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IMI: Igrejas, Estado, Sociedade e iniquidades várias …

Por

e – pá

O IMI não pode continuar a sofrer da confrangedora dualidade de ser um imposto secular e simultaneamente um privilégio religioso link. .
É conhecido que esta discrepância decorre dos termos da Concordata link. De facto o Artº. 26 do Tratado entre o Estado português e o Vaticano, define um vasto regime de isenções fiscais mas o item 5. (do referido artigo) deixa em aberto espaço para múltiplas interpretações quando estabelece: “As pessoas jurídicas canónicas, referidas nos números anteriores, quando também desenvolvam actividades com fins diversos dos religiosos, assim considerados pelo direito português, como, entre outros, os de solidariedade social, de educação e cultura, além dos comerciais e lucrativos, ficam sujeitas ao regime fiscal aplicável à respectiva actividade”.
O estabelecido na Concordata acaba por permitir uma geometria variável, ou seja, a nebulosa ambiguidade de fronteira entre a actividade religiosa e a de solidariedade social, não pode funcionar como uma esponja sobre os deveres de contribuição, alimentando, assim, mecanismos de iniquidade, que não podem, por Lei constitucional, infectar o domínio fiscal.
Na verdade, a solidariedade é um mecanismo de relacionamento comunitário entre os seres humanos baseado na ajuda mútua e nada tem a ver crenças religiosas mas com posturas civilizacionais, educativas e éticas que cimentam e dão coesão à vida em sociedade.
No Estatuto de Benefícios Fiscais (EBF) artigo 44 alínea f) link as IPSS estão isentas de IMI no diz respeito aos imóveis directamente afectos à actividade de solidariedade social enquanto que as Misericórdias tem benefícios mais vastos abrangendo todo o seu património imobiliário. Claro que esta isenção transversal e abrangente para quaisquer tipo de culto privilegia a Igreja Católica única, no terreno, que possui Misericórdias.
Não se percebe esta destrinça e porque razão o templo existente numa determinada localidade ou bairro deve arrastar na ‘peugada isentatória‘ a residência do funcionário oficiante, clérigo ou responsável. E indo mais além (para situações industriais ou de escala), por exemplo, em relação ao contexto de Fátima, não se entende como uma instituição hoteleira como a Casa das Irmãs Dominicanas, com 119 quartos e muitas mordomias, se enquadra numa actividade de índole religiosa ou de solidariedade social.
Todavia, entrando mais fundo na questão e questionando todo um sistema de captação de receitas fiscais, é difícil compreender alguns aspectos relativos ao IMI.
As Autarquias não investem especificamente na edificação de construção ou aquisição de uma habitação própria e condigna, preceito que está inscrito na Constituição (artigo 65, nº. 1) link.
As Câmaras exercem um papel regulador e fiscalizador, visando o cumprimento dos controversos Planos Directores Municipais, cobrando emolumentos por essas actividades e aplicando coimas (quando não embargos) pelas prevaricações detectadas.
Uma coisa é tributar o património material acumulado, outra será tributar o exercício material de um direito de qualquer cidadão. Um proprietário de um lote de múltiplos imóveis, será dono de um património imobiliário ‘pesado’ que deve ser tributado mas, mesmo nesta situação, deveria ficar isento da sua habitação declarada (e verificada) como sendo residência habitual e permanente.
Em resumo, a questão fulcral não pode ser as isenções em si mesmas, embora algumas das que verificamos no dia-a-dia sejam atentatórias dos princípios da igualdade e universalidade à custa de disposições emanadas da Concordata (um convénio datado e hoje manifestamente obsoleto). Se existir o desejo de contemplar o exercício de funções sociais, concebido em termos abrangentes, a isenção de IMI não pode ficar restrita aos locais de culto, às IPSS ou às Misericórdias.
O lar – o doce lar – deverá ser identificado e tratado como sendo por excelência o lugar de culto da família, logo, com relevante impacto social.
Seria bom que as indignações das instituições religiosas face à cobrança do IMI fossem capazes de questionar genericamente a voracidade tributária. Não basta salvar a própria pele sendo preciso estender a justiça (social, tributária e outras) a todos.
Enquanto a sociedade não for capaz de enfrentar este problema o melhor seria não continuar a alimentar iniquidades. Rever (ou denunciar) a Concordata é um assunto que a cobrança de IMI deve colocar na ordem do dia da agenda política. A laicidade do Estado obriga a isso.

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