A razão, a superstição e os exorcismos
Quando a razão dorme, acordam os monstros. É esta mensagem de Goya num dos seus «Caprichos», um Iluminista com o pincel e as tintas a fazer mais contra a superstição do que grandes escritores em milhares de páginas. Goya zurziu, em finais do século XVIII, a nobreza e o clero, com o génio do talento e a coragem dos heróis, através de uma das armas mais mortíferas – a sátira –, com que abalou o prestígio de Ordens religiosas e os preconceitos do seu tempo.
O fanatismo religioso, a Inquisição e as superstições foram denunciadas nas 80 gravuras do genial pintor que só por sorte escapou às garras da Inquisição. Ele não foi apenas um precursor da pintura moderna, foi um arauto da sociedade liberta das trevas e conduzida à razão pelo Iluminismo.
Quando, há anos, o cardeal Rouco Varela, nomeou oito exorcistas para a diocese de Madrid e se soube que as dioceses católicas têm peritos no tratamento das possessões demoníacas, não foi o atraso de uma Igreja que desprezo que me preocupou, foi o regresso da sociedade aos medos medievais e forças ocultas que apavoraram gerações de crentes.
Depois de um Papa ter negado a existência do diabo logo outro veio reiterá-la, não fosse a superstição desaparecer. Quando os crentes perdem o medo dos demónios, acabam por duvidar do interesse do seu Deus, mas o que é terrível é a crença do clero nas possessões demoníacas, nesse regresso ao obscurantismo que encobre o autoritarismo eclesiástico e o imobilismo ideológico característico das seitas.
No caso espanhol, o velho cardeal franquista convidou ainda psiquiatras para fazerem o diagnóstico diferencial entre doenças do foro psíquico e da alçada do demo. Claro que à declaração clínica não é alheia a crença do médico e não é por acaso que a única doença exclusiva dos crentes seja a possessão demoníaca, moléstia que não atinge agnósticos, ateus, céticos e outros livres-pensadores.
É o regresso ao autoritarismo romano que está em marcha. Denunciar os desvarios pios é uma obrigação de quem recusa o regresso à época das trevas.
Há mais de dois séculos, já Francisco Goya nos alertava para o mundo obscuro que os conventos e as sacristias preservavam tal como hoje o fazem, às escâncaras, as madraças e mesquitas.
Perfil de Autor
- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa
- Sócio fundador da Associação República e laicidade;
- Sócio da Associação 25 de Abril
- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;
- Sócio dos Bombeiros Voluntários de Almeida
- Blogger:
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- Colaborador do Jornal do Fundão;
- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»
- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:
- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;
- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores
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