O medo da secularização
São muitos os católicos que não gostam de menções à Inquisição, ao fanatismo ou à intolerância da sua religião porque essa religião que conhecem (ou julgam conhecer) lhes foi apresentada numa forma secularizada. A catequese de que foram inocentes vítimas, apesar de retrógrada e por vezes contraditória em muitas matérias, deixa emergir uma mensagem generalizada de amor, paz e respeito, dado o ambiente cultural da nossa sociedade.
Porque nem todos concordam com tudo o que o Papa diz, nem com o que diz padre fulano na sua homilia. Assim não fosse e não ouviria tantas mulheres dizerem-se católicas. Porque não sabem que o livre-pensamento é castigado com o fogo do Inferno. Inferno esse do qual duvidam enquanto possível destino post-mortem e cuja existência julgam, muitas vezes, ser matéria de opinião pessoal no seio do seu catecismo.
Este diluir do dogma pode ser auto-infligido por pessoas de bom senso não têm tempo para acreditar em contradições ao pequeno-almoço ou por ministros da fé mais liberais, reformadores, jovens ou simplesmente amedrontados pela perda de seguidores. O que é certo é que é a sociedade e não o Vaticano que vai ditando as mudanças profundas na maneira de viver a religião.
Seja essa mudança (ela também uma forma de secularização) um modo de fazer cair um véu sobre a repulsa disfarçada que as instituições religiosas têm pelas liberdades pessoais, seja isso um esforço para fazer evoluir doutrinas estáticas há séculos, o que é certo é que a religião, na sua forma natural, possui todos os ingredientes para instrumentalizar a perseguição, a morte e o ódio livres de punição divina e presenteados com garantias de salvação.
É bom lembrar a entrevista de Omar Bakri Mohammed, auto-intitulado «teórico da Al-Qaeda na Europa», onde este revela o não inesperado desprezo total pelo secularismo e o ódio sagrado incluído nos textos divinos e ameaça um atentado em Londres, infelizmente concretizado.
Não sei o que dizer quando alguém mascara o ódio bíblico de “vicissitude da época” ou “tradução melindrosa”. Será uma forma de o exorcizar, aos poucos, da liturgia? Ou será uma forma de o conservar, à espera de melhor oportunidade para voltar a espalhar o cancro medieval do fanatismo?