Loading

Mês: Junho 2010

9 de Junho, 2010 Ricardo Alves

Padre pedófilo sai da prisão e vai celebrar missa

Aconteceu em Espanha: cumprida a pena de prisão por abuso sexual e agressões a uma criança de dez anos, o sacerdote católico Luis José Beltrán Calvo saiu e foi dar missa. Não sofreu, e aparentemente não sofrerá, qualquer sanção eclesial. E nem sequer há garantias da hierarquia da ICAR de que se evite o seu contacto com crianças.

8 de Junho, 2010 Ludwig Krippahl

A diferença é ser treta.

Não concordo que o Estado gaste dinheiro a contratar padres para os hospitais, a subsidiar a vinda do Papa ou a pagar professores de religião nas escolas públicas. Mas quando digo isto muitos apontam que o Estado também gasta dinheiro em futebol, cinema e música. Se as pessoas gostam de padres e missas, dizem-me, então o Estado deve investir nisso também.

Não me parece. Admito que preferia menos futebol e mais programas de ciência. Ou de ilusionismo. Ou de praticamente qualquer outra coisa, que o futebol é um bocado seca. E acho que gastar oitocentos mil euros em concertos do Tony Carreira (1) é pior que deitar dinheiro ao lixo. Do lixo sempre podia ir parar a quem tivesse mais necessitado. Mas nestes casos a minha opinião é meramente subjectiva. Objectivamente, a mestria do drible ou da música pirosa é tão legítima como a da astronomia ou dos truques com cartas. Sendo o critério apenas a preferência pessoal, só posso exigir que o Estado não descure ninguém e tenho de aceitar que a fatia maior seja ao gosto da maioria.

Mas artistas e desportistas, como o Tony Carreira, o Cristiano Ronaldo e o Luís de Matos, fazem algo fundamentalmente diferente do que faz a Maia, a Alexandra Solnado e aquela amiga da Júlia Pinheiro que fala em inglês com mortos portugueses. O Tony Carreira pode fazer playback, o Ronaldo fingir que levou uma canelada e o Luís de Matos esconder uma data de coisas na manga, mas toda a gente sabe que é assim. Faz parte do espectáculo e sabê-lo não tira o prazer de os ver actuar. Em contraste, só gosta da Maia, dos livros da Alexandra Solnado ou do pessoal que fala com os mortos quem enfiar o barrete e julgar que aquilo é mesmo verdade. Quem sabe que é tudo inventado não acha piada nenhuma.

E nessas coisas o Estado não deve participar. Não digo que o proíba. Se a TVI quer dar programas de gente que fala com os mortos, que se lixe. Mas astrólogos na RTP1, pagos dos nossos impostos, não está certo. Porque o que leva as pessoas a ver a Cristina Candeias a prognosticar isto e aquilo é a convicção de que ela consegue mesmo ver o futuro na posição dos planetas. E disso não há quaisquer evidências. Nem é preciso provar a negativa, que a Cristina Candeias não prevê o futuro. Basta não haver nada que justifique assumir que aquilo funciona, porque o Estado não deve contribuir para que convençam as pessoas de coisas sem fundamento.

Foi este o problema da missa na Praça do Comércio. Pode haver quem goste de ver o Ratzinger a actuar de vestido branco e sapatinhos encarnados. Eu não acho piada, mas gostos não se discutem. O problema é que a maior parte das pessoas que lá esteve só quis assistir ao espectáculo porque estava convencida que o Joseph Ratzinger é o representante oficial do ser omnipotente que criou o universo, que com um gesto do Joseph Ratzinger esse ser omnipotente abençoa a multidão e que com umas palavras do Joseph Ratzinger altera a substância da hóstia, que deixa de ser água e farinha para se tornar o corpo de um carpinteiro que morreu há dois mil anos (mas, felizmente, sem alterar o sabor). Este espectáculo só pode ser apreciado por quem se convencer de muita coisa que as evidências não justificam.

A assistência “espiritual” nos hospitais e o ensino religioso nas escolas públicas sofrem do mesmo problema. Nestes casos não podemos considerar apenas as preferências das pessoas porque esses juízos de valor que fazem assentam em informação incorrecta ou em premissas infundadas. Mesmo que muita gente goste da Alexandra Solnado não se deve financiar do erário as suas conversas com Jesus. Nem as consultas do professor Mamadu, os prognósticos do Paulo Cardoso, a transubstanciação da hóstia ou o ensino de rezas a pedir favores menino Jesus.

1- I, Tesourinhos das adjudicações directas

Também no

7 de Junho, 2010 Carlos Esperança

Os negócios da fé e a exegese católica

Nunca percebi, nem me sabem explicar os que levam a sério o Vaticano, como é possível a uma alma caída no Inferno viajar para o Paraíso sem transportes negociados entre dois destinos turísticos que, em princípio, estão de relações cortadas.

