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O cardeal admoestado

Por

E – PÁ

A sagrada Congregação para a Doutrina da Fé mantêm-se atenta e vigilante.

A entrevista do cardeal Policarpo à revista da Ordem dos Advogados – em que tocou pela rama a ordenação de mulheres – fez soar as campainhas no Vaticano. Disse: “penso que não há nenhum obstáculo fundamental. É uma igualdade fundamental de todos os membros da Igreja”. link
Numa recente deslocação a Roma, por ocasião da realização do Conselho Pontifício para a Evangelização, na residência de férias do papado (Castelgandolfo), foi “chamado à pedra”…devido a recentes declarações sobre a ordenação das mulheres.
A “marca” Ratzinger ainda ensombra os claustros da Congregação pontifícia. O dogma prevalece e resume-se : Este tema pertence à doutrina da Igreja que, nestas questões, é “infalível”.
Esta atitude ultra-ortodoxa da Igreja não nos deve surpreender. Ao contrário do que pensa a alta hierarquia e os indefectíveis zeladores da “fé”, não é um problema de doutrina mas sim uma situação que deve ser resolvida à luz dos “princípios”. Aliás, a [feroz] oposição à ordenação de mulheres é essencialmente de natureza cultural. E a sua clivagem entronca-se na Reforma (Séc. XVI).
Não é possível, para a Igreja Católica, abordar questões de género no amplo terreno social e laboral quando em casa pratica a mais intolerável discriminação. Não é possível suscitar problemas de igualdade de género quando a par do imposto celibato dos seus clérigos se enxertam questões de exercício de funções (e se desvalorizam qualificações) no ministério divino, baseadas no género.
A posição de fundo aflorada pelo cardeal Policarpo nem sequer é inovadora, nem progressista. Foi uma cautelosa e tímida deriva no campo especulativo.
Bastaria, para concluir isso, recordar declarações anteriores proferidas pelo cardeal de Lisboa:
“Embora a doutrina sobre a ordenação sacerdotal que deve reservar-se somente aos homens, se mantenha na Tradição constante e universal da Igreja e seja firmemente ensinada pelo Magistério nos documentos mais recentes, todavia actualmente em diversos lugares continua-se a retê-la como discutível, ou atribui-se um valor meramente disciplinar à decisão da Igreja de não admitir as mulheres à ordenação sacerdotal. Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja.” link
O “puxão de orelhas” do Vaticano ao cardeal representa pura e simplesmente a total intolerância da Igreja sobre o mais académico e meramente especulativo exercício de liberdade de pensar e exprimir a doutrina divina, protagonizada por um dos seus atentos (ao Mundo) membros …
Julgo que ao receber a reprimenda, em Castelgandolfo, o cardeal terá ouvido algo de semelhante: “As mulheres estejam caladas nas igrejas, porque não lhes é permitido falar, mas devem estar sujeitas, como também o diz a lei” (I Cor. XIV, 34), como assinalou S. Paulo.
Isto é, a submissão do cardeal às múltiplas submissões das mulheres é na lógica “divina” inevitável e incontornável.
Sabe o povo, na sua intuição histórica e, desde há séculos, temente da “fogueira” de que mais vale prudência do que ciência. É o anacronismo deste aforismo que a Igreja do séc. XXI revelou praticar.

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