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Mês: Abril 2014

22 de Abril, 2014 Carlos Esperança

O fundamentalismo não é um exclusivo islâmico

1 – Naquele tempo andava em alta a fé e pouco estimada a cultura. Sobraçava a pasta, nesse remoto Ano da Graça de 1992, um simples «ajudante de ministro» de seu nome Pedro Santana Lopes, acolitado por dois subajudantes, Maria José Nogueira Pinto e António Sousa Lara.

Coube a este último pronunciar-se sobre a obra «O Evangelho segundo Jesus Cristo», do «inveterado ateu» José Saramago que concorria a um prémio literário. Disse o pio, que Deus abandonaria nas trapalhadas da Universidade Moderna, que «A obra atacou princípios que têm a ver com o património religioso dos portugueses. Longe de os unir, dividiu-os» e, com tão clemente argumentação, o mullah Lara vetou o livro.

2 – «Tal como em 1499, são eles (Dominicanos) que estão à frente da matança iniciada em 19 de Abril de 1506 em Lisboa. No decorrer de uma cerimónia religiosa na Igreja de S. Domingos, um homem que participava no culto, no momento em que o povo gritava «milagre» à vista de um resplendor que saía de um crucifixo, teve a ideia inoportuna de argumentar que se tratava apenas do reflexo de uma vela. Foi logo taxado de «Cristão-Novo», morto e queimado in loco. Dois frades dominicanos brandindo crucifixos excitaram os fiéis aos gritos de «heresia, heresia». Durante três dias a cidade esteve nas mãos dos amotinados, que pilhavam as casas, atiravam mulheres e crianças da janela à rua e acendiam por toda a parte fogueiras onde ardiam vivos e mortos». “Judeus e Cristãos-Novos”, António José Saraiva.

3 – «A maior das falácias é achar que é a religião que está no centro destes eventos (e se fosse? O que é que mudava?) mas claramente uma recusa política da democracia e uma recusa cultural da tolerância, da liberdade, das diferenças» J. Pacheco Pereira (Público)

4 – A blasfémia é um crime medieval que hoje tem menos valor do que a liberdade de expressão, direito a que não devemos renunciar. Renunciar aos direitos conquistados na Europa, contra o clericalismo, é regressarmos ao fundamentalismo romano.

5 – Respondendo a um leitor que me chamou «racista» por ter escrito «O Islão não é a apenas uma religião estúpida, consegue ser também a mais hipócrita», respondo-lhe, em nome da liberdade e da sua defesa, que repudio igualmente as Cruzadas, a Inquisição, o Nazismo, o Estalinismo e todas os sistemas totalitários.

6 – Dizem-me que há um islão moderado. Não o vejo condenar Bin Laden, aceitar a separação da Igreja e do Estado, renunciar à sharia, admitir a igualdade dos sexos ou defender a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

7 – Quando alguém diz defender a liberdade, mas…, sinto no uso da adversativa um velho conformismo com os demónios da censura, um temor reverente ao poder, uma capitulação perante a prepotência, a brutalidade e a força.

A 4 dias do 25 de Abril lembrei-me dos fundamentalistas que o abominam e dos que o reclamam como um exclusivo seu. Indiscutível, foi a cumplicidade da Igreja católica com a ditadura.

20 de Abril, 2014 Ludwig Krippahl

Treta da semana (passada): a prova.

No blog Senza Pagare há um post que explica: «Como provar que o Catolicismo é a forma verdadeira do Cristianismo» (1). É fantástico. De um arremesso resolve uma carrada de perguntas que há milénios suscitam discussão, por vezes com violência. Se há vida depois da morte, quem criou o universo, se existem deuses, quais e o que pensam da contracepção. Tudo isso respondido «uma forma simples e rápida». Primeiro, resolve-se o problema de provar que é o cristianismo a única religião verdadeira: «Maomé ou Buda ressuscitaram dos mortos? Não. Portanto isto termina muito rapidamente o debate sobre as religiões do mundo.» Tau! Toma que já levaste.

