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Mês: Agosto 2012

16 de Agosto, 2012 José Moreira

Deus é omni… tudo

Do Génesis:

 

1.26 – E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que se move sobre a terra.

 

2.9 – E o SENHOR Deus fez brotar da terra toda árvore agradável à vista e boa para comida, e a árvore da vida no meio do jardim, e a árvore da ciência do bem e do mal.

 

2.16 – E ordenou o SENHOR Deus ao homem, dizendo: De toda árvore do jardim comerás livremente,

2.17 – mas da árvore da ciência do bem e do mal, dela não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás.

 

3.6 – E, vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela.

 

Vamos partir do sacrossanto princípio de que Deus é, além do mais e sobretudo, omnisciente. Ou seja, sabe tudo: o passado, o presente e, pasme-se! – o futuro. Assim, no momento em que escrevo estas letras, Deus já sabe se você, leitor, as vai ler ou não. Mais: se você acabar por fechar o “site” ainda antes de as ler, assim como que numa súbita mudança de ideias, Deus já sabe que você vai fazer isso. Claro que se você já chegou a este ponto da leitura, isso significa que optou por não fechar o “site” antes de o ler. Porém se, apesar de tudo, você decidir fechar o “site” antes de chegar a este ponto, nem sabe o que perdeu. Mas Deus já sabia disso. Aliás, Deus sabe o que vou escrever a seguir, ao contrário de mim, que ainda não sei. Ele há coisas…!

Postos os factos neste pé, parece ser indubitável que Deus, quando fez Adão e Eva, já sabia:

a)    – Que Adão iria comer da árvore da ciência do bem e do mal, já que:

b) – Eva iria convencer Adão a comer do “fruto proibido”.

 

Se Deus não sabia isto tudo, então não é omnisciente. Mas é. Logo, sabia o que iria acontecer. Apesar disso, insistiu em fabricar Adãovalendo-se de umas habilidades de olaria, não hesitou em fazer Eva(mesmo à custa de uma costela do desgraçado do Adão) e, mais grave que tudo, deixou ficar a árvore da ciência do bem e do mal. Ou seja, nada fez para evitar que acontecesse aquilo que, afinal de contas, já sabia que iria acontecer. Se isto não é sacanice alguém, por favor, me defina o que é sacanice. Isto para além do facto de ninguém saber por que carga de água Deus colocou a árvore da ciência do bem e do mal lá no Éden, quando é certo que ninguém podia comer os respectivos frutos. Parece não restarem dúvidas de que a árvore da ciência do bem e do mal foi ali colocada de propósito para que Eva persuadisse Adão a comer o fruto, ou seja, para que ambos pudessem pecar. O que se compreende, uma vez que o conceito de pecado foi instituído por Deus mas, naquela altura, Deus ainda nada tinha dito nada acerca desse assunto. Mais: não havia motivos para pecar, nem havia como pecar, ainda que se quisesse. Por exemplo: cometer adultério? Impossível! Roubar? O quê e a quem? Dizer palavrões? E quem os ensinaria ao jovem casal? Matar a mulher? Porra, lá se ia mais uma costela! Matar o marido? E quem sustentava a casa?

Ora, acontece que Deus, na sua bondade infinita, tinha de arranjar maneira de dar largas aos seus sádicos instintos: “Não existe pecado, inventa-se! Estes gajos é que têm de ser castigados, seja lá como for, e a que pretexto for.” Sim, que isto de gente mal-formada tem muito que se lhe diga. Veja-se, por exemplo, que a Preguiça é considerada como um “pecado mortal”. No entanto, foi o próprio Deus quem privilegiou esse delicioso pecado (delicioso como todos os outros pecados, aliás). Não acreditam? Então, respondam: o que é que dá mais trabalho? Tratar da terra – cavar, plantar, adubar, colher – tudo isto numa altura em que ainda não eram conhecidas as alfaias agrícolas, não havia arados ou, sequer, simples enxadas – ou tratar de um rebanho de ovelhas que se limitam a tosar umas ervas, a cagar e a parir? Nem sequer havia tesouras para a tosquia?

