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Mês: Agosto 2017

12 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Israel e as religiões do livro

O Antigo Testamento é um manual xenófobo, violento, misógino e vingativo que reflete o pensamento tribal da Idade do Bronze e a sua natureza patriarcal. Por mais alterações que tenha sofrido, continua um excelente documento histórico e literário, cuja natureza humana é óbvia, mas atribuído ao deus abraâmico, exclusivo das tribos israelitas.

Na idade adulta de Jesus, que seguramente não nasceu em Nazaré nem na data referida, houve quem visse no jovem judeu, exímio em parábolas e com currículo no ramo dos milagres, o Messias anunciado.

Paulo de Tarso era um judeu da Diáspora, israelita circuncidado da tribo de Benjamin, um intelectual do Império romano, que abraçou a ideia de que Jesus era o tal Messias e que veio salvar ‘todos’ os homens, abrindo a primeira cisão bem-sucedida no judaísmo.

Paulo de Tarso iniciou a globalização e o proselitismo religioso com a violência usual dos trânsfugas, movendo uma perseguição implacável aos judeus que não aceitaram o novo Messias e tornando-se fundador do cristianismo, depois da morte de Jesus Cristo, que morreu judeu e sem prever que seria a estrela de uma nova religião.

O Novo Testamento (NT), escrito de acordo com a tradição oral, várias décadas depois, é a originalidade do cristianismo através de evangelhos que foram eleitos no Concílio de Niceia (325) e dos definitivamente considerados canónicos (Mateus, Marcos, Lucas e João) no Concílio de Trento (1545 a 1563), entre dezenas dos considerados apócrifos e “totalmente absurdos e ímpios”, não sem que uns e outros tenham sofrido alterações e fraudes. Sobraram os que menos contradições expunham entre si, expurgados das mais flagrantes, e marcando a proscrição e o fim dos evangelhos alternativos.

O facto de o cristianismo ter nascido no seio do judaísmo, e contra ele, originou o ódio aos judeus que não aceitaram o novo Messias, o antissemitismo que o NT transmite e de que o Concílio de Trento foi fervoroso prosélito.

Os quatro Evangelhos (Marcos, Lucas, Mateus e João) e os Atos dos Apóstolos têm, na contabilidade de Daniel Jonah Goldhagen (in A Igreja católica e o Holocausto) cerca de 450 versículos explicitamente antissemitas, “mais de dois por cada página da edição oficial católica da Bíblia”.

No fim dos anos quarenta do séc. XX ainda o catolicismo português pedia a conversão dos “pérfidos judeus”, “ninho de víboras”, que mataram Jesus, depois do genocídio nazi que os gaseou e a cujos carrascos os bispos católicos e protestantes entregaram registos de batismo para mais facilmente descobrirem, por exclusão de partes, quem era judeu.

Foi esse preconceito o responsável das purgas que vitimaram os judeus, com expulsões, vexames e confisco de bens, com fogueiras da Inquisição e tentativa de “solução final” pelos nazis. O remorso dos Aliados deu origem a Israel, para onde emigraram cidadãos das mais variadas nacionalidades criando o único Estado de base teocrática.
Resta dizer que em 622 nasce um novo monoteísmo, o islamismo, uma cópia grosseira do judaísmo e do cristianismo, alegadamente ditada a um beduíno analfabeto e amoral, pelo Arcanjo Gabriel, entre Medina e Meca, em duas décadas de condução de camelos.

A decadência da civilização árabe transformou o mais implacável dos monoteísmos no atual viveiro de terrorismo, através da boçal interpretação do wahabismo sunita.

Depois desta breve síntese, reitero o meu anti antissemitismo, como expressão firme do combate a qualquer forma de racismo, mas seria uma grave omissão se não vituperasse o sionismo, essa violência judaica simétrica do antissemitismo, e esquecesse o massacre de Sabra e Chatila, a ocupação ilegal de territórios palestinos e a violência dos judeus das trancinhas à Dama das Camélias, às cabeçadas no Muro das Lamentações e a sonhar com o Armagedão, depois de ocuparem a Palestina.

9 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

As religiões, os crentes e a intolerância

Não lamentaria o fim das religiões, mas magoar-me-ia que um só crente, qualquer que fosse o seu deus, acabasse molestado. Considero as religiões, todas as religiões, falsas e prejudiciais, mas não imagino que a sua ausência tornasse os povos mais felizes e mais racionais os crentes.

