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Espanha – Filhos de republicanas roubados por e para fascistas

Quem já percorreu da vida uma larga fatia, presenciou e viveu circunstâncias dolorosas e conhece os horrores de que os homens são capazes, ainda se surpreende com situações medonhas, em épocas recentes, nos países da Europa.

O ginecologista Eduardo Vela é um sobrevivente impune do roubo de bebés que durou, de forma sistemática e reiterada, 60 anos. Uma rede criminosa começou a roubar bebés, filhos de mulheres republicanas, para os dar a casais franquistas inférteis e a instituições religiosas, antes de assassinar as mães, para garantir aos filhos uma educação cristã e evitar que a lepra comunista os pudesse atingir.

Em 1959, o então diretor da clínica de San Ramón, em Madrid, Eduardo Vela entregou a um casal infértil Inés Madrigal, retirada aos pais. Foi o primeiro caso, entre dezenas de milhares, a ser julgado e provado em tribunal, com o criminoso à solta, por ter prescrito o crime. Inés Madrigal, ilegalmente separada dos pais, foi a única a obter o julgamento de um criminoso da rede que começou a atuar em 1938 e teve o seu auge após a vitória fascista de Franco. O horror prolongou-se, já em democracia, até 1996, com encenação de mortes fetais durante o parto e outras artimanhas contra famílias pobres.

Inés Madrigal, desconfiou das circunstâncias em que foi adotada, depois de ter lido no El País que a clínica de San Ramón se distinguiu na prática de tão hediondos crimes e que o médico Eduardo Vela, agora com 85 anos, tinha sido o responsável de numerosas adoções ilegais, detenções ilegais e falsificação de documentos. Foi a mãe adotiva que, ao atingir a maioridade, lhe confessou a adoção e confirmou em tribunal que a filha lhe tinha sido dada de presente pelo sinistro médico Vela.

Este foi um dos inúmeros casos que o célebre juiz Baltasar Garzón calculou terem sido, entre 1938 e 1996, cerca de 30 mil. As crianças eram separadas dos pais, sem provas de que os pais biológicos tivessem dado consentimento ou tido sequer conhecimento.

Este é mais um crime ignóbil da ditadura franquista a juntar aos fuzilamentos sumários de centenas de milhares de espanhóis, com a cumplicidade de instituições católicas.

A denúncia destes crimes contra a Humanidade e a luta para que sejam imprescritíveis são uma exigência democrática, apontando à execração pública todos os que teimam em reabilitar a memória de Franco e dos seus sequazes.

Em Espanha, os insultos a Deus ou ao apóstolo Tiago, sem queixa dos ofendidos, ainda geram condenações, mas o roubo de crianças ameaça ficar impune, tal como os outros crimes contra a Humanidade cometidos pelo franquismo, a Falange e a Igreja.

Apostila – Os dados deste texto encontram-se na imprensa nacional e internacional do mês de junho. Volto ao tema para cumprir o dever de os lembrar aos leitores quando os fascistas espanhóis pretendem reabilitar a memória de Franco e se opõem à sua trasladação do Vale dos Caídos. 

Perfil de Autor

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- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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