Pois bem, Caim era lavrador e Abel era pastor. Preguiçoso por natureza (se o não fosse, poderia tornar-se também lavrador) limitava-se a olhar para o rebanho. E mesmo isso não lhe dava qualquer trabalho, uma vez que não tinham, ainda, sido inventados os ladrões de gado e, ao que consta, não havia lobos no Éden.

Voltemos à Bíblia e ao Génesis:

 

 

4.2 – E teve mais a seu irmão Abel; e Abel foi pastor de ovelhas, e Caim foi lavrador da terra.

4.3 – E aconteceu, ao cabo de dias, que Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao SENHOR.

4.4 – E Abel também trouxe dos primogénitos das suas ovelhas e da sua gordura; e atentou o SENHOR para Abel e para a sua oferta.

4.5 – Mas para Caim e para a sua oferta não atentou.

 

Ou seja: Caim desunhou-se todo a colher – sabe-se lá! – uns frescos repolhos e umas couves-galegas, provavelmente umas alfaces e umas curgetes, quiçá umas cenouras e umas batatas, enfim, comida sadia, à base de fibras, e Deus mandou-o dar uma volta; mas atentou para uma oferta cheia de colesterol, que Abel trouxe. Como se não fosse suficientemente hipócrita, ainda determinou, tempos depois, que a Gula passaria a ser “pecado mortal”.

A sério: com deuses destes, quem precisa de demónios?

16 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

O MEU ATEÍSMO

Por

ONOFRE VARELA

Já confessei aqui que não sou (ou não era) um atento leitor, nem frequente visitador, deste site sobre Ateísmo. Isso acontece porque os computadores não me atraem e sou informaticamente analfabeto por vontade e conta própria. E embora faça parte dos órgãos sociais de quatro associações (duas de arte, uma de jornalismo, e mais a
Associação Ateísta Portuguesa, cujo movimento para a sua formação iniciei no Porto em 1997), também confesso que as actividades associativas, bem como as empresariais ou políticas, ao nível directivo, não me cativam. Não tenho jeito para líder, nem para balir como cordeiro em redil.

Prezo muito a minha liberdade de acção, de pensamento e de expressão, e talvez este modo de estar na vida seja a consequência de sempre me dedicar às artes (sou pintor, ilustrador, caricaturista e cartunista, para além de escrever em jornais [escrevi e desenhei em todos os jornais do Porto desde 1969 até 2000] e já ter publicado meia dúzia de livros) cuja “praxis” é individual e solitária.

Mas, há dias, dei uma volta pelo arquivo deste portal e li o texto “Porque Sou Ateu?”, de Jaime Gralheiro, publicado em 16 de Julho último. Deste autor já li excepcionais textos, noutras fontes, e recomendo a releitura atenta das suas razões a quem, de religiosidade, de ateísmo e de Humanidades, tiver uma visão séria, e não se fique pelas picardias — que também li nos recados de rodapé do excelente texto que refiro — que denotam um total desrespeito boçal e ignorante, pelo homem de cultura que é Jaime Gralheiro.

Do seu sincero e humilde texto ressalta esta verdade incontornável:
O ateu faz-se, não só porque pensa (os religiosos também pensam, por suposto…), mas principalmente pela especial excelência do seu pensamento.

(O ateu que se faz por si próprio, é de melhor qualidade do que o ateu induzido. Este, será igual [em sentido inverso] ao religioso que sai do aviário da catequese). O acto de pensar, para além de ser subversivo, pode ser comparado com o gosto pela música: há quem se fique pela adoração do Marco Paulo e da Ágata, e há quem prefira Zé Mário Branco e Manuel Freire!
Quer dizer: há o pensamento “pimba”, e o outro!…

Num plano mais elevado de pensamento, subimos degraus até Bach, Haydn, Chostakovich, Richard Wagner, Boccherini… e passamos pelos mestres da casa, Emmanuel Nunes, Victorino de Almeida, Fernando Lopes Graça, Carlos Paredes…

No mundo da Religião temos aqueles que pensam ao nível de Bach, mas a esmagadora maioria dos peões-militantes-de-base, que são os alimentadores da mesa farta dos melómanos Bachianos, não passam do nível… Quim Barreiros!

