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Maria Velho da Costa

Em 1972 foi publicada a obra “Novas Cartas Portuguesas” da autoria de três escritoras portuguesas, com sólida cultura, prestígio literário e forte participação cívica. Ficariam conhecidas internacionalmente pelas “Três Marias”.

Maria Teresa Horta, Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa ousaram desafiar a primavera marcelista como percursoras da luta pela emancipação feminina, num país onde a mulher estava condenada à menoridade cívica, política e social.

É imperioso recordar que, então, estavam vedadas às mulheres a carreira diplomática, a magistratura, as forças armadas e policiais e, na prática, os lugares de poder. Nem a saída para o estrangeiro lhes era permitida sem autorização do marido.

A coragem cívica das três intelectuais, cuja luta continua um exemplo para os combates pela igualdade de sexos, deve ser exaltada agora, na morte de mais uma das autoras, e no futuro. Não há vitórias definitivas e a emancipação da mulher está longe de ser uma conquista irreversível, mesmo em países ditos civilizados.

A exaltação da condição feminina e a defesa da liberdade para as mulheres era mais do que a Igreja, as famílias e a sociedade podiam tolerar, mas a denúncia da repressão e da censura do regime fascista, que Marcelo, o Caetano, se esforçava por disfarçar, não era um direito, era uma afronta à moral e aos bons costumes definidos nas sacristias, no Movimento Nacional Feminino, na Legião e na Mocidade Portuguesa. A denúncia da guerra colonial, da discriminação, da falta de liberdade, da subordinação da mulher era uma heresia intolerável.

Não surpreenderam os insultos, a difamação e as calúnias da imprensa da ditadura. A coragem, inteligência e cultura eram valores intoleráveis em mulheres, e a dignidade a utopia de mulheres depreciativamente designadas ‘intelectuais’, quando o casamento era o principal papel que lhes era reservado, para adereço de maridos ricos, reprodução e escravatura da vontade masculina.

O Estado acusou as escritoras de terem escrito um livro “insanavelmente pornográfico e atentatório da moral pública”, e levou-as a julgamento como se a denúncia a guerra colonial, a discriminação, a falta de liberdade, a marginalização das minorias e a subordinação da mulher na sociedade não fosse a vergonha do Estado terrorista em que homens e mulheres vegetavam.

Em 25 de Abril de 1974 decorria ainda, num tribunal de Lisboa, o julgamento que já levava dois anos, mas não eram as autoras que ali eram julgadas e arriscavam a prisão, era a ditadura que se expunha ao ridículo e à censura internacional. A 7 de maio de 1974, dias após a Revolução do 25 de Abril, o juiz Lopes Cardoso leu a sentença:
“O livro ‘Novas Cartas Portuguesas’ não é pornográfico nem imoral. Pelo contrário: é obra de arte, de elevado nível, na sequência de outras obras de arte que as autoras já produziram”.

Quando se apagou mais uma estrela no firmamento das mulheres portuguesas que se bateram pela dignidade feminina, é obrigatório lembrar o seu inestimável contributo pela democracia e pela emancipação dos valores que a Igreja católica incutia.

Perfil de Autor

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- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa

- Sócio fundador da Associação República e laicidade;

- Sócio da Associação 25 de Abril

- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;

- Sócio dos Bombeiros Voluntários de Almeida

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- Colaborador do Jornal do Fundão;

- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»

- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:

- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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