Loading

Mês: Setembro 2012

30 de Setembro, 2012 Carlos Esperança

PRATICAR O BEM EM NOME DE DEUS

Por

ONOFRE VARELA

Há cerca de mês e meio prometi aqui abordar “o bem praticado pelas religiões, ou em nome de Deus”. Cumprindo, começarei por dizer que os homens erigiram sociedades, criaram técnicas e inventaram deuses, a Arte e muitas artimanhas.

A invenção dos deuses criou laços muito estreitos com a Arte, confundindo-se com ela, e desde imemoriais tempos, até à Renascença, o culto religioso era a única despensa alimentar dos artistas que produziam, exclusivamente, para templos de culto religioso.

As civilizações Grega e Romana são hoje conhecidas graças, principalmente, aos vestígios materiais que os artistas arquitectos e escultores produziram.

Pintores, escultores e ourives da Idade Média e da Renascença, legaram-nos obras que são valiosos documentos civilizacionais. Nesse aspecto, a Igreja Católica cumpriu um papel fundamental na reunião de tão prolixo acervo, sem o qual a nossa história estaria manca.

É obvio que a Igreja não o fez animada pelo intuito de legar à posteridade tesouros artísticos das épocas por que passou, como documentos para facilitar a nossa formação e informação, mas sim para ela própria enriquecer e ostentar essa riqueza como símbolo de poder.

O facto de hoje essas obras nos servirem como livro onde se lê um passado artístico e se decifra um modo de ver, de sentir e de estar, é um incidente e não um propósito original tomado em consciência. Esta é a verdade que nada tem de caritativa nem de programada recolecta de documentos com a intenção de fazer e preservar História.

De qualquer modo, foi pela invenção de Deus que esses objectos civilizacionais foram criados, produzidos e acautelados, e que nos chegaram como atestados concretos do caminho percorrido na longa estrada evolutiva do pensamento e das artes.

Mas isto não quer dizer que a invenção de Deus foi o melhor que já conseguimos! Com base na ideia abstracta de Deus, criamos a Arte, mas também fomentamos ódios e guerras que produziram fome, miséria e morte. As partes boas não se devem às Religiões, enquanto instituições, mas aos homens bons que as praticaram.

Vejamos o clássico caso das missões católicas e protestantes em África. É verdade que homens e mulheres das missões têm ajudado povos desfeitos em guerra, e muitas vezes sofrem tortura, e são assassinados pelas mãos de agentes do capitalismo, da política mais nefanda, da soberba e da cobiça de energúmenos que ocupam cargos de poder e que oprimem os mais fracos e desprotegidos.

No Brasil, em El Salvador e na Nicarágua, também há história de religiosos assassinados, e os respectivos países não estão em guerra. São mortos, principalmente, padres católicos que abraçaram a Teologia da Libertação de Gutierres e Boff (como Romero), por se manifestarem frontalmente contra o capital e contra os interesses capitalistas que a Santa Sé fomenta e protege.

Em África, as missões religiosas são apanhadas pelas lutas de guerrilha e pela opressão dos ditadores, e os missionários sofrem as respectivas consequências, como qualquer cidadão que se encontre em zona de conflito.

Por outro lado, essas “missões” nem sempre são assim tão “missionárias”, como tão romanticamente fazemos uso do termo. Por cá, as Misericórdias e outras missões caritativas “praticam o bem” usando subsídios estatais, e quando estes são cortados, os religiosos “bem-feitores” não têm como produzir receitas para se manterem, e fecham a torneira da ajuda terminando a “atitude de missão e misericórdia”!

Este tipo de “ajuda” já é artimanha para propagandear o “humanismo” da instituição que “dá aos pobres”, mas cujo conceito é uma fraude. Dar comida aos pobres não elimina a pobreza. Pelo contrário: ajuda a mantê-la.

Os governos que entregam à “caridade” a tarefa de fingirem que eliminam a pobreza (ou que tratam da saúde) dos povos, são duplamente criminosos. Primeiro, porque foram eles os criadores da pobreza, e depois porque subsidiam alguém para fornecer refeições diárias, contribuindo, desse modo, não para a irradicação da pobreza, mas para a sua manutenção, impedindo os pobres de saírem da situação de pobres por não criarem as ferramentas necessárias para isso.

É mister dos governos resolver os problemas das populações, sem intermediários sugadores dos recursos. Governo que o não faz, não governa capazmente e deve ser derrubado.

Os interesses que levam as religiões a estabelecerem templos em África, é que fazem a chamada “missão”. E esta, embora de nome enfeitado com a intenção de bem-fazer, tem como fim principal semear para colher. Isto é, criar crentes para aumentarem as hostes do credo que representam.