Depois é preciso resolver o problema das «36,000 denominações que entram em conflito sobre as crenças e moral cristã». Trinta e seis mil denominações cristãs que não são católicas. Como é que podemos rapidamente saber que a católica é a verdadeira? É também muito simples. «Comecem por Martinho Lutero. Lutero fez algum milagre? Fez alguma profecia que veio a acontecer? Não, nada disso.» E já está. Começa-se por Lutero, que vai logo fora porque não fez milagres, e as restantes 35,999 denominações vão fora também por arrasto. Sobra só a católica que, segundo o autor, podemos concluir ser verdadeira porque enquanto Lutero andava sentado nas mãos sem milagrar coisa nenhuma «aconteceu o milagre de Nossa Senhora de Guadalupe (um milagre público) a S. João Diogo e a milhões de Astecas», já para não falar no «missionário Católico S. Francisco de Xavier» que, por essa altura, «estava a pregar miraculosamente aos povos da Índia, Indonésia, etc. nas suas línguas maternas sem as estudar.» Temos também muitos milagres públicos reivindicados pelos católicos nos últimos 100 anos, como as aparições de Maria em Fátima, a água mágica de Lourdes e o Padre Pio que sangrou das mãos e dos pés, um milagre de utilidade dúbia mas aparentemente impressionante.

É um curriculum difícil de superar. Assim de momento ocorre-me apenas uma outra divindade que possa concorrer com Jesus e os seus dois parceiros co-substantivos em matéria de milagres recentes e ressureição. Falo, naturalmente, de John Frum (2). Tal como Jesus, John Frum também fez o milagre de viajar do mundo dos mortos, o mundo dos deuses e dos antepassados, para o nosso plano mortal. Tal como o católicos, também os seguidores de John Frum foram testemunhas de muitos milagres que não conseguiam explicar, e em pleno século XX. É difícil decidir qual dos dois será mais plausível, mas este post que traduziram para o Senza Pagare contrasta marcadamente com a abordagem normalmente enfadonha da teologia e da filosofia da religião. É uma espécie de autoclismo argumentativo. Com uma puxadela vai-se tudo embora. Todas as religiões não cristãs, dezenas de milhares de seitas cristãs não católicas e tudo o resto. Fica apenas o catolicismo, um pequeno resquício desta diversidade toda ainda agarrado à loiça. Demonstra também quão pequena é a diferença que separa o crente do ateu. Metaforicamente, o ateu apenas se distingue do crente por dar uma passagem final com a piaçaba.

PS: Calhou, por acaso ou por mão divina (e se não me falham as contas), ser esta a treta da semana com o número 365. Foram sete anos de rubrica semanal regular, à parte de alguns atrasos quando o trabalho aperta mais. Aqui fica o link para o primeiro post da série, a 22 de Abril de 2007: Treta da semana: o meu horóscopo. Bom resto de Páscoa e desejos de muitas amêndoas e ovos de chocolate para celebrarem o dia em que os judeus pintaram as ombreiras das portas com sangue de carneiro para Deus, no seu infinito amor, só matar os filhos dos egípcios, louvado seja.

1- Senza Pagare, Como provar que o Catolicismo é a forma verdadeira do Cristianismo (Dica: Milagres).
2- Wikipedia, John Frum, e Damn Interesting, John Frum and the Cargo Cults

Em simultâneo no Que Treta!

20 de Abril, 2014 Carlos Esperança

A missa na aldeia (Crónica)_1

Os sinos da igreja intimavam os paroquianos para a missa. O templo ia enchendo, homens à frente, mulheres atrás, os menos pobres nas primeiras filas, sempre conforme à hierarquia e à tradição. Uns minutos antes das nove ouvia-se a moto do padre Farias que já tinha despachado a missa das oito em Casal de Cinza e ainda o esperava a das dez noutra paróquia.

Entrava sempre com o ar mal disposto de quem sentia o penoso serviço de Deus como condenação, em paróquias pobres, de gente rude, sem instrução nem banho. Ainda há dois dias ali estivera para ouvir em confissão os pecadores mais aflitos ou com hábitos mais frequentes da eucaristia. Não tardariam a chamá-lo de novo para levar o viático a um desgraçado que já não descolava da cama nem para a santa missa.

O latim deixava estarrecidos os crentes pelo carácter esotérico que assumia aos castos tímpanos de quem até o português, para lá de algumas centenas de palavras, soava a latim ou parecia língua estrangeira criada por Deus para confundir os homens das obras na Torre de Babel.

