28 de Abril, 2024 Onofre Varela
Ser ou Não Ser
Um amigo facebookiano postou um desabafo de religioso sentindo-se agredido no seu raciocínio. Dizia ele que “Para alguns, ser católico é ser palerma… e ser ateu é ser esclarecido, moderno, intelectualmente superior”. O meu amigo virtual não se sinta assim, tão negativamente tratado, porra!… Uma das questões que muitas vezes me coloco, é esta: Porque é que um licenciado (médico ou advogado, por exemplo) tem do conceito de Deus a mesma convicção de um servente de pedreiro analfabeto? Será que o licenciado não aprendeu nada, ou o analfabeto sabe muito?!… Não é verdade que a crença em Deus pertença aos ignorantes. Se lhe der jeito para se sentir melhor com o seu raciocínio, pense que o ignorante pode ser o ateu.
O saber e a crença podem coabitar (e coabitam) na mesma mente. A religiosidade é natural. É um atributo humano e a ideia de Deus está alojada no cérebro de todos nós. O berço de cada um, o meio em que cresce e é educado, pode ditar o interesse e o valor que cada indivíduo dá à ideia do divino. O culto de Deus está presente nas famílias desde que se nasce (pelo baptismo na igreja da paróquia), na celebração religiosa da Comunhão (como referente da passagem da meninice para a juventude), no casamento frente ao altar, e mais tarde no baptismo e na Comunhão dos filhos, até ao enterramento depois de finado, com funeral presidido por um sacerdote que encomenda a alma do defunto ao Altíssimo!…
Toda a vida do temeroso crente é votada à religiosidade, e isso tem o seu peso na vida de cada um de nós, pois não há quem possa fugir à ética social e religiosa presente na construção das suas origens e do seu dia-a-dia. Para além desta verdade antropológica e sociológica, há o comércio religioso nas lojas que as igrejas são (veja-se Fátima), prestando assistência à alma a qualquer hora do dia. Igrejas, capelas e alminhas de parede estão mais disseminadas pelo país do que as caixas Multibanco (o deus-dinheiro). Qualquer produto religioso que se mostre de interesse geral (ou mesmo sem se mostrar; a fé basta) passa a ser comercializado, a alimentar indústrias, a ser massivamente publicitado e consumido, tal como a Coca-Cola, os hambúrgueres e as telenovelas (veja-se a seita IURD).
O “produto-Deus” está colado a nós. Tem a mais valia de nos acompanhar desde o Paleolítico, com reforço na Idade do Ferro, acrescentado pelo medo dos castigos divinos induzidos na Idade Média e embelezado com a espectacularidade da Arte Renascentista. Na nossa civilização a história de Deus já vem de longe, desde a Idade Clássica, importadora dos enigmáticos deuses da Mesopotâmia, e acompanha-nos nos momentos mais emblemáticos das nossas vidas, o que, por si só, exerce muita influência no nosso modo de ser.
Mas há muitíssimo mais por detrás da ideia de Deus!… Também serve interesses políticos, sociais e económicos, o que tem muito peso e demasiada importância para os mandantes deste mundo.
Agora já percebe porque é que a ideia de Deus também habita as cabeças com raciocínio superior ao de um servente de pedreiro analfabeto?!
(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)