Crença e frustração
Há algumas peculiaridades comuns a todos os movimentos fanáticos de massas, sejam religiosos ou outros. Não digo que sejam idênticos, mas sim que comungam similitudes. Todos os movimentos religiosos por muito diferentes que sejam as suas doutrinas, despertam nos seus aderentes o mesmo tipo de mentalidade. Seja qual for a doutrina que advogam ou o programa que defendem, todos fomentam o fanatismo, entusiasmo, esperança fervorosa, ódio, intolerância, e o mais importante: – todos exigem uma fé cega e uma obediência unívoca.
Há uma uniformidade de actuação nos que manipulam as massas através da fé na busca do poder. Embora haja diferenças óbvias entre o Cristão, o Maumetano, o Comunista ou o Nazi, a verdade é que o fanatismo que os move pode ser encarado como um só. Ou seja, por mais díspares que se apresentem as causas sagradas pelas quais as pessoas estão dispostas a “dar a vida”, parece-me que o leitmotiv se mantém. O mesmo se verifica na motivação que os impele para a expansão e dominação global. Há diferenças no conteúdo das causas sagradas e das doutrinas, mas existe uniformidade nos factores que as tornam eficazes. Aquele que como Pascal, encontrou razões exactas para a eficácia da doutrina cristã também as encontrou para a eficácia da doutrina comunista, nazi e nacionalista.
O sentimento de frustração é um dos primeiros motivos que leva o crente a aderir a um qualquer movimento de massas, e geralmente adere de livre vontade. Parte-se do princípio que:
1º) A frustração, sem estímulos de proselitismo exteriores, pode suscitar a maioria das características peculiares do verdadeiro crente.
2º) A técnica de conversão-eficaz consiste essencialmente no inculcar e no fixar de propensões e reacções inerentes a uma mente frustrada.
Para testar a validade destas premissas, basta aferir dos males que afligem os frustrados, como reagem a eles, o grau em que estas reacções correspondem às reacções do verdadeiro crente e, por fim, a maneira como estas reacções podem viabilizar a ascensão e disseminação de um movimento de massas.
É possível constatar, examinando as técnicas e práticas aperfeiçoadas das conversões bem-sucedidas dos movimentos contemporâneos, como estas corroboram a opinião de que, um movimento de massas proselitista fomenta deliberadamente nos seus aderentes um estado de espírito frustrado, e de que persegue automaticamente os seus interesses ao secundar as propensões dos frustrados. É necessário que a maioria de nós tenha a percepção quanto aos motivos e às reacções do verdadeiro crente. É compreensível que os que fracassam sintam propensão para culpar o mundo pelo seu fracasso. Mentalmente manietado e previamente manipulado, o crente está sempre em marcha, e mediante conversão e confronto vai moldando o mundo à realidade dos interesses dos seus manipuladores.
Os movimentos religiosos são fábricas de entusiasmo generalizado. Os crentes, atraídos pela promessa de riquezas incalculávies (geralmente espirituais, apenas) e de mudança súbita e espectacular nas suas condições de vida, aderem ao espírito que se anuncia de renovação, só que essa renovação, não passa de uma continuidade no conservadorismo inerente a toda e qualquer religião. O crente contraria a sensação de insegurança e frustração, fazendo da sua existência uma rotina fixa dos rituais religiosos, através dos quais os seus manipuladores lhe extorquem tudo o que conseguem a troco de uma promessa de recompensa só possível de constatar depois de morto, no outro mundo. É esta a miserável condição de um crente.
A Igreja Católica, à semelhança das suas congéneres, não passa de isso mesmo; uma multinacional filha de um capitalismo extorsionário, sem o qual não sobreviveria.