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  • 4 de Outubro, 2013
  • Por Carlos Esperança
  • Ateísmo

Deus está em parte incerta

Deus, cansado das asneiras que fez, das maldades que praticou ou envergonhado dos seus preconceitos, afastou-se para lugar incerto e, depois da invenção da escrita, nunca mais deu sinais de vida. A Revolução Francesa veio criar um habitat incompatível com a presença divina. O sufrágio universal reduziu-o à sua insignificância e, por não se ter inscrito nos cadernos eleitorais, passou a valer menos do que qualquer eleitor.

Aqueles truques que fazia no Mar Vermelho, as brincadeiras com que embasbacava os primitivos, contrariando as leis da Física, os milagres que exibia para estupefazer os terráqueos, tudo isso foi sendo desmascarado pela ciência ao mesmo tempo que o progresso criou espaços de liberdade que um Deus violento e autoritário não suportava. Tal como o patrão que arruinou a fábrica, desapareceu, indiferente à sorte dos operários e fiéis servidores, e nunca mais foi visto nem levado a juízo.

Claro que os empregados mais devotos, os espíritos timoratos e os oportunistas mais descarados continuaram a garantir a sua existência e a ameaçar com os castigos de que ele era capaz. Procuram fabricar indigentes mentais como os que em Portugal esperam por D. Sebastião ou aliciar oportunistas com benefícios garantidos, mas sem resultados práticos.

A excomunhão e a fatwa são duas armas que permanecem carregadas de ódio; o Inferno é ainda um destino com que os clérigos assustam os incréus; a penitência e a oração continuam a fazer parte das penas suaves, sempre que meios mais expeditos não são consentidos: a lapidação, a fogueira, a decapitação, a amputação de membros, a explosão bombista e outras manifestações da justiça, aviadas a mando de clérigos com procuração divina, para supremo deleite do Omnipotente.

Ultimamente, Deus começou a imiscuir-se, em rigorosa clandestinidade, nos processos eleitorais. Em países democráticos faz pender o prato eleitoral para o lado pior, nos outros vai impedindo eleições com o argumento de que a lei divina não é passível de julgamento pelos homens. Há suspeitas de que Deus passa largas temporadas no Médio Oriente, percorre os países mais pobres de África e anda em campanha por algumas repúblicas da antiga URSS. Onde lhe cheirar a sangue, Deus não falta, para dilatar a crueldade.

Há, contudo, um método, destinado à multiplicação da espécie humana, que lhe saiu mal – a reprodução por estaca (usou um ramo ‘costela’ de um homem para o duplicar). Os humanos descobriram outro método muito mais fácil e imensamente mais agradável.

Dizem os beatos que é um método obsceno, apenas tolerável para fazer filhos e nunca para obter o mais leve prazer. Pensa-se que este método tinha-o Deus reservado para o fabrico de tratores mas os humanos apropriaram-se dele muito antes de os tratores terem sido inventados sem ajuda divina.

 

Perfil de Autor

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- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa

- Sócio fundador da Associação República e laicidade;

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- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»

- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:

- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;

- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores

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