Alguns dos meus amigos ateus começaram por ser religiosos, tal como Jaime Gralheiro confessa, embora outros nunca tenham entrado numa igreja com espírito de crente por não terem sido contaminados em meninos.
E é nessa contaminação que reside o problema, e a diferença!…

A minha história de ateu começa pelo importante facto de os meus pais nunca me educarem na filosofia religiosa, mas no comportamento ético do respeito pelos outros e pela Natureza, impedindo a Igreja de me agrilhoar a mente, como faz aos cérebros tenrinhos. Estou eternamente grato aos meus pais, também, por isso.

Devo dizer que não fiz a comunhão, por um triz e por acaso! O meu pai, que nasceu em 1912, foi influenciado pelo anti-clericalismo da primeira República, mas não era fundamentalista e deixou à minha vontade fazer, ou não, a aprendizagem do Catecismo Católico, quando eu teria doze ou treze anos. Essa história conto-a no livro “O Peter Pan
Não Existe”, (Caminho, 2007) pág. 178 e seguintes.

Na adolescência não alinhava em missas, nem me considerava ateu ou agnóstico. O fenómeno religioso era-me indiferente. Passava-me ao lado vertiginosamente. Já estava incorporado no Exército quando comecei a pensar com mais qualidade na história de Deus e no hábito religioso dos meus camaradas, e tudo isso foi motivado pelo discurso de um padre militar, alferes-capelão.

Ser militar não era coisa que estivesse nos meus intentos, mas foi uma inevitabilidade a que não soube fugir. Naquele tempo a juventude tinha a vida parada, no mínimo, por três anos (no máximo, ficava estropiado ou morria) por causa do conflito armado com as Colónias, e muitos recusaram servir o Exército de Salazar e, clandestinamente, partiram para França e por lá ficaram, evitando, desse modo, participar na Guerra Colonial com a qual não concordavam.

A minha passividade reteve-me por cá, obrigando-me ao cumprimento do serviço militar obrigatório. Não declarei as habilitações académicas (3º ano de pintura) por recusa de dar o melhor de mim à ditadura de Salazar, e fui soldado raso, condutor. (De nada valeu esta minha repulsa pelo Exército, porque quem é portador de algo para dar, dá-o mesmo sem querer. No meu primeiro embate com a disciplina militar, fui condenado a quatro dias de prisão, que cumpri. E de África acabei por trazer três louvores!… Mas isso são contas de outro rosário).

Um dia, no quartel CICA 1, Porto, recebemos a visita do alferes-capelão e ouvimos o seu discurso. Estava ali para nos dar bons conselhos, disse ele. Já não recordo o teor da sua palestra, mas suponho ter sido semeada pela religiosidade alimentadora do espírito
de qualquer sacerdote, católico ou não, com a habitual e inabalável atitude de fé num deus supremo. Mas recordo o modo como ele rematou aquela sua apresentação, porque o registei numa espécie de diário que então fazia.

Disse-nos que devíamos seguir “um caminho certo” e “praticar o bem”, completando os seus anunciados conselhos com esta enigmática frase:
“Façam sempre o que a vossa consciência manda”.

Para mim era impossível ouvir aquilo e não reflectir… e ali andava surrealidade!
Imediatamente antes de aqueles recrutas entrarem naquela sala, tinham acabado de receber instrução de armamento, e uma arma é um objecto fabricado com o propósito de matar. O discurso do sacerdote teve como ilustração de fundo o som dos disparos que nos chegavam da carreira de tiro, os quais tinham o objectivo de apurar a pontaria para, na guerra, não se desperdiçar munições e ser-se certeiro na liquidação do inimigo. Cada tiro deveria corresponder a um cadáver.

Para além disso, não pertencíamos ao Exército de um governo democrático que, em princípio, usaria as armas na defesa de causas nobres. Não! Nós prestávamos serviço num quartel das Forças Armadas de um país que tinha um governo ditatorial, anti-democrático, e que alimentava uma guerra colonialista em África, contra os povos que
reivindicavam independência.

Era esta a surrealidade que emoldurava a presença daquele padre com discurso moralista no quartel (!?), como se houvesse moral que se aproveitasse, na acção bélica daquele exército!… Em tal contexto, o que é que se devia entender por “caminho certo?” E “praticar o bem”?! Será certo, e bem, pertencer ao exército de um ditador?
Será certo, e bem, partir para uma guerra colonial, lutando contra os povos que pedem a independência? Como pode um soldado fazer sempre o que “a sua consciência manda?”

