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  • 9 de Agosto, 2010
  • Por Fernandes
  • Ateísmo

Diálogos de um ateu

– Se temos que começar, eu quero deixar clara a diferença entre fé e razão. – diz o crente.

– A igreja católica, mesmo que você não acredite, nunca esteve contra a razão. E mais, num dos seus últimos concílios, proclamou que a razão pode demonstrar a existência de deus.

– E demonstrou-o?

– Que acha?

– Que quer dizer com essa pergunta?

– Quero dizer que a teologia dos seus correlegionários, é sempre a mesma, após séculos de demonstrações, desde Anselmo a Tomás de Aquino, vem agora dar razão à razão. Não lhe parece irónico?

– Irónico porquê?

– Porque as subtilezas dos teólogos são irónicas. Primeiro, e durante séculos, quiseram demonstrar a existência de deus. Depois, como essas demonstrações não demonstraram nada, decidem afirmar que a razão pode demonstrar a existência de deus. A mim dá-me riso.

– Riso? Não sei porquê, este é um assunto sério.

– Não duvido, mas a seriedade não consiste em dizer uma e outra vez, que a razão pode demonstrar a existência de deus, senão demonstrá-la de uma vez por todas. E eu continuo à espera.

– E continuará. Você não é crente!

– Deixe a crença de lado. Estamos a falar de razão.

– A fé pode ajudar a razão.

– Já tardava… você fala como o papa reinante; nada de raciocinar, deitar mão da fé para que a razão não se extravie, ou seja; deixai o cego como está mas dai-lhe uma tocha. Melhor ainda; deixai o cego como está, mas dai-lhe um Lázaro tonsurado que o leve pelo caminho certo.

– A fé e a razão não são opostas.

– Quantas vezes ouço essa frase. Não só são opostas, como nem sequer se parecem. Não são sequer da mesma natureza. Com a razão só se pode discutir; com a fé só se pode acreditar. Não se parecem em nada. Faça o teste, tente questionar a fé, e verá como a ela desaparece. Pelo contrário, se acreditar em vez de questionar, verá que desaparece a razão.

– Também não é assim como diz.

– Já começa você com trocadilhos.

– Trocadilhos? A que se refere?

– À arte dos trocadilhos, ou a arte de dizer que sim e que não ao mesmo tempo. Arte em que a igreja se especializou, e a que chamam teologia. O simples jogo de mudar o sentido das palavras para dizerem o que queremos que digam. Até agora a razão não conseguiu demonstrar a existência de deus, mas não importa, agora trata-se de dizer que sim, que pode demonstrá-la.

– E assim é!

– Não, não é assim, porque quando tentaram demonstrar não o conseguiram, afinal de que falam? De trocadilhos, de jogos de palavras, subtilezas que nem sequer o chegam a ser, basta olhá-las como são, como mentiras autorizadas, para que desapareçam.

– Mas …

– É verdade! Que fácil seria para a igreja aceitar que santo Anselmo ou Tomás, não conseguiram provar a existência de deus. Que também não o conseguiram a partir da razão. Mas não é preciso que o aceitem ou afirmem. Está à vista.

*Ignacio Ferreras, Juan. – Diálogos del Ateo.

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