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Mês: Dezembro 2013

4 de Dezembro, 2013 Carlos Esperança

Sá Carneiro – aniversário da sua morte

Decorreu nesta quarta-feira a missa que assinalou o 33.º aniversário do desaparecimento de Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, vítimas da queda de um avião em Camarate, que ocorreu a 4 de dezembro de 1980.

Esta é a notícia comum da comunicação social. Ninguém se lembrou de referir que o bispo de Braga, D. Eurico Dias Nogueira, afirmou que, segundo o direito canónico, não tinha direito a cerimónias litúrgicas, por ter vivido amancebado, situação em que morreu na trágica queda do avião.

Enquanto o bispo de Braga defendia o direito canónico, o cardeal-patriarca, os bispos e numerosos padres deram colorido à mórbida encenação com que quiseram levar a PR o general Soares Carneiro, adversário de Ramalho Eanes.

E nunca mais lhe faltaram missas, apesar de ter morrido em pecado mortal.

3 de Dezembro, 2013 Carlos Esperança

O risível senhor Duarte Pio e os seus defensores

Surpreende-me que alguém, com formação democrática, defenda direitos vitalícios e hereditários que julgava reservados às moléstias, como a sífilis ou a esquizofrenia. Não aceito que se retire a qualquer cidadão o direito de ocupar o mais alto cargo do País, e repudio quem o atinja sem escrutínio popular, ou nele se perpetue, e se atribua o direito de o transmitir. Todos os homens nascem livres e iguais.

Sei que há cidadãos e vassalos. Há quem renuncie aos direitos de cidadania e à própria liberdade. Não é com esses que se constrói o futuro ou se conquista a liberdade. Os que renunciam aos seus direitos podem fazê-lo, não podem é confiscar os direitos alheios e opor-se ao princípio republicano de que os cargos públicos não são vitalícios nem transmissíveis.

Dado que a monarquia portuguesa esteve sempre ligada à Igreja católica e que esta era a religião oficial do país, há quem, por opção pia ou astenia democrática, insista na defesa de um anacronismo que exigiria descobrir um primeiro rei para ser o último.

Perante o folclore em volta de um figurante das revistas mundanas, aqui ficam algumas considerações para reflexão.

Os súbditos conhecem-no por Duarte Pio João Miguel Gabriel Rafael de Bragança. Parece um catálogo de nomes e, afinal, é um rol com que o titular enfeita as penas da descendência miguelista. Legalmente, é apenas Duarte Pio de Bragança, tendo deixado cair o João e três arcanjos com que se ornavam os príncipes da Casa de Bragança.

O Sr. Duarte é descendente de família pouco recomendável, de que a própria monarquia se libertou, por higiene política, quando D. Miguel I foi derrotado, exilado e banido do País, assim como os seus descendentes, entre os quais o especialista em milagres e autor de um opúsculo sobre S. Nuno Álvares cuja santidade foi obtida no ramo oftalmológico com a cura do olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com salpicos de óleo fervente de fritar peixe.

Quando o Sr. Duarte Pio nasceu, ainda sob a lei do banimento, foi logo batizado, tendo como padrinho da cerimónia católica, o Papa Pio XII, por procuração, pois o Papa de Hitler, como ficou conhecido, era mais dedicado ao nazismo e às Concordatas do que à família de seu pai, Sr. Duarte Nuno, banida de Portugal.

Duarte Nuno Fernando Maria Miguel Gabriel Rafael Francisco Xavier Raimundo António de Bragança era o nome do pai, imigrante que veio para Portugal em 1953, três anos após a Assembleia Nacional ter revogado a lei do banimento, por ordem do ditador e intervenção dos monárquicos fascistas. Foi-lhe atribuída uma residência, cedida pela Fundação da Casa de Bragança, com autorização do déspota de serviço, monárquico por convicção e ditador por decisão própria.

Tamanho nome recruta vassalos para o regime que expirou, para a família extinta e para um candidato a rei, que existe pela fé de dezenas de candidatos a súbditos. Com nomes tão extensos, bastaria referir duas gerações de primos e tios para, em vez do opúsculo, ter o Sr. Duarte matéria para um tratado, ainda que lhe faltasse o método e o objeto para o transformar em ciência.
O Sr. Duarte, mulher e filhos são, conforme o sexo, cavaleiros ou damas da «Soberana Ordem Militar de S. João de Jerusalém, de Rodes e Malta», locais onde os desconhecem e ninguém os reclama.

Se os portugueses ensandecessem ainda voltariam a ter, pela graça de Deus e desgraça nossa, um Rei de Portugal e dos Algarves d’Aquém e d’Além Mar em África, Senhor da Guiné e do Comércio, da Conquista e da Navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, Senhor Fidelíssimo, etc..