As acções sociais praticadas são parte da estratégia usada pelo credo para a sua instalação no terreno e para serem aceites pelas populações autóctones. Se o interesse da colheita não existisse, as guerras não apanhavam sacerdotes europeus em zonas conflituosas africanas, simplesmente porque… não estariam lá!…

Por outro lado, e ainda quanto à ajuda aos povos necessitados, podemos perguntar: que outra coisa podem fazer os peões lançados no campo de batalha? Ajudar quem precisa é uma tarefa humana que não carece de rótulos religiosos para ser cumprida. Faz parte da ética da conduta social dos homens, e esta é universal e independente de credos. Aceito
que entre esses “missionários” se encontre gente pouco católica e nada protestante, e também alguns ateus… como é o caso de um amigo meu (poeta, hoje a residir em França) que, sendo ateu, foi missionário no Brasil na década de 1970!

O verdadeiro Humanismo é independente dos rótulos que os políticos, os religiosos e outros militantes panfletários de ideologias duvidosas lhe queiram atribuir.

Mas uma coisa é certa. O suprimento das necessidades de um povo não se consegue com actos de caridade religiosa, mas com atitudes políticas. A caridade não as resolve; antes, mantém-nas. E na manutenção das necessidades dos povos está a justificação da caridade, como pescadinha-de-rabo-na-boca, permitida por governos incapazes e corruptos. Há sempre alguém a governar-se muito bem com as “caridadezinhas”… mas nunca são os pobres!

29 de Setembro, 2012 Carlos Esperança

Rapto de crianças no franquismo

Espanhola encontra filha roubada há 31 anos

Documentação de María, nascida em 1981 na maternidade madrilenha de Santa Cristina, cita o nome da irmã Maria Gómez Valbuena, freira espanhola acusada por rapto de bébés durante a ditadura de Franco.

Freira María Gómez Valbuena é a principal suspeita neste caso e ainda no rapto de outra menina nascida na mesma maternidade (Susana Vera/Reuters).

Aos milhares de bebés roubados a famílias pobres e vendidos a famílias ricas por freiras espanholas durante o franquismo, junta-se agora o nome de María, nascida em fevereiro de 1981 em Madrid. Mãe biológica e filha, que preferem continuar no anonimato, reencontraram-se recentemente em Espanha, depois de um processo legal iniciado há um ano.

Nota: Fui alertado por um leitor do DA, na caixa de comentários. Obrigado.

28 de Setembro, 2012 Carlos Esperança

Vaticano tira o cavalo da chuva

Ruanda: Vaticano demarca-se de sacerdote acusado de genocídio

O porta-voz do Vaticano afirmou hoje que a Santa Sé não tem qualquer relação com o sacerdote ruandês J.B. Rutihunza, acusado de envolvimento no genocídio de 1994 no país africano.

O padre Federico Lombardi reagiu a notícias surgidas nos últimos dias nas quais se alegava que o referido padre estava a ser “protegido” pelo Vaticano.

28 de Setembro, 2012 Carlos Esperança

Ainda se fosse um homem…

Vaticano contraria tese da «mulher» de Jesus

Texto divulgado por estudiosa norte-americana visto como falsificação sem relevância sobre a figura histórica de Cristo

O jornal do Vaticano apresenta hoje uma análise ao fragmento de papiro que alegadamente remontaria ao século IV, falando numa “mulher” de Jesus, contestando a sua autenticidade e relevância para a apresentação da figura história de Cristo.

27 de Setembro, 2012 Ludwig Krippahl

A incongruência faz mal.

O Alfredo Dinis escreveu vários posts intitulados «O desconhecimento faz mal»(1) com o intuito de refutar a ideia de que a religião é má. Para isso, apresenta «coisas boas que se fazem em nome da religião» e que, pelo título, deve presumir serem desconhecidas dos críticos da religião. São exemplos de trabalho voluntário como o do “Serviço Jesuíta aos Refugiados”, acompanhamento de crianças, apoio a toxicodependentes e assim por diante. São realmente coisas boas e são praticadas por alguns religiosos, mas parece-me que o esforço do Alfredo tem o efeito contrário ao pretendido.

A cardiologia é uma coisa boa. Se alguém me pedir para justificar porquê direi que é boa por ser bom compreender, prevenir e tratar problemas cardíacos. Ou seja, a cardiologia é boa porque é bom aquilo que é essencial na cardiologia. Mas se, em vez desta justificação, eu dissesse que a cardiologia é boa porque há cardiologistas que fazem voluntariado em programas de acção social, cuidam de crianças nas férias e dão apoio a refugiados seria justo perguntar como é que isso faz da cardiologia uma coisa boa. É que nem é preciso ser cardiologista para fazer isso nem é preciso fazer disso para ser cardiologista. São coisas independentes.

