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  • 28 de Março, 2012
  • Por Ricardo Alves
  • Seitas

A realidade sobre as Testemunhas de Jeová

No meu artigo anterior sobre uma associação (em preparação) de apoio a ex-Testemunhas de Jeová, o Vítor Máximo deixou um longo texto retirado do seu blogue («O Talho  e a Cidade»), justamente sobre esse tema. Para quem quiser saber como as Testemunhas de Jeová tratam os seus que deixam a organização, recomendo a visita ao blogue. De qualquer modo, fica aqui um texto de lá retirado (com autorização).

«Todos nós temos as Testemunhas de Jeová como indivíduos cordiais, educados e de trato fácil. Mas a realidade é bem mais complexa. Com certeza que existirá no meio Jeovista gente bondosa, mas estas mesmas deixam-se moldar por uma doutrina castradora que lhes comanda a vida ao mais ínfimo pormenor. A palavra “ínfimo” não é exagerada, pois a vida duma Testemunha de Jeová é regulada por um sem número de regras e ditames (ver aqui), desde de como agir no dia a dia nas mais diversas situações, passando pelo tratamento a dar aos que deixaram de pertencer à religião…

Certas regras de conduta, vão até interferirem na própria vida privada e íntima dos fiéis, chegando a roçar algumas delas o ridículo. A desobediência constante dessas mesmas normas, originam a expulsão do “prevaricador”.

Acontece que as Testemunhas de Jeová, são um grupo religioso, que apesar de não viverem à parte da sociedade onde se inserem, tem nos seus códigos de conduta, valores morais e religiosos que consideram superiores aos valores pelos quais a sociedade actual se rege.

Existe perseguição e discriminação por parte das Testemunhas de Jeová aos ex-membros da religião, submetidos aos processos de dissociação (abandono voluntário) e desassociação (expulsão) que vem desagregando famílias inteiras e promovendo intenso sofrimento às suas vítimas. As duas práticas impedem, por imposição de dogmas religiosos, divulgados nas publicações das Testemunhas de Jeová (ver alguns exemplos mais abaixo), a convivência familiar e social dos desassociados com membros que permaneceram na seita. As “verdades” de uma determinada religião não podem estar acima dos princípios de igualdade e liberdade de consciência religiosa, previstos na nossa Constituição. É inultrapassável o direito de optar por uma religião, ou de se desligar de qualquer uma. Ninguém pode sofrer a mínima pressão e/ ou coacção de qualquer espécie, seja proveniente de organizações públicas ou privadas posto que, se assim acontecer, está-se diante de uma franca violação aos ditames constitucionais, ferindo de morte direitos fundamentais cuja protecção, o Estado tem o dever de garantir.

Baseando-se em textos bíblicos distorcidos, e com uma interpretação errónea, o povo que se diz ser “o único representante de Deus”, maltratam aqueles que já foram os seus irmãos de fé, indo ao ponto de os humilhar e de os espancar moralmente… Não raro as vezes, os ex-membros são tratados como uns facínoras simplórios, como o que de mais vil há na sociedade, ou tão simplesmente como lixo. Nada disto até seria muito grave, se tais afirmações não saíssem da boca dos próprios amigos. Mais grave ainda, é quando esses mesmos comportamentos são tidos tão simplesmente pela própria família, sejam eles pais ou filhos… Como se todo este tipo de linguajar não chegasse, as leis internas das Testemunhas de Jeová determinam que todos aqueles que sejam desassociados, ou que decidem deixar a religião por um ou outro motivo, sejam afastados, não lhes sendo possível a convivência com nenhum membro da seita, nem mesmo com a própria família. Um simples “olá” é motivo de repreensão aos que ousaram desafiar as leis internas, podendo ir até a expulsão…

Eu próprio sou fruto dessa descriminação. Sinto uma enorme angústia por não conseguir ter uma convivência normal e sadia com os meus pais e o meu próprio irmão apenas porque uma “religião” lhes ordena a virarem-me (literalmente) a cara. Não sou um caso isolado, existe milhares de pessoas nesta mesma situação, privadas da comunhão dos seus amigos e familiares em nome de uma doutrina castradora, sectária e que viola de uma forma sistemática e desavergonhada a Declaração dos Direitos Humanos:

Artigo 5.º
Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanas ou degradantes.

