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  • 13 de Maio, 2014
  • Por Carlos Esperança
  • Fátima

Fátima, terra de fé – 13 de maio

Nascida para lutar contra a República e transformada em arma de arremesso contra o comunismo, Fátima mantém-se como símbolo da crendice popular e caixa de esmolas que sustenta a máquina eclesiástica.

Os ateus são sensíveis ao sofrimento, às aflições, ao desespero e dramas das pessoas que exoneram da sua conduta a razão. Já não têm tanta benevolência para quem convence os crentes do gozo divino com as chagas nos joelhos e as maratonas pias ou com as ofertas de objetos de ouro que atravessaram gerações na mesma família para acabarem no cofre forte da agiotagem clerical.

As cambalhotas solares, as digressões campestres da Virgem e a aterragem do anjo no anjódromo de Fátima não foram originais e exclusivas da Cova da Iria. Foram tentadas em outras latitudes e repetidos em versões diversas até atingirem a velocidade de cruzeiro da devoção popular e o pico da fama que tornou rentável a exploração.

Em 2008, o cardeal Saraiva Martins, um clérigo atrofiado por longos anos de Vaticano, dedicado à investigação de milagres e à pesquisa da santidade, presidiu à peregrinação… contra o ateísmo. Podia ser a favor da fé, mas o gozo do conflito levou a Igreja a deixar cair a máscara da paz e a exibir o carácter belicista que carrega no código genético.

Há militares que regressaram há mais de cinquenta anos da guerra colonial e que, ainda hoje, vão a Fátima agradecer o milagre do retorno, prodígio negado a muitos, vítimas da civilização cristã e ocidental para cuja defesa o cardeal Cerejeira os conclamava.

Perdido o Império, desmoronado o comunismo, o negócio mudou de rumo e de ramo. É o emprego que se mendiga a troco de cordões de oiro, a saúde que se implora de vela na mão, a cura suplicada com cheiro a incenso e borrifos de água benta. Enquanto houver sofrimento o negócio floresce. Dos bolsos saem os euros dos peregrinos, e os olhos dos crentes marejam perante a imagem de barro que a coreografia pia carrega de emoção.

No próximo ano, no mesmo dia, repete-se o cenário, e os corações dos devotos exultam com fé igual à que os índios tributam às fogueiras para atraírem chuva. Com os joelhos esfolados, pés doridos e o coração a sangrar.

Perfil de Autor

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- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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