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Mês: Setembro 2014

26 de Setembro, 2014 Carlos Esperança

O Vaticano e o papa Francisco

O papa Francisco, com as suas decisões, não prova a existência de Deus mas revela o seu carácter.

A prisão inédita de um núncio, um arcebispo à espera do barrete cardinalício, é um ato de extrema coragem ou uma habilidade para o subtrair ao julgamento dos países onde delinquiu. Admito que seja a primeira razão.

Depois de ter condenado a Máfia, antiga aliada do Vaticano, e de excomungar os seus membros, ainda que a excomunhão seja um placebo; depois de ter transformado o IOR num banco normal e impedido a continuação da lavandaria de dinheiro sujo, mesmo que fosse pela pressão internacional, revela um homem diferente dos seus dois antecessores, igualmente santos e infalíveis.

Francisco corre o risco de morte súbita e de ir precocemente apresentar-se ao patrão.

25 de Setembro, 2014 José Moreira

Liberdade religiosa

Sem quaisquer comentários, transcrevo uma notícia recolhida há menos de um minuto.

 

O Tribunal Constitucional (TC) anulou uma decisão judicial de despedimento de uma funcionária de uma empresa, por esta recusar trabalhar após o por do sol de sexta-feira até ao crepúsculo de sábado, devido à religião que professa. Em acórdão publicado hoje em Diário da República, os juízes conselheiros da 3.ª Secção do TC entenderam “conceder provimento ao recurso” apresentado pela recorrente, funcionária de uma empresa de de instrumentos médicos, que alegou “o direito à liberdade religiosa”, consagrado na Constituição. O TC determinou ainda que o Tribunal do Trabalho de Loures, primeira instância, proceda à revogação do “acórdão recorrido, para que seja reformado”. A decisão do 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Loures, datada de 19 de junho de 2011, considerou a “licitude” do despedimento, porém a funcionária recorreu para a Relação de Lisboa por entender que tinha o direito “de recusar a prestação da sua atividade a partir do por do sol de sexta-feira até ao por do sol de sábado”. Justificava com o facto de “a religião que professa observar esse período como dia de descanso”, pelo que recusou o “cumprimento do horário integral às sextas-feiras”, quando o seu turno “terminava à meia-noite”, ou “prestar trabalho suplementar ao sábado, quando solicitado” pela empresa. A 15 de novembro de 2011, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão da primeira instância, sublinhando que a funcionária causou “prejuízos consideráveis à sua entidade empregadora”. No recurso para o TC, a profissional alegou “violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da igualdade” e sustentou que a Lei da Liberdade Religiosa consagra “o direito de dispensa do trabalho”.

25 de Setembro, 2014 Carlos Esperança

O Catur e o funeral do Martins (Crónica)

Em defesa da civilização cristã e ocidental, como dizia Cerejeira da guerra colonial.

Numa placa de bronze da estação do Caminho de Ferro estavam gravadas em relevo, em letras maiúsculas, as seguintes palavras: «Aos 12 dias do mês de Abril de 1964, Sua Ex.ª o Governador Geral de Moçambique, Contra Almirante Manuel Maria Sarmento Rodrigues, deu início aos trabalhos de construção do último troço do Caminho de Ferro para a cidade de Vila Cabral», com letras destacadas para o Governador e a cidade.

Era do Catur, onde chegavam de comboio, que partiam as tropas, em viaturas militares, para o distrito de Niassa, rumo a Malapísia, Massangulo e Leone ou, com passagem por Vila Cabral, para Meponda, Litunde, Cantina Dias, Unango, Chiconono, Maniamba, Metangula, Nova Coimbra, Lunho, Miandica, Cobué, Macaloge, Valadim, Luatize e, no extremo norte, Pauíla e Olivença.

Colunas de viaturas levavam as Companhias cujos militares aguardavam o paludismo, a morte e os aleijões, do corpo e da mente, na guerra inútil e criminosa que uma ditadura quis, até ao golpe de misericórdia, de um punhado de heróis, numa madrugada de abril.

Em finais de 1967 havia mais meia dúzia de quilómetros de carris e a terraplanagem que se dirigia a Nova Guarda, um acampamento a meio caminho de Vila Cabral, a cerca de 40 km de cada lado. O Santos e o Martins eram dois capatazes que vigiavam os negros, os únicos a quem o trabalho duro na via férrea era destinado.

O Santos era solteiro. O Martins vivia com a mulher e a filhita de tenra idade quando ali chegou o Batalhão de Caçadores n.º 1936. Ambos frequentavam livremente a cantina do aquartelamento onde arranjavam parceiros para jogarem à malha na «avenida», o largo caminho de terra batida que as chuvadas convertiam em lamaçal até voltar a ser avenida depois de uma hora de sol.

Numa madrugada de finais de 1968 ou início de 1969, a memória já não recorda a data e quanto desejaria esquecer os factos, o quartel acordou com o estrondo de uma explosão a cerca de três quilómetros. O Torres, despertado pela detonação e vestido à pressa, não se atrasou a partir com uma secção reforçada a verificar a ocorrência, seguindo a picada que ladeava a linha do caminho de ferro. Minutos depois viu o guarda-costas do Martins, ferido sem gravidade, e dele colheu as primeiras informações. Restou seguir o rasto de sangue depois de os soldados terem procedido à macabra recolha de despojos humanos, pedaços de corpo espalhados, incluído o dedo que guardou a aliança.

