A Universidade de Coimbra e a missa da Imaculada
A Universidade de Coimbra é capaz do melhor e do pior, de gerar cientistas de elevado mérito e beatos capazes de conduzir a caldeirinha, com o hissope, atrás das saias de um capelão. Tem investigadores notáveis e beatos de rara sofreguidão teófaga, deliciando-se com a missa e hóstia diárias, às vezes os mesmos, assunto que devia ser de natureza particular, e seria de intolerância e mau gosto comentar.
Acontece, porém, que o Magnífico Reitor entende que na Universidade, onde a tradição e os dinheiros públicos mantêm um capelão, deve ser ele e o capelão a convidarem os professores, alunos e funcionários, para a missa de homenagem à padroeira da Universidade – a Imaculada Conceição –, que terá lugar a 8 de dezembro, pelas 12H00, na capela de S. Miguel.
Que o capelão, no exercício das funções, convide os créus a assistir a uma cerimónia da sua religião, compreende-se. Permite, aliás, ver a magnífica capela, uma relíquia da arte sacra, e, no caso dos devotos, venerarem um dos numerosos avatares da mãe de Jesus que o Papa Pio IX, em 8 de dezembro de 1854, tornou obrigatoriamente virgem, como é hábito milenar para as mães de diversos deuses.
O que não é aceitável é que a mais alta entidade académica, de uma Universidade laica, se comporte como o diretor de uma escola confessional ou o mullah de uma madrassa. Quem preside ao areópago da Ciência e das Humanidades não pode dedicar-se às coisas pias, sobretudo num país laico onde a separação das Igrejas e do Estado é obrigatória.
São exemplos destes que levaram uma ilustre e beata professora, quando vice-reitora, a propor a recriação da Faculdade de Teologia, o que não conseguiu porque o bom senso e a formação cívica do corpo docente a inviabilizaram.
Uma faculdade de teologia teria certamente licenciaturas em islamismo, cristianismo e judaísmo, bacharelatos em hinduísmo, xintoísmo e budismo, graduações em lançamento de búzios, mestrados em tarô e bruxaria, e doutoramentos em exoterismo.
Não falei dos méritos – são muitos –, que exornam a Universidade de Coimbra, lamento as atitudes que a desprestigiam. A Universidade devia ser o último reduto na defesa da laicidade e não a vanguarda do convite à genuflexão pia, à prática litúrgica e à devoção.
Perfil de Autor
- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa
- Sócio fundador da Associação República e laicidade;
- Sócio da Associação 25 de Abril
- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;
- Sócio dos Bombeiros Voluntários de Almeida
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- Colaborador do Jornal do Fundão;
- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»
- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:
- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;
- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores
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