Os exércitos obrigam a uma “consciência colectiva”, onde o indivíduo não é respeitado como tal, e recrutam jovens imaturos destituídos de consciência crítica. Aquele padre estaria a tentar dizer-nos que quem não concordasse com a política do governo colonialista não deveria, em consciência, estar ali? Estaria a incentivar a deserção e a rebelia?! E ele? Porque estava ali? Porque não desertava?!

A sua consciência estava tranquila e harmonizada com a situação política do país, que as Forças Armadas defendiam e ajudavam a manter? Na sua consciência não lhe pesava o facto, nem o fardo, de servir nas fileiras do exército de um ditador? Ou navegava contra-a-corrente e tentava, camufladamente, alertar-nos para a política de que estávamos distanciados?!…

O seu discurso não passaria de um conjunto de palavras de circunstância, no fingimento de, ao serem ditas por um sacerdote católico, serem exemplo de uma autoridade moral? Será que eu entendi mal o seu recado, transformando-o na lógica do meu pensamento cívico e arreligioso?…

Numa palestra posterior o padre acabou por destruir a boa imagem que eu estava a construir de si imaginando as suas intenções subversivas secretas a partir do seu discurso que, de algum modo, me parecia revolucionário. Dessa vez disse-nos:

— Deus vê-nos e escuta os nossos mais secretos pensamentos, portanto devemos pensar e executar só o bem… e, até, devemos dar a última gota de sangue, dar a nossa vida, pela Pátria… (!?)

Desilusão!… Senti-me traído por aquele sacerdote, e deixei de prestar atenção ao seu discurso que se revelou tão infantil… tão ao estilo de história da carochinha e do Pai Natal, em contraste com o outro que me pareceu ter “miolo”! Lembrei-me imediatamente daquela anedota do Zéquinha, a quem o padre disse que devia portar-se bem porque Deus estava sempre ao seu lado testemunhando as suas acções. Intrigado, o Zéquinha perguntou:

— Deus também está ao meu lado quando brinco no quintal da minha avó?
— Claro que sim, meu filho…
— Ora, vá-se lixar… a minha avó não tem quintal!…

Esta infantilidade anedótica do alferes-capelão, passei a detectar em todos os discursos de padres, a partir daquele dia! Nas igrejas onde assisto a casamentos, a baptizados e a funerais, mas também nas palavras de bispos e de papas, difundidas pela imprensa, pela rádio e pela televisão, e ainda nas palestras ridículas e vigaristas das seitas ditas cristãs (tão ridículas e vigaristas como as católicas, mas com nuances), em espaços televisivos e radiofónicos. (Se Jesus Cristo tivesse sabido do lindo serviço que fazia, tinha ficado quieto e caladinho e não havia milagres para ninguém!… Isto, se acaso a figura histórica JC existiu realmente, para além do mito sobre o qual foi, estrategicamente, construído o Cristianismo!… O que não é totalmente claro).

Parece-me que todos os padres falam para uma assistência de criancinhas de infantário, ou para adultos com um considerável atraso mental, colocando-os ao nível dos putos de cueiros! Se eu ouvisse esses recados religiosos desde o berço, o meu cérebro tinha sulcos, abertos como caminhos, por onde escorriam os recados religiosos transformados em “inegáveis verdades”. Mas quando se ouve desses recados, já com cérebro adulto, o crivo do sentido crítico funciona e não deixa abrir caminho por aí, porque já se percebe que esse não é o caminho.

Por essa razão é que a ICAR e o Islão teimam em “educar” as criancinhas na sua estética religiosa, sulcando os seus cérebros com um arado diabólico, semeando-o de mitológicos santos e demónios, impedindo que os seus intelectos amadureçam com qualidade. É assim que se fabricam soldados para alimentar o exército de religiosos, e assim queria fazer o actor Tom Cruise, recentemente, ao cérebro da sua filha, na seita Cientologia, mas a mãe da criança teve a sensatez de o impedir (mais uma vez agradeço aos meus pais o terem-me poupado a essa maldade).