Estes títulos e a varíola foram erradicados e da sereníssima Casa de Bragança resta uma fundação. No passado foi uma instituição de geometria variável que começou a encolher com D. João II, que escusava ter degolado o seu 3.º duque, e que tem sofrido, ao longo da História, as vicissitudes políticas de quem detém o poder.

 

2 de Dezembro, 2013 Carlos Esperança

A Irmã Lúcia e o folhetim dos segredos

Irma_Lucia

 

 

Lúcia de Jesus dos Santos ou Irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, Irmã Lúcia, para os mais chegados, fez a 1.ª comunhão aos 6 anos e aos 14 tornou-se reclusa, como pensionista, na escola das Irmãs de St.ª Doroteia, em Vilar, próximo do Porto.

A 3 de janeiro de 1944, já com letra aprimorada e intimidade com o divino, escreveu, a pedido, a “Terceira Parte do Segredo de Fátima”, quando ainda usava o pseudónimo de Maria das Dores e vivia enclausurada em Tui, Espanha.

Já era então vasto o currículo místico, com amplo traquejo no campo das visões, desde as entrevistas com a Virgem, que saltitava de azinheira em azinheira, até aos rodopios do sol, transformado em bola de fogo, a brilhar em numerosas cores, e à viagem ao Inferno onde encontrou o Administrador do Concelho de Ourém, a frigir como merecia, por, em vida, ter faltado à missa.

A Terceira Parte do Segredo de Fátima foi um ponto alto da sua bibliografia pois era a profecia que o papa João Paulo II, na sua superstição, entendeu ser a seu respeito. Esse recado celeste vai agora ser investigado por uma professora catedrática de Coimbra, Maria José Azevedo Santos, não porque tenha a santidade no apelido, mas por ser uma cientista em Paleografia, Diplomática e Codicologia, ciências terrenas que hão de ajudar a compreender as idiossincrasias do Paraíso.

A Congregação para a Doutrina da Fé, ex-Santo-Ofício, de passado pouco estimável, é a possuidora do valioso documento, ora emprestado, pelo prazo de 1 ano, ao Santuário de Fátima onde integrará a exposição «Segredo e Revelação», evento que acordará paixões pias e êxtases místicos.

Espera-se que no acervo dos alvitres da Senhora do Rosário – nome com que a virgem se apresentou aos pastorinhos –, não faltem as cartas que a experiente vidente dirigiu a Marcelo Caetano pedindo legislação adequada para a altura das saias e o tamanho das mangas dos vestidos femininos.

Sabe-se que a Ir.ª Lúcia está no Céu porque, no dia do seu funeral, o Papa João Paulo II e o futuro Papa Bento XVI disseram que ela iria para o céu e Deus seria incapaz de lhes contrariar as previsões.

1 de Dezembro, 2013 Ludwig Krippahl

Fine-tuning e verosimilhança, parte 2.

Os modelos da física moderna são muito sensíveis aos valores de certos parâmetros. Este é um problema de fine-tuning porque é necessário afinar cuidadosamente os parâmetros para obter previsões correctas. Tradicionalmente, estes problemas têm se sempre resolvido descobrindo princípios mais fundamentais que unificam ou restringem os parâmetros livres. Mas como há pouco a dizer acerca de princípios que ninguém ainda descobriu, é mais interessante especular sobre o que seria se estes parâmetros pudessem mesmo variar na realidade e não apenas nos modelos. Multiversos, megaversos, universos exóticos com leis estranhas e assim por diante. Infelizmente, isto baralha algumas pessoas que depois julgam que este problema de fine-tuning está na realidade e não no modelo. É como julgar que a Terra é plana porque o mapa também é. Esse foi o tema da primeira parte (1). Esta é sobre uma aplicação incorrecta do princípio da máxima verosimilhança (PMV) para resolver esse problema meramente hipotético.

O argumento apresentado pelo Bernardo Motta, mas originalmente do Robin Collins, alega que, por um lado, a probabilidade de observarmos um universo como este assumindo os modelos da física é muito baixa por causa desses parâmetros soltos que é preciso ajustar mas, por outro lado, a probabilidade de haver um universo como este é muito alta se assumirmos que existe um deus que quer criar um universo assim. Assim, alegadamente, o PMV leva-nos a crer num deus criador. Isto é persuasivo para quem souber o suficiente sobre o PMV para reconhecer a sua importância mas não o suficiente para perceber o embuste desta aplicação. Como só consigo explicar isto num post chato, peço desde já desculpa pelo que se segue.

Vamos imaginar que lançámos uma moeda dez vezes e queremos saber se a moeda é equilibrada. O resultado foi:

Cara, coroa, coroa, coroa, cara, coroa, coroa, coroa, coroa, coroa.

