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Mártires da ICAR

As Igrejas pelam-se por mártires. Os santos têm baixa cotação e poucas se dedicam à sua criação e exploração. A ICAR entrou na era industrial com JP2, um caso de superstição obsessiva e doentia fixação em cadáveres, a quem atribuía virtudes passadas e poderes perenes. Para fabricar um santo basta inventar dois milagres e cobrar os emolumentos do processo canónico. Para produzir mártires urge encontrar algozes adequados à transformação das vítimas em mito.

Os mártires podem ser dementes que procuram o Paraíso ou infelizes que estão à hora certa no lugar errado com parasitas de Deus à espera de explorarem a desgraça. Os suicidas islâmicos estão no primeiro caso, os missionários que caíram entre canibais fazem parte do segundo. Estes, em vez de serem amados pela Eucaristia que levavam eram apreciados por si próprios, como manjar divino, em ávida antropofagia.

O nacionalismo e a fé andam de mãos dadas. A vontade divina coincide muitas vezes com a do príncipe e este é habitualmente um agente predestinado. A glória terrena facilita-lhe a bem-aventurança eterna. A rainha Santa Isabel fez aquele milagre das rosas, um milagre de que uma tia avó, húngara, certamente lhe enviara a receita para Aragão. Além do nome, herdou-lhe, com o truque, a santidade.

Nuno Álvares Pereira andou aí, depois de muitas humilhações nas provas para santo, a ser ultrapassado pelas bentinha de Balasar, os pastorinhos de Fátima e outros pios cadáveres com milagres comprovados e devoções firmadas. Faltou-lhe o martírio que infligiu aos castelhanos e a coragem da Cúria Romana para enfrentar Espanha. Depois, quando já poucos acreditavam em milagres, encomendaram-lhe um para dinamizarem a estatuária e colocarem nas igrejas uma peanha mais.

Fadados para a santidade, o Vaticano, bairro que também usa a alcunha de Santa Sé, publicou em 2004 uma lista dos empregados mártires: 12 sacerdotes, 1 missionário, 1 religiosa e 3 leigos. As mortes são de lamentar mas o seu aproveitamento para fins de propaganda é uma macabra operação de marketing de que a ICAR se aproveita. O Cardeal Crescenzio Sepe, então o prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, recordou esse “generoso tributo de sangue de muitos irmãos e irmãs para o crescimento da Igreja no mundo”.

Morrer ao serviço de Deus é garantir o Paraíso – prometem os padres com a mesma convicção com que na praça nos garantem a excelência da hortaliça e no talho a saúde do animal de que nos corta os bifes.

Perfil de Autor

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- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa

- Sócio fundador da Associação República e laicidade;

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- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»

- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:

- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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