A homilia era breve e as ameaças repetidas. Trabalhar ao domingo deixava o Senhor furioso, comer carne à sexta-feira era veneno para a alma de quem não tivesse a bula, a côngrua andava atrasada por parte de alguns paroquianos, a trovoada tinha dizimado as searas, era certo, mas a culpa não lhe cabia a ele, padre Faria, que cuidava das almas, a moto não se movia a água nem o mecânico a consertava a troco da absolvição dos pecados. Mas o mais injurioso para Deus, e arriscado para a alma, era trair a castidade pela qual a Santa Madre Igreja tanto zelava.

Dita a missa, antes de deixar sair os paroquianos, fazia avisos: pedia a quem encontrasse uma burra que avisasse o dono, lembrava às freguesas que as crianças podiam ficar em casa se não se calassem na missa, que todos os cristãos podiam batizar um recém nascido em perigo de vida, ‘in articulo mortis’, sem necessidade de estafeta a exigir a sua presença, com risco de estar ausente ou de lhe minguar a disponibilidade.

Recordo as pias mulheres, embiocadas no xaile e lenço negro, a debitar ave-marias, sem me ocorrer que vivessem o drama de D. Josefa que Eça nos apresenta «toda sossegada, toda em virtude, a rezar a S. Francisco Xavier – e, de repente, nem ela soube como, põe-se a pensar como seria S. Francisco Xavier, nu, em pelo».

Já não me surpreende que a Ti Celesta, transida de frio e carregada de fome, de fé e de filhos, sempre com aquela tosse que irritava o padre e merecia das outras mulheres o diagnóstico de tísica, se debatesse com o mesmo problema da D. Josefa de «O crime do padre Amaro», talvez em situações mais graves.

A bondosa D. Josefa acrescentava à nudez fantasiada do santo outro pecado que a torturava: «quando rezava, às vezes, sentia vir a expetoração; e, tendo ainda o nome de Deus ou da Virgem na boca, tinha de escarrar; ultimamente engolia o escarro, mas estivera pensando que o nome de Deus ou da Virgem lhe descia de embrulhada para o estômago e se ia misturar com as fezes! Que havia de fazer?”
Com a Celeste a consumição era maior, embora alheia à metafísica. A tosse e a expetoração apoquentavam-na durante a eucaristia e o padre Farias já a tinha ameaçado de lhe recusar o sacramento apesar da devoção com que cumpria os deveres canónicos e a regularidade com que paria um filho por ano.

Mal o corpo e o sangue do Cristo lhe eram pousados na língua, em forma de alva rodela de pão ázimo, logo as secreções lhe acudiam à boca parecendo acalmar à medida que o alimento espiritual aconchegava o trato gastrointestinal, acalmando o jejum e o catarro, seguindo o curso fisiológico.

Depois, enquanto o padre desaparecia sobre a moto, entre nuvens de pó, ficavam os homens a falar da vida enquanto as mulheres regressavam a casa a fazer contas à vida e os garotos enganavam a fome com uma bola de trapos, sem pensar na vida.

19 de Abril, 2014 Ludwig Krippahl

É ideologia, mas não como a outra.

Num comentário ao meu post anterior, o Carlos Soares escreveu que «O ateísmo é uma ideologia, como outra qualquer» (1). Em parte tem razão. Parte do que referem quando me chamam ateu é a minha atitude de não venerar nada, de não ter fé e de não reconhecer coisa alguma como divina. Isso, admito, é tão ideológico como ter fé ou venerar uma divindade, pelo menos no sentido de ideologia como “visão do mundo”. Em ambos os casos, tanto o crente como o ateu têm uma noção normativa de qual a melhor atitude a ter. No entanto, o Carlos está enganado ao julgar que o ateísmo é uma ideologia «como outra qualquer». Em particular, é muito diferente das ideologias religiosas.

A outra parte do que referem quando me chamam ateu é a minha opinião de que o universo não foi criado por algum ser inteligente com poderes sobrenaturais. Essa parte é completamente independente da minha ideologia de não religioso. É apenas uma conclusão à qual chego da mesma forma que concluo que não tenho o poder de mover objectos com a mente nem consigo fazer feitiçarias. Gostava que a realidade fosse outra. Gostava de ter poderes especiais ou de ser amigo pessoal do criador do universo. Mas os factos indicam que não é esse o caso e, quando se trata de factos, sinto que devo pôr de lado os meus desejos e encarar a realidade como ela se apresenta. Portanto, as minhas conclusões acerca dos factos não derivam da minha atitude de não venerar divindades. Derivam apenas da informação na qual posso, objectivamente, fundamentar conclusões.

