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Do primitivismo à racionalidade

Texto de Onofre Varela, previamente publicado na Gazeta.

Não discuto Religião e Ateísmo do mesmo modo como se discute futebol animalesco e irracional, bem como política partidária tratada ao mesmo nível religioso que considera a sua opinião como a “única Verdade” (sempre grafada com maiúscula porque divina, ou porque é proclamada pelo líder partidário alcandorado ao nível de um deus), contra “a mentira” de todas as outras religiões e de todos os outros sentimentos políticos, em discussão inflamada com a costumeira irascibilidade desrespeitadora (quando não insultuosa) da opinião do outro.

São modos que não dignificam ninguém. Não precisamos insultar para dizermos que discordamos. São reacções que situam quem as tem num patamar primitivo, do qual o irascível contundente ainda não saiu. O sentido religioso é natural no Ser Humano, e é com essa naturalidade que eu procuro tratá-lo nestes artigos onde faço a defesa do Ateísmo. Poderei não o conseguir por ignorância e também pelo “factor-primitivismo” que igualmente me afecta, pois estou colocado no mesmo patamar evolutivo dos meus contemporâneos… e dessa realidade natural não posso fugir. 

O nosso primitivismo, por mais que nos custe admiti-lo quando nos imaginamos evoluídos (evoluídos em relação a quê?…) pode ser aferido neste simples exercício: se inscrevermos a evolução do planeta Terra no mostrador de um relógio, sendo as zero horas a causa do Big-Bang (ou do que quer que fosse de que resultou o sistema Solar) e as doze horas o tempo presente, temos que a Era actual, o Quaternário, se iniciou nos últimos dois minutos, e o Homo Sapiens surgiu quando faltava uma dúzia de segundos para o meio-dia. No decorrer das doze badaladas, consumiram-se as Idades da Pedra, do Ferro e do Bronze, o Homem espalhou-se pelo mundo, nasceram e morreram as civilizações Mespotâmica, Chinesa, Egípcia, Grega e romana, circum-navegou-se o planeta, o Homem pisou a Lua e o leitor está a ler este texto.

Quero com isto dizer que a nossa espécie é recente. Somos a última experiência da Natureza na evolução da vida que ainda não está terminada. Como produto natural que somos, encontramo-nos na fase do tosco. Cheiramos a pintado de fresco. Estamos a ser burilados pelas experiências vividas. Não podemos escapar às características do animal predador que somos, nem à fase evolutiva em que nos encontramos.

A evolução tecnológica acontece em ritmo mais acelerado do que evolui a mente humana em termos de progresso racionalista. Por muito evoluídos que pensemos ser, só o somos no nosso entendimento de egoístas vaidosos… e as nossas acções e crenças têm a marca desse primitivismo animalesco e egocentrista, espampanantemente coberto pelo pesado manto da nossa vaidade desmedida e ignorância camuflada.

É neste contexto evolutivo que acontecem as guerras, sejam elas de ordem religiosa ou patriótica. São o resultado do nosso primitivismo que o passar do tempo e a evolução da espécie promovida pelas transformações ditadas pelo ADN em resultado de mutações naturais, se encarregará de apurar. Mas, por aí… até eu já me sinto profundamente crente!

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) 

OV

Imagem de Enrique Meseguer por Pixabay

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