Espanha – Um país e dois Varelas
O cardeal Antonio María Rouco Varela, bispo de Madrid, um dos mais reaccionários de Espanha e do mundo, abriu feridas insanáveis com a ajuda de Ratzinger, ao canonizar e beatificar, em doses industriais, defuntos admiradores de Franco.
Foi um acto deliberado contra a democracia e, na pressa, nem todos eram aconselháveis para os altares apesar da generosidade com que Bento XVI eleva fascistas à santidade. Podia ter-se ficado por Escrivà, a quem devia favores e dinheiro, apesar da conivência com a ditadura e o ditador, e poupado a Espanha ao reavivar de memórias dolorosas de quem viveu horrores praticados dos dois lados da guerra civil.
Agora apareceu outro Varela, a quem também não faltam vestes talares e a nostalgia do ditador cruel que, depois de ganhar a guerra, nunca mais perdeu o espírito sanguinário.
O juiz de instrução do Supremo Tribunal, Luciano Varela, levará a julgamento Baltasar Garzón, por ter decidido investigar os desaparecidos da guerra civil e do franquismo, violando a lei de amnistia geral de 1977. Faltava este Varela para evitar que os crimes de um dos mais sanguinários ditadores do século passado fossem conhecidos com rigor.
Rejubilam os franquistas, incluindo a maioria do clero, que assistiram à democratização de Espanha, convictos de que Franco era o enviado da providência divina. O fascismo está vivo nas Forças Armadas, nos Tribunais e nas Universidades que permaneceram intactas, tal como a Igreja católica, e se mantêm redutos sólidos do fascismo espanhol.
Quando o juiz Baltasar Garzón, ciente de que os crimes contra a humanidade não devem prescrever, resolveu exumar os crimes da Guerra Civil, com a mesma coragem com que perseguiu os da ETA, viraram-se agora contra si os carrascos que então rejubilavam.
O julgamento de Baltazar Garzón não é só um libelo contra a democracia e o direito dos descendentes das vítimas à verdade, é a vingança mesquinha contra um juiz que, se for suspenso, perde o direito à protecção policial e fica sujeito às balas dos inimigos.
É talvez isso que os seus algozes querem. Basta que o Varela de toga possa fazer o que o Varela de mitra não consegue. Nem o escândalo internacional, nem a indignação dos descendentes das vítimas, nem a estupefacção de magistrados democratas o demoveu. O ódio é velho e não cansa.
Perfil de Autor
- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa
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- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;
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- Colaborador do Jornal do Fundão;
- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»
- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:
- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;
- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores
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