O mesmo se passa no outro sentido. A minha ideologia de irreligioso também não depende dos factos serem assim ou assado. Se o universo tivesse sido criado por Deus, se Jesus viesse a minha casa explicar como o tinha feito – a bíblia é notoriamente omissa nesses detalhes – e até mesmo se nos tornássemos grandes amigos, eu continuaria ateu na minha ideologia. Admitiria ser verdade que existia esse tal criador e que tinha feito tudo e um par de botas mas continuaria a não ter qualquer disposição para missas, rezas, veneração ou fé. Até podia simpatizar com ele. Se ele merecesse, até poderia amar Deus. Mas nunca “amar a Deus” como o crente religioso, com aquela preposição que nem sequer compreendo. A minha falta de disposição para me ajoelhar, rezar, ter fé ou participar em rituais é algo subjectivo que não tem nada que ver com a minha opinião acerca dos factos.

É nesta independência entre os aspectos ideológicos e as opiniões factuais que o ateísmo difere fundamentalmente das ideologias religiosas. Porque cada religião não só promove uma ideologia de veneração e submissão mas também entrosa esses aspectos subjectivos com alegações objectivas acerca dos factos que, por sua vez, impõe aos seguidores pelo dogma e pela fé. Isto é perigoso. Ter uma ideologia – uma “visão do mundo” – que assumimos puramente subjectiva e que se restringe apenas à forma como nos sentimos perante a realidade, sejam quais forem os factos, não levanta qualquer problema no convívio com outras ideologias igualmente subjectivas. Eu não gosto de rezar nem de ir à missa mas não me faz diferença que outros gostem. É uma mera questão de gosto, como uns gostarem de ervilhas e outros não. O que me preocupa nas religiões é que, para o religioso, a ideologia não se restringe ao subjectivo. Uma “visão do mundo” que distorce os factos e obriga à adesão intransigente a certos dogmas mistura perigosamente juízos de valor com questões objectivas. Por exemplo, um elemento central do cristianismo é que Jesus se sacrificou pelos nossos pecados e que apenas pela fé no poder redentor desse sacrifício merecemos evitar uma eternidade de sofrimento. Na Europa de hoje já são poucas as pessoas que levam isto a sério pelo que, felizmente, esta crença se torna cada vez mais inconsequente. Mas são muitos os exemplos históricos das consequências desta ideia de que quem discorda de uma alegação factual merece ser castigado e, infelizmente, em países menos esclarecidos ainda hoje muita gente sofre por esta misturada entre objectivo e subjectivo.

É verdade que, além do meu ateísmo objectivo de concluir que o universo não foi criado por um ser inteligente eu tenho também o ateísmo subjectivo e ideológico de não adorar nada como sagrado, nem mesmo que exista. Nem Jesus, nem o Sol, nem sequer o Joe Pesci. Mas esses meus ateísmos são independentes, o que me permite debater factos sem arriscar crises de fé e aceitar ideologias diferentes como meras diferenças de gosto. As ideologias religiosas, ao contrário do que o Carlos sugere, não são a mesma coisa. A confusão de factos com juízos subjectivos impede o religioso de discutir a verdade confortavelmente pelo perigo constante de ver refutada alguma tese a que dá valor, obriga-o a imiscuir-se na vida privada de terceiros condenando como “pecado” atitudes diferentes da sua, mesmo que inócuas, e leva-o a considerar ataque ou ofensa qualquer tentativa de mostrar que os dogmas que defende são infundados. Estas ideologias, muito diferentes do ateísmo, são socialmente prejudiciais e potencialmente perigosas.

No fundo, a grande luta daquilo a que muitos, por ignorância histórica, chamam “novo ateísmo”, é a luta por esta separação. Não é uma luta para acabar com a crença religiosa ou com a adoração de divindades. É a luta pela transformação dos religiosos em pessoas capazes de distinguir entre a realidade, objectiva, que todos partilhamos e os valores, subjectivos, com que cada um orienta a sua vida privada. Basta isso para que cada um possa aproveitar para si o que achar que a religião tem de bom sem prejudicar os outros com dogmas e disparates.

