Associação Ateísta Portuguesa (AAP) – Comunicado
Fátima: o centenário de um embuste
Quando a Igreja católica distribui veneras a título póstumo, à semelhança dos Estados, é uma decisão que não merece reparo e apenas diz respeito aos crentes, mas quando o pretexto insiste no desafio à inteligência e ao bom senso, é uma boa razão para o combate ao obscurantismo e à superstição, implícitos nos milagres.
No início do século XX houve várias tentativas para encenar um espetáculo, copiado de Lourdes, contra a República. Em 1917, numa zona rural recôndita, foi possível fanatizar três crianças analfabetas com o catecismo terrorista da época e usá-las na raiva contra o Registo Civil obrigatório, o divórcio e a lei da Separação da Igreja e do Estado.
Em 13 de maio de 1917 foi ensaiado o circo contra a República, usando como fetiche o número 13 e o rosário como amuleto. Em cada dia 13 repetiu-se o teatrinho até ao mês de outubro. Bailou o Sol, saltitou nas azinheiras a Senhora de Fátima, o avatar lusófono da de Lourdes, poisou na Cova da Iria o Anjo de Portugal e as crianças foram repetindo o que o padre doutrinava, enquanto a Igreja comprava os terrenos para o negócio pio.
Em 1930, quando a ditadura clerical-fascista estava em marcha e a Lúcia levava quase uma década de cativeiro, com a Jacinta e o Francisco mortos, a ‘mensagem’ de Fátima virou-se contra o comunismo e para a conversão da Rússia (URSS?). Os ‘segredos’ que alimentaram o medo das populações, embrutecidas pelo primarismo da fé, acabaram de forma pífia com o último a ser apropriado por João Paulo II, convencido de que era, ele próprio, o protagonista, e de que a Senhora de Fátima, em vez de o ter poupado ao tiro de pistola, lhe havia guiado a bala no trajeto através do corpo perfurado.
Implodido o comunismo, Fátima virou-se contra o ateísmo e em 2008 o cardeal Saraiva Martins, vindo do Vaticano, presidiu à peregrinação do 13 de maio, sob o lema “contra o ateísmo”. Foi o ano da criação da Associação Ateísta Portuguesa (AAP).
Depois do milagre da D. Emília dos Santos, agora em nova joint venture, já com a ajuda da defunta Lúcia, os pastorinhos obraram outro milagre: curaram uma criança brasileira com “perda de material cerebral” que, depois de transportada “ao hospital, em coma, foi operada” e os médicos disseram que, “caso sobrevivesse, viveria em estado vegetativo ou, no máximo, com graves deficiências cognitivas”.
Bastou o pai pedir a cura à Senhora de Fátima e aos pastorinhos para ficar sem sequelas, em três dias, e recuperada para vir a Fátima como troféu dos defuntos, que necessitavam do milagre para a santidade programada.
Em Portugal, vítima da superstição e da ignorância, a conferência de Antero de Quental sobre as ‘Causas da Decadência dos Povos Peninsulares’ precisa de ser divulgada.
A Associação Ateísta Portuguesa reprova a cumplicidade dos mais altos representantes da República, a tolerância de ponto aos funcionários públicos e a presença de cadetes fardados no transporte do andor da Senhora de Fátima, na procissão das velas.
A laicidade, imolada no altar da superstição pia, caricatura o Estado laico e desprestigia as instituições.
Odivelas, 12 de maio de 2017.
Perfil de Autor
- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa
- Sócio fundador da Associação República e laicidade;
- Sócio da Associação 25 de Abril
- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;
- Sócio dos Bombeiros Voluntários de Almeida
- Blogger:
- Diário Ateísta http://www.ateismo.net/
- Ponte Europa http://ponteeuropa.blogspot.com/
- Sorumbático http://sorumbatico.blogspot.com/
- Avenida da Liberdade http://avenidadaliberdade.org/home#
- Colaborador do Jornal do Fundão;
- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»
- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:
- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;
- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores
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