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  • 28 de Outubro, 2010
  • Por Carlos Esperança
  • Vaticano

O discurso do novo embaixador no Vaticano

O discurso de apresentação das Cartas Credenciais do novo Embaixador de Portugal junto do Vaticano foi um acto de bajulação pia, sem ética republicana, e a manifestação de subserviência em nome de um país laico e democrático.

O embaixador Fernandes Pereira esqueceu-se de que representa o país e não um grupo de peregrinos e de que Portugal é um Estado laico e não um protectorado do Vaticano.

Para o Sr. Embaixador pode ter sido a maior honra pessoal e profissional da sua vida dirigir-se ao «Beatíssimo Padre», mas não o foi para todos os portugueses, sobretudo para os que lhe reprovam o mal que tem feito à humanidade com a teologia do látex, nos países onde a SIDA dizima populações, e nas posições em relação à contracepção, planeamento familiar, saúde reprodutiva da mulher, sexualidade e igualdade de género.

A alegada emoção do Sr. Embaixador com a canonização de D. Nuno Álvares Pereira, devida ao milagre obrado em D. Guilhermina de Jesus a quem curou o olho esquerdo, queimado com salpicos de óleo fervente de fritar peixe, é para muitos portugueses um motivo de troça e não de comoção, por ter transformado o herói em colírio.

Ao recordar que «um Predecessor de [Sua] Santidade honrou Portugal, na pessoa do seu Rei, com o título de Fidelíssimo», veio lembrar quanto ouro custou a Portugal, que vivia na miséria, esse título obtido por D. João V, o rei que mantinha a sua amante predilecta, madre Paula, no convento de Odivelas. Devia ter evitado remexer no passado devasso e perdulário de Sua Majestade Fidelíssima, um dos reis que mais dinheiro dissipou à Coroa e mais filhos bastardos deixou ao reino.

O Sr. Embaixador não tem o direito de se apresentar como «o intérprete da arreigada devoção filial do Povo Português à Igreja e a [Sua] Santidade …» por respeito ao pluralismo ideológico e à liberdade religiosa do País que o diplomata representa.

O que pensarão ateus, agnósticos, cépticos, crentes de outras religiões, e mesmo alguns católicos, do embaixador que se permitiu terminar o seu discurso solicitando ao Papa «que paternalmente se digne abençoar Portugal, os Portugueses e os seus Governantes e, se tal ouso pedir, a Embaixada, a minha Família e eu próprio»?

O discurso ofendeu os portugueses livres-pensadores com a linguagem beata e a falta de pudor com que, em ano do Centenário da República, o embaixador humilhou todos os que dispensam a bênção papal. A prédica foi uma oração rezada de joelhos em nome de Portugal.

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