1- Treta da semana (passada): Agora tudo é religião…

Em simultâneo no Que Treta!

19 de Abril, 2014 Carlos Esperança

Sobre a criação de deus

DIVINA COMÉDIA

Erguendo os braços para o Céu distante
E apostrofando os deuses invisíveis,
Os homens clamam:-“Deuses impassíveis,
A quem serve o destino triunfante,

Porque é que nos criastes?!Incessante
Corre o tempo e só gera,inextinguíveis,
Dor,pecado,ilusão,lutas horríveis,
Num turbilhão cruel e delirante…

Pois não era melhor na paz clemente
Do nada e do que ainda não existe,
Ter ficado a dormir eternamente?

Porque é que para a dor nos evocastes?”
Mas os deuses com voz ainda mais triste,
Dizem:-“Homens!porque é que nos criastes?!”

Antero de Quental

18 de Abril, 2014 Carlos Esperança

A intolerância, a raiva e a vingança

Há cerca de dez anos que sou assíduo na blogosfera. Tenho mantido dois blogues que diariamente alimento com novos textos.

Um, o «Diário de uns Ateus», propriedade da Associação Ateísta Portuguesa, teve de ser alojado numa plataforma paga, para fugir aos constantes ataques com que as almas pias queriam ganhar o Paraíso. Já não lhes bastava os insultos aos colaboradores, de tal modo baixos, que deixei de frequentar a caixa de comentários!

Agora foi o Ponte Europa, vítima da fauna reacionária e da fúria dos imbecis que veem em Passos Coelho um PM, em Cavaco o PR de todos os portugueses e na presidente da AR uma pessoa sensata.

Sou persistente, e não abandono a luta pelo que julgo correto. Engano-me, sou algumas vezes injusto, e nem sempre sou suficientemente perspicaz para detetar montagens cujos especialistas estão normalmente na área do Governo. Mas nunca, absolutamente nunca, engano deliberadamente.

É com satisfação que anuncio aos leitores que o Ponte Europa, graças à generosidade de um engenheiro informático, já está livre dos energúmenos que o atacaram. Aí está, após dois dias em que se transformava em pinturas exóticas, na defesa dos princípios e ideias dos seus colaboradores.

Aqui fica o endereço: http://ponteeuropa.blogspot.pt/

18 de Abril, 2014 Carlos Esperança

Bento XVI e a cruzada contra a secularização da Europa

Das alfurjas do Vaticano ouviam-se latidos contra o laicismo. O pastor alemão mostrou os dentes, afiou as garras e vociferou latim. Saíram-lhe santas imprecações em forma de oração, por hábito e contenção beata.

Quando o paramentavam para os rituais, enquanto sentia as mãos macias do sacristão e as sedas que lhe moldavam a pele, B16 cismava vingar-se da Europa, indiferente a que as pessoas da Santíssima Trindade fossem três ou trezentas, os mandamentos da lei de Deus, dez ou cem, e os milagres necessários para criar um santo, dois ou duzentos.

Como chefe de um exército de sotainas convocou as hostes para anunciar o Evangelho, aqueles quatro livros cheios de contradições e de violência que se juntaram ao Antigo Testamento, por ordem de Constantino, escolhidos entre muitos outros ainda mais contraditórios e inverosímeis.

Quando pediu aos bispos «um testemunho claro, público e corajoso», B16 não mandou ensinar padre-nossos ou treinar beatos a ruminar ave-marias, usou um eufemismo para lançar a cruzada, fez uma declaração de guerra com palavras melífluas, incitou bispos a brandir o báculo e a arremeter contra Governos que se negassem a esportular o óbolo, a fazer a genuflexão e a dificultar o proselitismo.

Para B16 a liberdade era a «ditadura do relativismo», o respeito pelos Mandamentos de Deus (interpretados pela Mafia que dirigia) devia ser imposto e não admitia que «desapareça a identificação com o Magistério da Igreja», isto é, a subserviência à tiara.

B16 exortou os Bispos a que «exponham a Palavra de Deus com toda a clareza, mesmo os pontos que, muitas vezes, são escutados com menos vontade ou que provocam reações de protesto ou mesmo de deserção». É a ordem de marcha, em beata cruzada contra os infiéis, réprobos, apóstatas e ateus.

Francisco ainda não desautorizou o anterior Torquemada.