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Religião e Sociedade

As religiões judaico-cristãs assentam numa concepção do ser humano naturalmente perverso, muito susceptível às tentações do mafarrico, factos que justificam a existência do Mal. Outra concepção concomitante é o mito da Queda que nos sobrecarrega com o pecado original: «o homem era inocente e bom, e o mundo era um jardim, um paraíso. Mas o homem foi tentado, sucumbiu e caiu». A tradição cristã, que influenciou indelevelmente a sociedade ocidental é assim muito veemente na condenação da natureza humana e da sua natureza intrinseca e irrevogavelmente má afirmando que não há nem salvação moral nem sociedade funcional fora do amor a Deus. Aliás essa é a arma mais frequentemente esgrimida contra os ateístas, ou seja, os crentes em geral e os católicos em especial afirmam a impossibilidade de existência de um sistema moral fora dos auspícios divinos.

Um artigo recente publicado na revista científica que dá título a este post, Journal of Religion and Society, vem liminarmente deitar por terra todos os supostos argumentos de ordem moral que, sem qualquer sustentação empírica mas apenas reflectindo o sentimento de superioridade moral que as religiões conferem, os crentes vêm falaciosamente utilizando até agora. E que apenas confirma o que Feuerbach já afirmava há cerca de 150 anos: «quando a moral se baseia na teologia, quando o direito depende da autoridade divina, as coisas mais imorais e injustas podem ser justificadas e impostas».

No artigo são analisados dados de incontáveis sondagens internacionais, nomeadamente da International Social Survey Programme, Gallup e outras, que permitem a conclusão que «Em geral, taxas mais altas de crença e reverência num Criador correlacionam com taxas mais altas de homícidio, mortalidade juvenil e de jovens adultos, infecções com doenças sexualmente transmíssiveis, gravidez adolescente e aborto nas democracias prósperas».

Reflectindo ainda que «democracias não religiosas, a favor do evolucionismo contradizem a máxima de que uma sociedade não pode gozar de boas condições a não ser que a maioria dos seus cidadãos acreditem ardentemente num criador moral». Aliás, a desacreditação desta máxima já tinha sido indicada aqui no DA com o exemplo da República Checa, a democracia ocidental mais ateia.

A conclusão retirada no artigo «O medo generalizado que uma cidadania sem Deus deve experienciar um desastre social é assim refutado» apenas corrobora as minhas lucubrações de que o progresso ético da humanidade é impedido peals religiões.

De facto, e como já escrevi, se analisarmos criticamente a História, podemos constatar que apenas depois de Petrarca e do início dos movimentos humanistas, que colocam a ênfase no Homem e não em qualquer ser transcendente, e consequentes separação da Igreja-Ciência e da Igreja-Estado se dá um avanço ético nas sociedades ocidentais. A progressão do sub-homem de Sartre para o Homem pleno, só pode de facto realizar-se através do humanismo. Apenas acreditando no Homem, repudiando a tradição cristã da sua natureza pecadora e má, e estabelecendo uma ética centrada no Homem e não em verdades «reveladas», podemos viver harmoniosamente com os nossos semelhantes.

Ou seja, a ética cristã assenta na natureza intrinsecamente má do Homem, causada pela dentadinha na maçã da pérfida Eva, e na supressão virtuosa dessa natureza humana, por obediência a ditames divinos. A ética ateísta pretende não só devolver ao Homem a dignidade que as religiões do livro lhe sonegaram como combater o antropocentrismo autista que estas promovem. E como este estudo confirma, em total oposição ao que pretendem os crentes, a ética ateísta permite o desenvolvimento de uma sociedade melhor, mais pacífica e mais justa!

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