Humanismo e sociedade
Decorre até amanhã em Amherst, New York, um Congresso Internacional devotado ao tema «Toward a New Enlightenment» realizado no âmbito das comemorações do 25º aniversário do Conselho do Humanismo Secular. Entre os congressistas encontram-se Richard Dawkins e os prémios Nobel da Química Harold Kroto e Herbert Hauptmann. Harry (Kroto) é um ateu «militante» que tive o prazer de conhecer em finais dos anos oitenta e já nessa altura, antes do recrudescer dos fundamentalismos religiosos que hoje nos assolam, o seu tema favorito de conversa, tirando o C60, claro, cuja descoberta lhe valeu o Nobel em 1996, era a ameaça para a humanidade e para o seu desenvolvimento ético que as religiões representavam. Aliás, preocupação que não esteve ausente da sua autobiografia no site da Fundação Nobel, em que se pode ler:
«Depois de tudo isto, acabei sendo um apoiante de ideologias que advogam o direito do indíviduo falar, pensar e escrever em liberdade e segurança (certamente a fundação de uma sociedade civilizada). Tenho problemas pessoais muito sérios quando confrontado com indíviduos, organizações e regimes que não aceitam que essas liberdades são direitos humanos fundamentais. (…) Assim sou um apoiante da Amnistia Internacional, um humanista e um ateu. (…) Organizações que procuram influência política através de um esforço coordenado perturbam-me e por isso considero que grupos religiosos e grupos de pressão religiosos que operam desta forma o fazem anti-democraticamente e não deveriam ter qualquer papel em política.Também tenho problemas com aqueles que pregam ideologias racistas e relacionadas que quasi parecem indistínguiveis do nacionalismo, patriotismo e convicção religiosa»
As considerações de Harry sobre a religião e sua influência nefasta na Humanidade são reflectidas neste Congresso:
«Milhares de anos de história humana e as delapidações das guerras mundiais trouxeram a maior parte do mundo para o limiar da paz e proporcionaram a véspera do enlightenment (termo difícil de traduzir, talvez iluminismo no sentido de oposição a obscurantismo religioso). O último século em particular viu a emergência de tratados internacionais e instituições que constituiram passos em frente no desenvolvimento de uma verdadeira civilização internacional, liberta dos erros e preconceitos inerentes a culturas religiosas fundamentalistas. Foram propostos novos métodos de governo, nacional e internacional, e estabelecidos tratados internacionais reconhecendo os direitos humanos fundamentais. Os valores do Enlightenment europeu foram estabelecidos através destas novas instituições e tratados mesmo quando se verificam revezes quer no Médio Oriente quer em democracias ocidentais.
O fundamentalismo religioso em todo o mundo ameaça o nosso progresso de uma forma que a Guerra Fria nunca o fez. Duas visões escatológicas competitivas enfrentam-se agora em que a vitória mútua assegura o fim do mundo enquanto os sistemas económicos em competição na Guerra Fria asseguravam que a derrota mútua seria o fim inevitável do falhanço da paz. O fundamentalismo ameaça igualmente o progresso científico e cultural e as liberdades individuais, já que as religiões lutam por supremacia ideológica, sem qualquer respeito pelas verdades descobertas pela ciência ou pelas batalhas por liberdades individuais que foram travadas e ganhas contra o autoritarismo e contra o medo. Até à data os Estados Unidos e a Europa Ocidental têm sido faróis na marcha do progresso e dos valores do Enlightenment mas a maré parece estar a recuar. Enquanto as forças do fundamentalismo preparam e armam os seus seguidores para uma batalha contra os valores que abraçámos devemo-nos unir numa causa para defender mais veementemente que nunca esses valores.
Os valores do Enlightenment estão a ser ameaçados em todo o Mundo. A agenda fundamentalista quer no Ocidente quer no Oriente rejeita liminarmente esses valores. Estamos no limiar de uma nova obscurantista Idade Média. Poderemos aprender com as lições do Enlightenment francês e inglês e ajudar a construir um Novo Enlightenment?»
Os colaboradores do Diário Ateísta partilham as preocupações das associações humanistas internacionais que participam neste Congresso e tentarão ajudar, dentro das suas capacidades, a que a resposta a esta questão crucial para o futuro da Humanidade seja afirmativa. Continuaremos como sempre o fizemos a responder aos assaltos dos fundamentalismos religiosos ao que prezamos e defendemos: ciência, racionalismo, laicidade, livre pensamento e valores humanistas!