Se assumirmos que a moeda é equilibrada, com 50% de probabilidade de calhar cara ou coroa em cada lançamento, a probabilidade de ter só duas caras em dez lançamentos é de 4%*. Isto pode justificar rejeitarmos como inverosímil que a moeda seja equilibrada. É mais plausível que esteja torta.

Podemos também usar o PMV para determinar os melhores parâmetros para uma família de modelos. Vamos chamar p à probabilidade de calhar cara, sendo 1-p a probabilidade de coroa. Isto define uma família de modelos onde cada modelo tem o seu valor de p entre 0 e 1. O melhor modelo, pelo PMV, é aquele em que p=0,2 porque assim maximizamos a probabilidade de obtermos os nossos resultados, duas caras e oito coroas.

Para comparar famílias de modelos a coisa complica-se um pouco. Vamos imaginar uma família alternativa de modelos com os parâmetros p1 a p10 definindo a probabilidade da moeda calhar cara em cada lançamento. Se fizermos p1 e p5 ser 1 e os restantes 0, a probabilidade de obter aquela sequência acima será 100%, enquanto a outra família de modelos, mesmo com p=0,2, tem uma verosimilhança de apenas 0,5% para esta sequência de lançamentos. No entanto, é obviamente errado estar a usar os dados para maximizar a verosimilhança atribuindo, a posteriori, uma probabilidade específica a cada lançamento**.

Para compensar este efeito, quando se compara famílias de modelos integra-se as probabilidades por todos os valores dos parâmetros. Neste caso, temos de variar p entre 0 e 1 para a primeira família e todos os p1 … 10 independentemente para a segunda. Apesar daquele pico alto quando os parâmetros da segunda estão exactamente certos, o espaço onde falha é muito maior e a primeira será a mais verosímil. É isto que acontece se compararmos a hipótese dos grãos de areia do estuário do Tejo estarem naquela configuração por acaso ou porque um duende invisível de Caxias usou poderes mágicos para pôr a areia exactamente assim. Havendo tantas possibilidades diferentes, seria improvável calharem naquela posição por acaso. Mas a hipótese do duende tem muitos parâmetros indeterminados. Podia querer pôr a areia exactamente como está mas também podia ter preferido pôr os grãos de outra maneira, mandar a areia toda para Marte, transformar tudo em gelatina de morango ou qualquer outra coisa. Quando consideramos todas estas variantes a verosimilhança da hipótese do duende torna-se ainda mais baixa do que a da hipótese da areia estar assim por acaso. E ainda bem.

Quando o Robin Collins estima a verosimilhança dos modelos da física moderna não usa apenas os valores ajustados dos parâmetros, o que daria uma verosimilhança de 1 porque foram escolhidos para prever este universo. Correctamente, considera toda a variação hipotética desses parâmetros e estima uma verosimilhança muito baixa. Mas depois faz batota com a alternativa. É que isso de Deus ter criado o universo também é uma família de modelos e também tem parâmetros livres. Deus podia querer um universo como este, ou um universo onde aparecesse inteligência logo ao fim de mil milhões de anos ou só ao fim de cem mil milhões de anos. Podia querer um universo completamente diferente e inimaginável com seres de energia, almas desencarnadas ou animais com 15 dimensões. A verosimilhança dos modelos físicos é baixa porque integramos as probabilidades por todo o espaço de possibilidades dos parâmetros livres. Mas um deus omnipotente tem infinitos graus de liberdade. Sem fazer batota na aplicação do PMV a verosimilhança dessa família de modelos é nula, sempre menor do que qualquer alternativa.

* Assumindo que não me enganei nas contas. Mas se me enganei não faz mal porque o que importa aqui é perceber a ideia.
** Se alguém estiver interessado em pesquisar mais sobre este problema, chama-se overfitting.

1- Fine-tuning e verosimilhança, parte 1. Ver também o post do Bernardo

Em simultâneo no Que Treta!

1 de Dezembro, 2013 Carlos Esperança

A fé paga-se

Papa vai ajudar Arquidiocese do Rio a pagar dívida

Vaticano negocia financiamento para sanar rombo de R$ 90 milhões deixado depois da Jornada Mundial da Juventude
28 de novembro de 2013 | 2h 03 Jamil Chade, ENVIADO ESPECIAL / ROMA – O Estado de S.Paulo

Com uma dívida considerada “impagável” pelo Vaticano, a Arquidiocese do Rio de Janeiro será socorrida por um financiamento do papa Francisco por causa do rombo deixado depois da Jornada Mundial da Juventude (JMJ). O Estado apurou que a Santa Sé deverá contribuir com um “valor significativo” e está negociando os termos e os valores do resgate.