O deus que espia no quintal de quem não tem quintal… e que condena à morte o seu amado filho-proveta… para nos salvar (!!??…), não pode ser coisa séria, nem convencer ninguém que pense e que não ouça Quim Barreiros!…

A experiência militar que me esperava nas matas dos Dembos, no norte de Angola (Dez. 1965 – Fev. 1968), foi trágica e mostrou-me a presença constante da morte. O medo pavoroso que sentimos pela irremediável morte, é o grande responsável pela sedimentação das crenças religiosas. Todas elas pretendem fintar a morte, propagandeando uma outra vida para além dela. É este o segredo do marketing religioso: aceitar a morte como passagem para o “reino de Deus” onde se desfrutará de felicidade inaudita! E a alma, que é etérea — logo, destituída de sistema nervoso — quando é enviada para o inferno, sofre abundantemente!… Mitologia pura, deglutida até à última garfada pelos religiosos seguidistas, incapazes de criticarem a ementa que lhes é servida em chip cerebral.

Nas matas dos Dembos vi de perto camaradas caídos em combate, e ajudei o médico numa autópsia. A morte rondava a cada hora de cada dia, e passei noites debaixo de fogo. Perante aquela situação de desespero prolongado, percebi a necessidade que os meus camaradas tinham de consumir o produto-droga-Deus, na procura de um conforto para as suas angústias. Assistiam fervorosamente às missas campais, movidos pela tal promessa de vida eterna, e na presunção de que se adorassem Deus e lhe rezassem com frequência desmedida, estariam protegidos em combate!

Conversei com camaradas protestantes que me diziam assistirem às missas católicas por ser “o sítio do encontro com Deus”. Compreendi todas as suas motivações, mas nunca senti necessidade delas. O que senti, isso sim, foi desconforto por ser o único, de entre os jovens militares que ali esperávamos o correr do tempo para regressarmos às nossas famílias a salvo, que não alinhava em conceitos religiosos. Não tinha ninguém com quem pudesse conferir os meus pontos de vista contra-a-corrente !…

A constante presença da morte não era agradável, mas era uma condição natural da vida, embora ali o drama do fim prematuro fosse ampliado pela situação de guerra, o que, certamente, valorizava o sentido religioso dos meus camaradas de infortúnio. O conceito de Deus estava nas suas cabeças, mas não na minha. Não havia deus algum que desviasse uma bala que viesse na minha direcção, e essa era a realidade científica que a fantasia de Deus não alterava. A diferença estava na qualidade do meu pensamento, e na qualidade do pensamento de todos os meus camaradas.

Era a tal questão da música !… Chostakovich ou Quim Barreiros ?… (Na altura, era mais Ray Charles ou Roberto Carlos ?). Percebi a infantilidade das suas crenças, e passei a interrogá-los sobre a sua fé, começando aí a fazer a minha colecção de conceitos
religiosos, com espírito de aprendiz de Antropologia. Não negava as suas convicções, nem os incentivava a prossegui-las ou a deixá-las. Só queria saber como era. Motivava a conversa como ignorante que era nas coisas que à “razão” da fé pertenciam, ouvia, aprendia e armazenava.

Assim fiz quando, em 1968, regressei à vida civil. Movido pela curiosidade religiosa que a experiência militar me proporcionou, obriguei-me a ler a Bíblia, a Tora, o Corão e textos budistas (Udãna, la Palabra de Buda. Barral Editores, 1972). Passei a frequentar missas católicas, com atenção e intenção crítica, conversei com padres e percebi o funcionamento do culto. Li filósofos e ensaístas. Os clássicos Feuerbach, Shopenhauer, Hobbes, Kant, Espinosa, Nietzsche… mas também o Catecismo Católico, Santo
Agostinho, David Hume, Pascal, Pierre Teilhard de Chardin… e mais Sartre, Roland Barthes, Bertrand Russel…

Tudo isto fiz durante um período de cerca de 25 anos, com sentido antropológico, numa atitude de aprender o comportamento humano perante o fenómeno religioso, e não animado de espírito guerreiro ao serviço do “anti-Cristo”, nem, tão pouco, na “procura de Deus”, do que não necessito absolutamente e em definitivo. Nem, ainda — como se vê pelo tempo dilatado —, com interesse de tirar um curso apressado de Religião, ao estilo dos cursos de Miguel Relvas!…