Ao longo da história aconteceu a alguns excomungados morrerem com bilhete marcado para o Inferno e acabaram reintegrados no número dos bem-aventurados e conduzidos aos altares, para bem da fé e dos negócios respectivos.

Não sendo compreensível que um santo aprovado com um mínimo de dois milagres se alcandorasse aos altares e se mantivesse eternamente a frigir em azeite nas profundezas do Inferno, é difícil saber como pode ser resgatado das perpétuas penas para as delícias celestiais igualmente definitivas.

Bem sei que Joana d’Arc, depois de queimada viva, seria reabilitada e canonizada cinco séculos depois mas a infalibilidade dos papas só existe depois de Pio IX um desalmado cuja encíclica Syllabus ainda hoje arrepia o mais insensível dos trogloditas.

O que agora perturba alguns créus é a excomunhão com que João Paulo II condenou às eternas tormentas Monsenhor Lefebvre e os seus sequazes para agora ser discretamente recuperado pelo actual pontífice.

O bando de Lefebvre é declaradamente partidário do Concílio de Trento, de posições fascistas e do mais primário e execrável anti-semitismo, o que faz da Fraternidade Sacerdotal São Pio X a comunidade menos recomendável para servir de modelo ético.

Não se percebe como pode agora o bispo Lefebvre, depois de amaldiçoar em latim a temperatura do Inferno viajar para o Céu pela mão da actual santidade de turno no Vaticano – Bento XVI.

São insondáveis os mistérios daquele bairro de 44 hectares!

6 de Junho, 2010 Ludwig Krippahl

Treta da semana: com esses meninos não brinco.

Recebi por email a notícia que o Conselho Pontífice para a Cultura vai encetar um “diálogo aberto” entre o Vaticano e os ateus, «criando uma fundação para focar as relações com ateus e agnósticos» (1). À partida a ideia é boa. Quando duas partes discordam faz falta uma conversa franca onde cada uma possa apontar as premissas que rejeita, justificar as suas de forma que a outra aceite e esteja disposta a mudar a sua posição se a justificação contrária for melhor.

Mas o Vaticano tem uma ideia diferente de “diálogo aberto”. Mais habituados à missa que ao debate, querem deixar a conclusão assente logo de início. A iniciativa responde ao desafio do Papa para que a Igreja Católica venha «renovar o diálogo com homens e mulheres que não acreditam mas que querem aproximar-se de Deus». Parece-me que será uma amostra pequena e tendenciosa do universo de ateus e agnósticos. Além disso, o objectivo não é determinar quem tem razão ou sequer encontrar pontos consensuais. É «ajudar as pessoas a sair de uma concepção pobre da crença e promover a compreensão que a teologia tem dignidade científica». Começar por dizer “diálogo aberto” e chegar a isto faz-me lembrar as velhinhas com a revista Despertai debaixo do braço que começam por perguntar “Jovem, gosta de ler?”. O que se segue está para o gosto pela leitura como esta iniciativa está para o diálogo aberto.

Para reforçar que isto é só para quem quer ouvir o sermão e não para quem quer debater, deixam claro que só estão interessados no «ateísmo ou agnosticismo nobre, não no polémico», e que não querem debater com «ateus como [Piergiorgio] Odifreddi na Itália, [Michel] Onfray na França, [Christopher] Hitchens e [Richard] Dawkins». Querem um diálogo aberto mas sem polémica.

Talvez seja um problema de generation gap. O topo da hierarquia da Igreja Católica tem apenas homens do tempo em que se levava o catolicismo tão a sério que ninguém apontava estes disparates. Mas hoje, por muito que lhes custe a admitir, as coisas mudaram. Se organizam um “diálogo aberto” só com fantoches, «para criar uma rede de pessoas agnósticas ou ateístas que aceitem o diálogo e entrar como membros na fundação e, portanto, no nosso dicastério», vão ser é gozados.

Se querem dialogar com os ateus então organizem os debates com aqueles que os ateus consideram resumir melhor a sua posição. Se só escolherem os “ateus nobres” que querem fazer parte da Igreja Católica e aproximar-se desse deus o diálogo vai ser notável apenas pelo caricato da iniciativa.

1- Catholic News Agency, Atheists invited to join Vatican Council for outreach initiative
2- The Independent, Vatican reaches out to atheists – but not you, Richard Dawkins

Também no Que Treta!.

5 de Junho, 2010 Carlos Esperança

O esgoto do Universo

É assim que o primata, que parece saído do título com que pretendeu definir o ateísmo, intitulou este texto no Jornal da Madeira.

Quando um cruzado sai da Idade Média para bolçar inanidades, não há argumentação que valha, nem paciência que justifique uma resposta.

Faz mais pelo ateísmo este naco de ódio em português medíocre do que a lúcida, serena e inteligente pedagogia dos pensadores ateus.