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  • 19 de Dezembro, 2013
  • Por Carlos Esperança
  • Humanismo

A mulher, a eterna ameaça e vítima ancestral

Há dias publiquei uma foto de Annette Kellerman (1886/1975) a promover o Direito das mulheres ao uso do maiô, em 1907. Era um fato de banho que apenas deixava o pescoço e os braços à mostra. Valeu-lhe a prisão.

A nadadora australiana, atriz e escritora, foi presa por atentado ao pudor. Não podia ser o que descobria a causa de tão cruel punição, era o medo da emancipação, da igualdade de género que, durante milénios, justificou a violência das instituições contra a mulher, como se a humanidade pudesse existir sem ela, como se cada um de nós pudesse nascer, sem ser asfixiado, de pernas atadas, como os homens a queriam.

No Concílio de Niceia (séc. IV), discutiu-se com “seriedade” e “pureza de intenções” a questão de saber se as mulheres tinham alma, e hoje, quando cada vez menos pessoas se interessam pela existência da alma, a mesma Igreja discute a alma do zigoto.

Almas do diabo!

Maria Montessori (1870/1952), pedagogista e pedagoga, mulher que estudei por dever profissional, foi das primeiras educadoras de crianças deficientes e a primeira médica italiana. As dificuldades que teve de vencer, as provocações e o assédio de que foi alvo!

A frequência de classes com homens, na presença de um corpo nu, era inadequada. Foi obrigada a realizar as dissecações de cadáveres sozinha, depois do horário dos colegas. Aos 18 anos, esta mulher era a minha heroína. O seu currículo na pedagogia científica e na filosofia educacional rivalizam com a coragem cívica. A sua biografia e bibliografia equivalem-se.

Na ditadura clerical-fascista de Salazar a mulher só podia ausentar-se para o estrangeiro com autorização do marido. Este administrava-lhe os bens, abria-lhe a correspondência, exercia um direito. A violação não era crime.

Quem tem medo da mulher não tem confiança em si. Quem quer aprisionar-lhe a alma não sabe ser livre. Ninguém é livre se exercer a escravatura. Temos sido um mundo de escravos na ilusão de que a violência é uma forma de liberdade e uma manifestação de poder, desconhecendo que na desigualdade de géneros se encontram as amarras que nos tolhem, a desonra que nos diminui, o opróbrio que nos envenena.

As religiões são as principais responsáveis e guardiãs das posições misóginas.

Perfil de Autor

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- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa

- Sócio fundador da Associação República e laicidade;

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- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»

- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:

- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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