O fenómeno religioso, embora me interesse culturalmente, nunca constituiu matéria de extrema importância para a minha vida. Não é daí que eu tiro o meu sustento, apesar de me sentir bem lendo, pensando e escrevendo sobre o tema, e sempre fui muito passivo perante as religiões e as opiniões dos religiosos. Só me afirmei ateu, convicta e conscientemente, quanto já contava mais de 40 anos de idade. Mantenho-me tolerante, mas, às vezes (muito raramente), “salta-me a tampa” e assumo um discurso não habitual em mim, que não é antropológico do ponto de vista científico, mas que descamba mais para o estilo Gil Vicentino! Não sou santo e já não tenho idade nem paciência para aturar insolentes.

Hoje, perante o facto de um licenciado (médico, por exemplo) encarar o conceito de Deus com a mesma religiosidade demonstrada por um servente de pedreiro analfabeto, continuo a interrogar-me: Será que o licenciado não aprendeu nada, ou o analfabeto sabe muito?!…

Na verdade, crença e conhecimento (crer e saber) são matérias que não cabem no mesmo saco. São como água e azeite. Não se misturam nem têm índole semelhante. São, até, antagónicas, como o são os polos magnéticos. Repelem-se. Mas a primeira pode encontrar-se em cabeças recheadas com a segunda… quando se bebe da taça religiosa até ao fim, em catequeses e missas, na meninice!

Espanto-me com a recusa, ou incapacidade, que esse indivíduo intelectualmente superior tem, de apartar o mito do real! Acaba por fazer uma salada com ingredientes que não ligam! O resultado dessa experiência culinária, só pode ser… uma estupidificante diarreia mental !…

De facto o cérebro do Homem é complexo… e a música também. E a culinária… já agora !…

A religiosidade também pode ser manifestada em idade adulta, por quem não teve iniciação em criança, o que é mais raro mas acontece, e eu conheço um caso. Cada indivíduo, quando é dono da sua consciência, trilha caminhos próprios, motivados no seu querer e pelo seu crer. São interesses sempre iniciados por algo que vai funcionar como espoleta.

Na política aconteceu o mesmo depois do “Verão quente” de 1975. Filhos de comunistas, em regiões marcadamente de esquerda, filiaram-se no CDS. E alguns pais da ala mais direitista do espectro político da jovem democracia portuguesa, viram os seus filhos a militarem no PCP! A rebeldia contra o poder e a autoridade dos pais, pode criar destes fenómenos sociais, na política e na religião.

Obviamente (porque, realmente, não sou antropólogo, e não obstante a minha tolerância) não me coíbo de criticar costumes da Igreja, e de seitas religiosas que nascem como cogumelos em estrumeira para explorarem o sentido religioso dos mais despossuídos de tudo: de dinheiro, de sentido crítico, de qualidade de pensamento e de vida… e do resto.

Exploração que confirma o facto de Deus ser a pior invenção do Homem, porque tem, na subtil clonação das mentes, um dos aproveitamentos mais maldosos das religiões, criando “batalhões” que se servem de Deus para explorarem, chularem, sugarem e vigarizarem os crentes, que são, sempre, as vítimas culturalmente mais indefesas…

E isso devia constituir crime.

Onofre Varela

15 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

O papa, o mordomo, o informático e a fuga de documentos

Imaginem caros amigos que eu, ateu há mais de 50 anos, era o mordomo do Papa. Esqueçam que sou eu quem seleciona as companhias e que não privo com pessoas de passado duvidoso e comportamento estranho. Esqueçam que eu nunca trabalharia para a última ditadura europeia, um Estado fantoche criado por Mussolini e pelo papa de turno e que, jamais, colaboraria na venda de água benta e de indulgências.

Imaginem, pois, por mera abstração, que era eu o mordomo do papa de turno, de B16, o papa que está a levar a cabo uma campanha de branqueamento da cumplicidade da sua Igreja com os regimes nazis e, em especial, a reabilitação de Pio XII, depois de o seu antecessor pedir perdão pelas perseguições aos judeus feitas ao longo da história com base no antissemitismo do Novo Testamento, uma publicação fantasista que teve em vista justificar a cisão cristã dentro do judaísmo.

