religiosa, contra os adultos que mantêm entre si relações sexuais que muito poucos praticariam, mas que não afectam mais ninguém. E existe uma resistência irracional, também de origem religiosa, a que essas pessoas oficializem perante o Estado uma união estável.

No Portugal da Inquisição (se me é permitido falar da Inquisição…) o totalitarismo católico foi levado às últimas consequências: mesmo no espaço familiar e privado era proibido praticar outra religião que não aquela que detinha o poder político e público. A prisão de António José da Silva, por exemplo, deu-se quando uma escrava de casa descobriu que o seu amo respeitara alguns rituais judaicos, em segredo e atrás das portas fechadas da sua residência. O dramaturgo morreu na fogueira.

As religiões atrás referidas reunem no mesmo sistema uma cosmovisão e uma ética (o que é legítimo e não aborrece ninguém), mas as igrejas que as representam laboram para impor essa ética por via política (a cosmovisão já não aguenta o confronto com a ciência). Se tivessem o campo inteiramente livre, mesmo o nosso espaço privado seria escrutinado e controlado para que se aferisse da correcção religiosa do nosso comportamento pessoal. E no entanto, as igrejas poderiam falar apenas para os seus. No caso do casamento de pessoas do mesmo sexo, até seria melhor que evitassem pronunciar as excomunhões e anátemas habituais. Não os prejudica e nem sequer os afecta: não é nada com eles. E, no dia em que passar a ser uma escolha banal, também não será nada connosco.

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