Algumas centenas de metros depois, quando os carris tomavam a inclinação ascendente, lá estava, imobilizada, a zorra. No lugar do condutor estava sentado o que restava de um corpo, aquilo a que ficou reduzido o Zé Martins. Uma granada de bazuca atingiu-o em cheio na espera que lhe fizeram, obra da Frelimo, execução ou vingança, já não importa.

A granada decepou literalmente o corpo, desde o ombro esquerdo, levando o mamilo direito, num tétrico plano oblíquo que espalhou pedaços em redor. Os restos do Martins foram transportados, com lágrimas e terra, por soldados que os juntaram à parte inferior do corpo, num saco de plástico opaco, antes de acabarem na urna que iria para a Missão de Massangulo, em cujo cemitério foram sepultados.

No dia do funeral o major Beirão pediu-me para comandar a escolta que lhe concederia honras militares, a salva de tiros que, em zona de guerra, equiparava civis caucasianos a soldados. Alegou que eu era visita de casa dele, era verdade, onde jantei várias vezes a seu convite. Não era difícil gritar as ordens em que a última seria: fogo! E assim foi.

Depois disso bastaria um olhar para que a urna descesse à cova e o coveiro lançasse a primeira pazada de terra antes de se ouvir o som cavo da pancada na madeira da urna. Só não contei que, antes disso, o pai do Martins, que viera de Lourenço Marques, dilacerado, se abeirasse de mim e, ajoelhando, com a voz embargada, suplicasse para deixar abrir o caixão. Para dar ao filho um último beijo, na testa.

Ficaram suspensos os que empunhavam as cordas que desceram a urna. O meu olhar ou alguma lágrima foi o sinal para continuarem.

Um «não» impercetível perdeu-se no espaço lúgubre do cemitério da Missão enquanto o padre cobria com orações o silêncio e a imagem de um homem dilacerado pela perda do filho.

24 de Setembro, 2014 Carlos Esperança

A demissão de Gallardón – coerência e intolerância

Alberto Ruiz Gallardón pôs fim a uma carreira política de trinta anos e às aspirações de quem liderou o município e a Comunidade de Madrid e exerceu os mais altos cargos no Partido Popular espanhol. Ontem demitiu-se de ministro da Justiça, da liderança do PP e de deputado, anunciando a renúncia irrevogável à vida política.

O antigo aluno dos jesuítas, devoto e reacionário, na demente obsessão misógina, quis revogar o direito de as mulheres abortarem em casos de malformação fetal. Só o risco de saúde física, psíquica e de vida e a violação da mulher ficavam ao abrigo de sansões penais nos casos de IVG.

O projeto de lei de Gallardón, encomendado pelo PP, tinha sido aprovado em Conselho de Ministros mas as sondagens esmagadoras que o repudiavam e as convulsões sociais, dentro do próprio partido, fizeram recuar Rajoy, que, pragmático, preferiu esquecer as promessas, temendo as próximas eleições, e sujeitar-se à herança legislativa do PSOE.

Deve admirar-se em Gallardón a coerência e a determinação, enaltecer-lhe o carácter e apreciar-lhe a decisão. As suas ideias podem merecer discordância mas são legítimas. O que o torna obsoleto e censurável é querer impor as suas ideias através dos tribunais e da polícia. A lei atual não obriga ao aborto, legitima-o apenas, porque os princípios que a informam não são alheios ao sofrimento das mulheres a quem a ecografia revela fetos anencéfalos, com trissomias, espinha bífida ou outras malformações incompatíveis, ou não, com a vida.

Querer sujeitar ao Código Penal as mulheres, nessas situações, e aumentar o desespero dos casais, é tão demente como prender uma dessas mulheres para a obrigar a abortar.

23 de Setembro, 2014 Carlos Esperança

O Vaticano sob ameaça – 2

A segurança da Basílica de S. Pedro foi reforçada na sequência da ameaça de um ataque terrorista logo que o embaixador do Iraque comunicou à Imprensa italiana a intenção de jihadistas a querem matar o Papa.

Estaline, mais cruel do que lúcido, afirmou que o Vaticano não tem divisões militares. E é verdade. Assim, perante o risco de os chanfrados de Maomé cometerem um crime no Estado que os reduziu, há que usar as armas que fabrica e promove.

Lausperenes, missas de ação de graças, novenas e igrejas abertas com o Senhor exposto são armas a usar. Batalhões de frades em orações e jejuns, regimentos de carmelitas descalças a debitar ave-marias e bispos católicos, de mitra e báculo, de turíbulo em riste, a espalhar incenso, são estratégias a desenvolver.

Multidões de beatos em peregrinações e catadupas de orações podem levar o Deus dos cristãos a mandar medicamentos ao Deus dos muçulmanos. Os pingos de um para os desvarios do outro são uma terapêutica a encarar quando Jeová, pela idade e caruncho, parece não ter cura.

23 de Setembro, 2014 Carlos Esperança

Hawking

Hawking

Numa interessante entrevista ao jornal El Mundo o astrofísico e pensador britânico Stephen Hawking lançou achas para a fogueira no sentido de se reabrir o profícuo e necessário debate entre a Ciência e a Religião.
Disse: “No passado, quando não entendíamos a ciência, era lógico crer que Deus criou o Universo. Mas agora a ciência oferece uma explicação mais convincente. O que quis dizer quando disse que conheceríamos a ‘mente de Deus’ era que comprenderíamos tudo o Deus seria capaz de compreender se acaso existisse. Mas não há nenhum Deus. Sou ateu. A religião crê em milagres, mas estes não são compatíveis com a ciência”… link.