A LUZ DOS ESPELHOS QUE SOMOS
Somos apenas um fiapo da sombra que se reflete e repete no espelho imaterial em que nos observamos, um espectro difuso que nos observa com o nosso olhar à espera das respostas que não conseguimos dar.
É nesse painel inconsistente que nos reproduzimos e projetamos, com receio de anoitecer. Tecemos do ventre do medo o desejo de sermos um eco do Eu a regressar-nos sempre igual, a garantir-nos plausibilidade e certificação.
Fomos gerados na noite dos tempos imemoriais e inventámo-nos os espelhos necessários e possíveis, que alumiámos para nos podermos contemplar, não apenas para sermos, mas para sermos mais do que nós. É dessa irracionalidade intangível em constantes espasmos evolutivos, que nos recriámos em deuses, sem saber que nos mentíamos ao adornarmo-nos da certeza de sermos mais e maiores do que a nossa essência primordial.
É essa embotada réstia de Sol que sonhámos que continua a alimentar os espelhos, agora desnudos, dos que necessitam de crer para ver, assim reciclando e perpetuando a ilusão da luminosidade refletida pela ilusão de si mesmos.