Artigo 18.º
Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.

Artigo 19.º
Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.

Artigo 20.º
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Nasci no meio Jeovista e permaneci nele durante 33 anos. Hoje, com 41, já não faço mais parte dessa denominação religiosa. Sou ateu e orgulhoso de o ser.  Sei perfeitamente como funciona os meandros da seita “Testemunhas de Jeová” e quais as suas leis internas. Muitos dirão que tudo o que se diz são invenções dos famosos “apóstatas” (no jargão Jeovista, pessoas como eu, que tentam divulgar a verdadeira faceta das mesmas), para denegrir a imagem das (quase perfeitas) Testemunhas de Jeová. Para aquelas que teimam em dizer que tudo não passa de uma invenção engendrada pelos maléficos filhos do Demo, ficam aqui algumas das inúmeras citações retiradas da literatura Jeovista.

“A Sentinela” de 15 de Dezembro de 1981 p. 19 “Como encarar a desassociação”

(…)”Os que se tornam ‘não dos nossos’ por deliberadamente rejeitarem a fé e as crenças das Testemunhas de Jeová devem ser encarados e tratados apropriadamente como aqueles que foram desassociados por causa duma transgressão” (…)

“Nosso Ministério do Reino” de Agosto de 2002 (Pequeno Jornal interno de acesso restrito e exclusivo para os membros baptizados)
 (…) “Evitamos também o convívio social com quem foi expulso. Isso significa que não vamos com ele a piqueniques, festas, jogos, compras, ao cinema, nem tomamos refeições com ele, quer em casa quer num restaurante.

“A Sentinela” de 15 de Março de 1986 p. 18 “Não dê margem ao Diabo!”

“Alguns dos que têm atitude crítica afirmam que a organização de Jeová é estrita demais na questão de cortar os contactos sociais com pessoas desassociadas. (2 João 10, 11) Mas, por que acham isso tais críticos? Será que têm vínculos familiares íntimos ou uma lealdade errónea a um amigo, que eles colocam à frente da lealdade a Jeová, e às Suas normas e aos Seus requisitos?”

Recentemente a revista “A Sentinela” na edição de Julho de 2011, afirma que os ex-fiéis são “doentes mentais”. O artigo recomenda que os devotos devem “evitar contacto com os apóstatas” assim como um médico pede para manter distância de pessoas “infectadas com doenças contagiosas, mortal”. Afirma que o objectivo dos ex-fiéis é “infectar outras pessoas com seus ensinamentos desleais”. Uma associação de ex-Testemunhas de Jeová apresentou queixa à polícia do condado de Hampshire, que está a investigadar se o artigo viola as leis que punem a discriminação religiosa. Angus Robertson, um ex-ancião (pastor) da Testemunhas de Jeová, disse à polícia que é praxe da religião usar a Bíblia para intimidar os fiéis que ousam contestá-la. Rick Fenton, porta-voz da religião, negou que os devotos não possam fazer contestações, mas afirmou que quem discordar dos ensinamentos da Bíblia tem o direito de “pedir licença” (desligar-se do movimento) “, mas o que não falou foi as consequências para os mesmos.

Mediante todo este contexto, foi realizada este fim de semana a segunda reunião de ex Testemunhas de Jeová (ver aqui). Contactei pessoalmente a agência Lusa e convidei-a a estar presente, o que veio a acontecer. O resultado deste encontro pode ser lido no Diário de Noticias (aqui) ou no Jornal I (aqui).

Talvez outras se seguirão, é esperar que mais algum Jornal compre a noticia… Como tive ocasião de referir ontem, acho que estamos a começar a incomodar a “Santa Organização”. Será assim tão difícil explicar à sociedade civil o porquê de toda esta descriminação aos seus ex membros? Por muito que nos chamem de doentes mentais, por muito que digam que somos filhos do diabo, nada justifica este tipo de tratamento. Uma coisa eu tenho a certeza: está a valer a pena todo o esforço e dedicação.

Como diz a notícia, ainda estamos numa fase muito embrionária, mas aos poucos vamos crescendo. Bem recentemente eramos apenas 4, contra já alguma centena de inscritos no nosso Fórum…

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