Ora, se eu fosse o mordomo, bastava-me declarar que tinha sido Deus, enojado com a sua Igreja, que me tinha pedido para denunciar os crimes que o comprometem. Um Deus que se preze não enterrava numa basílica um padrinho da Máfia, não lavava dinheiro da droga e das armas num banco que tem o pitoresco nome de Instituto para as Obras Religiosas (IOR) e, provavelmente, nem teria um banco.

Num Estado onde não há divisão de poderes, onde o ditador se encontra vitaliciamente legitimado por vontade divina, onde a santidade é atribuída pelo exercício das funções e o poder discricionário se legitima na crença da improvável existência do Espírito Santo, é fácil dizer que foi da vontade de Deus a denúncia de documentos que provam a falta de ética do pouco recomendável bairro.

E, dito, isto não sobraria aos juízes, impossibilitados de darem uma sentença antes de a submeterem à apreciação da Cúria, outra saída que não fosse conformarem-se com um milagre bem mais honesto e menos pueril do que os que o Vaticano diariamente inventa para canonizar defuntos de passado duvidoso que rendem avultados emolumentos.

A luta pelo poder, a que não é alheio o Opus Dei, transforma figuras menores, um mordomo e um informático, em bodes expiatórios de uma conspiração silenciosa pela eleição do próximo papa.

14 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

Um milagre que faz falta na Arábia Saudita

Um vídeo amador gravado em Presidente Médici-RO capturou a imagem de uma mancha avermelhada na Cruz da Jornada Mundial da Juventude, que percorre o País, vinda do Vaticano – Roma. O fenômeno é intrigante.

Desde que começou a circular pela cidade, após o evento, que aconteceu no último dia 05 de agosto, a gravação sugere duas vertentes: seria uma manifestação milagrosa com o Sagrado Sangue de Jesus ou um mero reflexo dos raios solares daquela manhã?

Diário de uns Ateus – Só pode ter sido milagre!

14 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

Supostamente…

O ex-mordomo do Papa Bento XVI, Paolo Gabriele, será julgado no mês que vem por participar do furto e publicação ilegal de documentos que, supostamente, provaria casos de corrupção no Vaticano.

O Diário de uns Ateus apreciou o termo «supostamente» atribuído à corrupção denunciada pela comunicação social de todo o mundo livre, nomeadamente no que se refere à lavagem de dinheiro da droga e às relações com a máfia, através do IOR. O que terá levado o Papa a mandar tomar medidas de precaução para evitar que os crimes se repetissem?

14 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

A beleza das mulheres

Por

ONOFRE VARELA

Que mau humor…. oh pá…também!!….

Encontrei a minha vizinha na rua e disse-lhe que ela tinha três lindas filhas….
…deitou-me uns olhos, quase me fulminou…. irra….
….será que uma pessoa não  se pode enganar…??? oh pá….também…!!

14 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

Jesus, esse familiar irresponsável

Por

Kavkaz

É com naturalidade que verificamos a alegria dos pais quando os filhos nascem. E também achamos natural a ajuda constante que eles dão aos filhos desde pequenos até à idade adulta. Os filhos são a continuação da família e é com naturalidade que os veremos a apoiar os pais na velhice, naquele período em que os pais já não podem fazer mais nem pelos filhos, nem por si próprios. Este é o desejo normal.

A Bíblia relata-se uma história anormal. Descreve-nos uma pessoa com problemas e conflitos com a sociedade em que vive. Trata-se de Jesus com pai biológico que nunca viu. A mãe dele vivia casada com o padrasto de Jesus. Foi o padrasto, carpinteiro de profissão, e a mãe quem pagaram as contas do sustento e educação de Jesus. O apregoado pai, “Deus”, não contribuía para o sustento do filho que fez, de forma inexplicada e sem aviso, à mulher do carpinteiro. Jesus cresceu revoltado, talvez por desconhecer o pai biológico e que nunca se dignou mostrar-lhe a cara. E Jesus queria tanto conhecer o pai, como é natural numa criança. Ele faria tudo para o conhecer, até morrer mais cedo. Esta criança viveu sempre revoltada e aos 33 anos era um adulto desestruturado.

