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O Francisco na tertúlia

Desta vez, a nossa tertúlia mensal só tinha quatro tertulianos, fosse devido a férias, fosse devido a outras razões sendo certo, porém, que entre quatro é mais fácil manter uma conversa do que entre dez ou doze. E a conversa ia decorrendo calmamente, ao compasso das mastigações e deglutições quando, sem que eu me tenha apercebido bem como e porquê, o papa Francisco aparece na mesa, convocado por um companheiro de anteriores lides e actuais lazeres. Que, sim senhores, era, talvez, o melhor papa dos últimos anos, estava a fazer uma limpeza nunca vista no Vaticano, e com tal entusiasmo falava o Alfredo, que me senti na obrigação de o moderar um pouco, não fosse o músculo cardíaco ressentir-se, calma, Fredo, olha que o homem está sujeito a seguir o caminho de João Paulo I, no que fui secundado pelo companheiro à minha direita, ex-seminarista convicto e anti-clerical assumido, está bem, voltava o Fredo, mas olha que é preciso tê-los no sítio, o entusiasmo não acalmava, olha que foi o único que foi a Lampedusa…

– Fazer o quê? – não me contive.

– Olha, pá, foi dar apoio àqueles desgraçados…

Interrompi-o novamente:

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– Resolveu-lhes algum problema?

– Não mas, pelo menos, alertou o mundo…

– Porquê, o mundo não sabe o que se passa? Achas que a visita do Francisco vai resolver o problema da fome nos países africanos? Não vai, nem isso convém, porque quando deixasse de haver fome no mundo, a ICAR fechava por falta de clientela..

A meu lado, o ex-seminarista abanava afirmativamente a cabeça, impedido de falar pela educação,  não se fala com a boca cheia.

Já com o entusiasmo mitigado, Alfredo ainda insistiu:

– Pois, mas pelo menos foi lá, os outros não foram.

– Está bem, mas foi lá fazer alguma coisa de jeito? Se não foi lá fazer o quê?

Decidi abarbatar-me ao entusiasmo que o Fredo ia dispensando:

– O que o papa fez foi a mesma coisa que fazem milhares de crentes quando rezam: nada! O papa não fez nada, para além da promoção pessoal. Continuará a haver, todos os dias, desgraçados que chegarão a Lampeduza, e não só. Há tempos, numa excursão a Marrocos, ainda em Ceuta, foi encontrado um marroquino sabes onde? Pois num curto espaço existente no motor. O problema dos desgraçados que vão chegando, e não nos esqueçamos dos que se ficam pelas águas, não é religioso, é político. Aliás, duvido de que a religião alguma vez tenha resolvido outros problemas que não os seus; mas conheço muitos problemas criados pelas mesmas religiões.

O Fredo não contra-argumentou, e não sei se foi por não ter argumentos, se achou que nem valia a pena passar-me cartão, ou se também estava com a boca cheia.

Francisco acabou por sair como tinha entrado.

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