O terrorista de Oslo (2)
(continuação)Na terceira parte do «compêndio» de Anders Breivik surge a solução global para as suas angústias: a «revolução conservadora». Ele define cuidadosamente «traidores de categoria A, B ou C». Que incluem todos os «marxistas da linha dura», «marxistas culturais», «humanistas suicidários» e «capitalistas globalistas». Os traidores «A e B» estão condenados à morte pelo «Tribunal Criminal» neo-templário por auxiliarem o «genocídio cultural» da Europa (são os líderes de partidos, mediocratas, conferencistas, deputados, etc). E é a obsessão recorrente com os «traidores multiculturalistas» que explica que Breivik não tenha atacado uma mesquita, mas sim um acampamento de jovens trabalhistas. Apenas após executar os «traidores» se iniciaria a «Cruzada» anti-islâmica que era o seu objectivo derradeiro. (Apocalíptico como qualquer al-qaedista, o senhor Breivik…)
Muitos bytes têm sido escritos sobre se Breivik deve ser considerado, ou não, um «fundamentalista cristão». É verdade que não será, a acreditar no seu texto, uma pessoa profundamente religiosa (apesar de rezar numa ocasião, e escrever que, numa situação como aquela em que se encontrou em Utoya, pensaria em «Deus»). Mas os seus objectivos eram religiosos, no sentido «cultural» e «identitário». A viragem na vida de Anders Breivik, de militante de partido populista e anti-imigração para terrorista, parece ter sido o apoio da UE aos muçulmanos do Cosovo, que entendeu como uma traição à «cristandade» (que lhe interessa mais do que o cristianismo). A sua obsessão com as cruzadas sublinha a importância que a «Igreja» (pré-reforma) tem para ele como bandeira, muito mais do que como doutrina. Aliás, as suas opiniões em matéria de doutrina são guiadas pelas suas obsessões geoestratégicas: defende que os protestantes sejam mais como os católicos porque vê a ICAR como mais próxima da tradição, e mais centrada na autoridade (papal) do que nos textos (bíblicos). Chega a recuperar, num exercício (voluntariamente?) semelhante ao dos al-qaedistas, as justificações dos papas medievais para as Cruzadas (pag. 1325), e as da Bíblia para a violência (pp 1329-1335).
Na página 1112 do seu «compêndio», explica o que dirá em tribunal depois da sua condenação. Que o «multiculturalismo» é uma «ideologia de ódio», «concebida para exterminar a cultura, as tradições e a nossa identidade europeias». Que só executou «traidores A e B», e que eles «facilitam a islamização e a guerra demográfica islâmica». E mais: que agiu «em autodefesa através de um ataque preventivo», com a autoridade maior da Europa: o «Tribunal Militar e Criminal – Cavaleiros Templários». O seu objectivo, explica a seguir, é matar «traidores» para depois expulsar muçulmanos. Nas páginas seguintes, fala várias vezes em proteger a Europa do Islão. O uso que faz da religião é instrumental (ou oportunista). Interessam-lhe a cristandade e os cruzados enquanto bandeiras guerreiras, e não enquanto espiritualidade. Do mesmo modo que alguns conservadores, mesmo que agnósticos (ou ateus) defendem a ICAR porque ela garante a ordem social e cultural que desejam manter. Breivik é um «cristão identitário» mas não um cristão (profundamente) espiritual.
Em resumo: um fanático e não um louco; um conservador e não um fascista; e um homem que actuou não movido pela religião, mas por objectivos religiosos. Nesse sentido (o sentido identitário e político), pode ser considerado um «terrorista cristão».