Sendo o mundo o que é e as pessoas como são, porque são moldadas no berço e sofrem os constrangimentos das sociedades onde vivem, seria ótimo se houvesse um módico de racionalidade a suavizar o proselitismo que devora os crentes mais exaltados.

É ocioso referir a crueldade e sofrimento provocados por suicidas que morrem e matam a gritar que “deus é grande”, à espera do ror de virgens e de rios de mel doce que julgam à espera, depois da imolação insana.

O bando de cruzados mentirosos que agrediu o Iraque originou uma tragédia que devia arrepiar os cúmplices de Bush, Blair, Aznar e Barroso. A comunidade de cristãos de 4,5 milhões de crentes que, em 1950, vivia no Iraque, desde o século I d.C., está reduzida a cerca de 200 mil, com tendência a extinguir-se.

O protestantismo evangélico pretende o domínio dos aparelhos de Estado no continente americano e trava uma guerra impiedosa com o islamismo wahabista, pelo controlo de África, na região do Sahel. A violência sionista do judaísmo e o primarismo católico das Filipinas, onde jovens se crucificam na Páscoas cristã, não abrandam.

A atual deriva nacionalista do hinduísmo adicionou a xenofobia à divisão em castas e à humilhação das viúvas que voltaram a casar. Pretende o extermínio dos muçulmanos na Índia, o país das duas comunidades, e alimenta tensões com países vizinhos.

Quase desconhecida é a ferocidade do monge budista Ashin Wirathu, a face mais cruel do terrorismo budista, apelando à limpeza étnica dos 4% da população da Birmânia, que professa o islamismo, assim como a xenofobia manifestada no Sri Lanka ou o ódio entre conventos budistas e, dentro dos conventos, entre os seus monges.

A violência conventual da exótica teocracia monástica do Monte Athos cuja misoginia proíbe o acesso de mulheres e de quaisquer animais fêmeas, é a tendência universal das crenças que o medo da secularização e do livre-pensamento torna intolerantes e cruéis.

É este caldo de cultura que está à solta com a cumplicidade dos Estados que apregoam a separação do Estado e das Igrejas, mas, na prática, traem a laicidade e conluiam-se com o clero que exibe as vestes pias nas cerimónias seculares.

6 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Não há só gaivotas em terra

Há 51 anos a inauguração da ponte, que hoje se chama «25 de Abril», tinha como atração as rendas e as vestes talares que o Portugal de Abril não conseguiu erradicar das cerimónias laicas e republicanas.

4 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

A solidão e a fé

A solidão é o cimento que cola o abandonado à fé, torna o proscrito crente, faz beata a pessoa e transforma o cidadão num trapo.

A religião é o colchão que serve de cama ao desamparado, o mito que se entranha nos poros do desespero, o embuste a que se agarra o náufrago. É o vácuo a preencher o vazio, o nada que se acrescenta ao zero.

O padre está para a família como o álcool para o corpo. Primeiro estranha-se, depois entranha-se e finalmente domina.

A religião é um cancro que se desenrola dentro das pessoas e morre com elas. Também metastiza e atinge órgãos vitais. Mas é dos joelhos que se serve, esfolando-os; da coluna vertebral, dobrando-a; e do cérebro, atrofiando-o.

A religião busca o sofrimento e condena o prazer. Preza o mito e esquece a realidade.

Um crente faz o bem por interesse e o mal por obrigação. É generoso para agradar a Deus e perverso para o acalmar. Dá esmola para contentar o divino e abate um inimigo para ganhar o Paraíso.

A religião vive da tradição, do medo e da morte. Começa como doença infetocontagiosa contraída na infância, transmitida pelos pais, através do batismo. O lactente é levado ao primeiro rito mais depressa do que às vacinas.

Depois, o medo, o medo da discriminação na escola, no emprego e na sociedade, leva a criança à catequese, à confirmação, à eucaristia e à penitência. De sacramento em sacramento, missa após missa, hóstia sobre hóstia, com orações à mistura e medo do Inferno, transforma-se um cidadão em marionete nas mãos do clero.

Na cúpula do catolicismo temos o Vaticano, um antro de perversão a viver à custa dos boatos sobre o filho de um carpinteiro de Nazaré e os milagres obrados por cadáveres de crentes de duvidosa virtude, à custa de pesados emolumentos.

O seu negócio é a morte que explora em ossos ressequidos pelo tempo, caveiras, tíbias e maxilares, pedaços de pele e extremidades de membros, numa orgia de horror e delírio.

É assim que a tradição, o medo e a morte continuam a encher os cofres do último Estado totalitário da Europa, que governa pelo medo e se mantém pela chantagem.