Jesus vivia uma vida sem emprego conhecido e estável, uma vida boémia com amigos e mulheres do seu tempo. Assim, aos 33 anos ainda não tinha conseguido constituir a própria família, ter filhos e educá-los, ver crescê-los, participar e ser responsável pela sua própria família. Jesus não conseguiu nunca ser um exemplo de chefe de família. Era ainda o mesmo menino obcecado por conhecer o papá escondido algures e que lhe mandava recados em pensamento. Traspassava-lhe a ideia de proteger e salvar tudo e todos de algo terrível que poderia acontecer, desde que fossem judeus. Esta ideia fixa levou-o até às últimas consequências… Convenceu-se de que a sua morte seria a vontade do pai biológico, “Deus”, portador de um ego muito elevado e que apreciava os sacrifícios humanos. E apesar de não ser ético nem moral um pai desejar a morte dos próprios filhos, ele assumiu tal ideia como verosímil e caminhou voluntária e conscientemente para a própria condenação à morte às mãos de um poder local já cansado dos conflitos que ele provocava deliberadamente. Poderia ter evitado a própria morte, emancipando-se das ideias macabras do pai ausente, mas aceitou ficar na história e ser um mito, um “mártir”. Morreu crucificado por vontade de “Deus”, o pai biológico distante.

A sua morte foi chorada pela família, pelos companheiros de aventuras, pelas mulheres que o amavam. Choravam porque sabiam que já não poderiam contar mais com ele toda a vida. Se assim não fosse, não chorariam.

Em pior situação ficaram os verdadeiros pais de Jesus, os que o tinham acarinhado, alimentado, educado, que depositaram tantas energias, esforços, gastos, desejos e esperanças para fazer dele um homem. Debalde! A velhice chegaria e Jesus não estaria para os apoiar nos momentos mais difíceis dos pais velhotes. Ai, aquela cabeça no céu irresponsável…

13 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

A Virgem Maria (Crónica pia)

A Virgem Maria, farta das companhias e do Céu, onde subiu em corpo e alma, aborrecida do silêncio e da disciplina, cansada de quase vinte séculos de ociosidade e de virtude, esgueira-se às vezes pela porta das traseiras e desce à Terra.

Traz a ladainha do costume, a promoção do terço de que é mensageira e ameaças aos inocentes. Poisa em árvores de pequeno porte, sobe aos montes de altitude moderada e atreve-se em grutas, pouco recomendáveis para a virgindade e o reumatismo, sempre com o objectivo de promover a fé e os bons costumes, de abominar o comunismo e anatematizar os pecados do mundo.

A receita é sempre a mesma: rezar, rezar muito, rezar sempre, que, enquanto se reza não se peca. Não ajuda a humanidade mas beneficia o destino da alma e faz a profilaxia das perpétuas penas que aos infiéis estão reservadas no Inferno.
Surpreende que, sendo tão vasto o mundo, a Virgem Maria só conheça os caminhos dos seus devotos e abandone os que adoram um Deus errado e odeiam o seu divino filho que veio ao mundo para salvar toda a gente.

Fica-se pela Europa, em zonas não contaminadas pela Reforma, aventura-se na América Latina, eventualmente visita a África e nunca mais voltou a Nazaré e àqueles sítios onde suportou os maus humores do seu divino filho e as desconfianças do marido. Ficando-lhe as viagens de graça, por não precisar de combustível, não se percebe que não volte aos sítios da infância, não vá em peregrinação ao Gólgota, não deambule pela Palestina e advirta aqueles chalados de que o bruto e ignorante Maomé é uma desgraça que se espalhou pela zona como outrora a peste, que a única e clara verdade é o mistério da Santíssima Trindade.

Por ter hora marcada ou para não se deixar seduzir pelas tentações do mundo, a virgem Maria regressa ao Céu, depois de exibir uns truques e arengar uns conselhos, sem dar tempo a que alguém de são juízo a interrogue, lhe pergunte pela saúde do marido e do menino e lhe mande beijos para os anjos e abraços aos bem-aventurados que estão no céu.

Um dia a Virgem Maria, com mais tempo e autonomia de voo, encontra um ateu e fica à conversa. Há-de arrepender-se dos sustos que prega, das mentiras que divulga e chegar à conclusão de que o terço faz mal às pessoas, estimula o ódio às outras religiões e agrava as tendinites aos fregueses.