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“COM A RELIGIÃO NÃO SE BRINCA”, DISSE ELE.

Texto de Onofre Varela, publicado na imprensa, em que reflete sobre uma frase que ouviu. Afinal, “com a religião não se brinca”?

Os dirigentes dos partidos políticos da Direita têm uma enorme incapacidade de perceberem a vida dos pobres que alguns deles constantemente desrespeitam.

Penso estar na memória de todos nós a infeliz frase de Assunção Cristas (enquanto presidente do CDS), proferida em época de eleições concorrendo à presidência da Câmara de Lisboa: “Calço as galochas e vou aos bairros sociais”. A sua infeliz frase demonstrou que ela não sabe que um bairro social não é uma pocilga, e pior do que isso: imagina que é!… E imaginando-o, colocou num patamar muito baixo a dignidade de quem habita os bairros, esquecendo que a dignidade daquela gente é igual à sua. Ela só tem mais dinheiro e um curso académico superior, o que não é sinónimo de ser mais digna!

Já Marcelo Rebelo de Sousa, com todas as suas demonstrações de carinho, levando ânimo a quem sofre, não pôde deixar de escorregar nas palavras e nas ideias quando sugeriu a um sem abrigo, num acto de distribuição de comida em noite de Natal, que levasse para casa o resto do pão que não comeu, porque “é muito bom para fazer torradas”… esquecendo que um sem-abrigo não tem casa, não tem torradeira, nem fogão, nem manteiga…

Quem sempre viveu numa casa aquecida e confortável, com a dispensa bem fornecida e o frigorífico cheio, não imagina o que é passar-se mal, passar fome e frio, ter os bolsos sem dinheiro, não ter cartões de débito e muito menos de crédito. Referi Cristas e Marcelo em casos concretos… mas a extrema Direita actualmente no Parlamento tem o mesmo desrespeito por quem sofre; e o discurso aparentemente contrário não é mais do que isco de anzol para ser mordido pelos incautos.

A um outro nível menos social no campo das ideias que animam (e desanimam) a nossa sociedade (e continuando a retroceder no tempo alguns anos), ouvi um alto dirigente do CDS dizer num congresso que aconteceu em Lamego, num discurso inflamado debitado para uma plateia ideologicamente igual ao palestrante, a frase “com a Religião não se brinca”, referindo-se a algo que uma dirigente do Bloco de Esquerda teria dito sobre a estátua do Cristo Rei de Almada.

Ele não sabe que a Religião não é uma estátua!… Ele não sabe que se pode (e deve) brincar com tudo… menos com a dignidade e a saúde dos cidadãos, o bem estar de todos nós e o ensino das populações, mais o pão dos trabalhadores pagos miseravelmente. 

Partidos de Direita travestidos de sociais-democrátas, defendem ordenados baixos e também defendem a ideia do “trabalhador-descartável”. Muitos dos empresários que apoiam este tipo de política, brincam com a vida das famílias que têm como único sustento a força do seu trabalho vendido ao patronato… e o sentimento religioso é usado sem pudor por partidos políticos que, efectivamente, brincam com o sentimento religioso do Povo, explorando-o também na crença. Estes discursos da Direita são falsos como Judas. Se Jesus Cristo voltasse à Terra, não permitiria a entrada na sua Igreja a muitos dos que se afirmam “tão-democratas-cristãos” e têm atitudes “tão-pouco-cristãs”. 

E também não sei se Jesus aceitaria entrar numa igreja Católica!…

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) 

Imagem de Pexels por Pixabay

Perfil de Autor

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Onofre Varela nasceu no Porto em 1944, estudou pintura e exerceu a atividade de desenhador gráfico em litografia e agências de publicidade, antes de abraçar a carreira de jornalista (na área do cartune), em 1970, no jornal O Primeiro de Janeiro. Colaborou com a RTP, desenhando em direto a informação meteorológica no programa Às Dez e animando espaços infantis. Foi caricaturista e ilustrador principal no Jornal de Notícias, onde também escreveu artigos de opinião, crónicas e entrevistas.