Os próprios apologistas da religião invocam esta independência sempre que os religiosos fazem algo reprovável. Por exemplo, a propósito da violência dos muçulmanos por causa do filme e das caricaturas, o Miguel Panão escreveu que isto não indica que a religião seja má porque «Não foi a religião que praticou o ato terrorista, nem sequer se tratou de ato religioso»(2). Apesar desta violência dos muçulmanos cumprir o critério do Alfredo Dinis, de coisas «que se fazem em nome da religião – institucionalmente, e não apenas com base nos sentimentos religiosos subjectivos», concordo com o Miguel Panão. Não é por isto que se pode concluir que a religião é má porque nem é preciso ser religioso para praticar estes actos violentos nem é preciso praticar destes actos violentos para ser religioso. Mesmo que a religião seja usada para levar pessoas a cometer actos violentos, esta violência é apenas um aspecto mau da forma como alguns usam a religião e não algo essencial na religião.

Mas o mesmo se aplica a todos os exemplos do Alfredo. Ajudar as crianças, os pobres, os enfermos e os refugiados são aspectos bons da forma como alguns usam a religião. Mas não são aspectos essenciais da religião. É possível ser-se religioso sem fazer nada disto e é possível fazer estas coisas sem se ser religioso. Na verdade, em sociedades como a nossa o principal agente deste tipo de acções é o Estado. Os serviços de saúde, as escolas públicas, os planos nacionais de pensões e os fundos de desenvolvimento regional fazem muito mais por muito mais gente do que as caridades religiosas. E sem ser preciso religião.

Para avaliar se a religião é uma coisa boa ou má temos de ver se são boas ou más as suas características intrínsecas. E essas o Alfredo evita sequer mencionar, razão pela qual me parece que os exemplos dele indicam o contrário do que ele gostaria que indicassem. Uma destas características é a crença firme em alegações factuais acerca de entidades sobrenaturais, alegações para as quais não há quaisquer evidências. A reencarnação, a origem divina do corão, a alma, a vida eterna e assim por diante. Outra característica das religiões é que estas crenças são justificadas pela autoridade de fontes que, em rigor, não sabem mais acerca disto do que qualquer outra pessoa. Os sacerdotes que interpretam os livros sagrados, os gurus infalíveis, os representantes dos deuses e essa malta toda sabem exactamente zero acerca das entidades sobrenaturais de que se dizem peritos. Finalmente, é parte essencial da religião associar este tipo de crença um forte valor moral. Não se crê em Deus apenas por julgar que ele existe, tal como se crê que a Lua tem uma parte que não vemos daqui da Terra. Crê-se em Deus, principalmente, porque é imoral duvidar da sua existência.

Estar convencido de coisas sem fundamento pela falsa autoridade de quem não sabe nada do assunto e, ainda por cima, julgar que é virtude ter tais crenças e imoral livrar-se delas é uma coisa má por si. É um erro, uma confusão entre factos e valores e uma oportunidade perdida para pensar nas coisas de forma adequada. É verdade que estes erros podem ter consequências graves para todos quando estas pessoas são levadas a fazer coisas como queimar embaixadas. No entanto, isso é um factor extrínseco à religião. Não é por isso que eu digo que a religião é uma coisa má. Também é verdade que se pode usar estas convicções para levar as pessoas a fazer coisas boas mas, tal como com as coisas más, isso também não é parte essencial da religião. Não é por isso que se pode dizer que a religião é uma coisa boa.

A cardiologia é boa pelo mérito das suas características essenciais. Continuaria a ser boa mesmo que alguns cardiologistas queimassem embaixadas e não seria melhor do que é só por alguns cardiologistas ajudarem a cuidar de crianças pobres durante as férias. Da mesma forma, a religião é má pelo demérito das suas características essenciais. Não é intrinsecamente pior só porque alguns religiosos matam em nome da sua religião, mas continua a ser má mesmo que alguns religiosos ajudem os pobrezinhos em nome da sua religião. Os exemplos do Alfredo Dinis não contribuem nada para determinar se a religião é intrinsecamente boa ou má. Esta incongruência mais parece uma admissão de que aquilo que faz uma religião ser religião não tem nada de bom.

1- Alfredo Dinis, o desconhecimento faz mal (5), o desconhecimento faz mal (4), , 3, 2 e 1.
2- Miguel Panão, Pessoas mal formadas, não que a religião seja má.

Em simultâneo no Que Treta!