Loading

Mês: Março 2010

11 de Março, 2010 Carlos Esperança

Situação explosiva na Nigéria após massacre de cristãos

A pobreza e a ignorância ampliam a violência enquanto o tribalismo e a fé agravam a crueldade e o petróleo se torna maldição.

A Europa condói-se com uma única criança caucasiana que morre de acidente mas fica insensível perante centenas de crianças negras que todos os dias falecem em África, por doença, à fome, vítimas das lutas tribais e religiosas. Na Nigéria, o duelo religioso em curso mata homens, mulheres grávidas e crianças, mutilados à catanada ou queimados vivos, numa orgia sangrenta detonada por religiões que baniram os deuses autóctones.

Desta vez – dizem os sobreviventes e as autoridades locais – foram criadores de gado, nómadas muçulmanos da etnia fulani, que mataram cristãos sedentários da etnia berom.

Em África assiste-se à disputa entre o islão e um cristianismo radical. O islão, apoiado pela Arábia Saudita, medra nos países do Sahel (Senegal, Mali e Níger) e o cristianismo evangelista ganha terreno na África do Sul, Costa do Marfim, Benim e Libéria com a ajuda dos EUA e das grandes igrejas evangelistas. O cristianismo mais prosélito contra o mais fanático islamismo. Dois fascismos teocráticos em confronto.

(O Sahel é a região da África situada entre o deserto do Sahara e as terras mais férteis a sul). Normalmente, incluem-se no Sahel o Senegal, a Mauritânia, o Mali, o Burkina Faso, o Níger, a parte norte da Nigéria, o Chade, o Sudão, a Etiópia, a Eritreia, o Djibouti e a Somália. Por vezes, usa-se este termo para designar os países da África ocidental, para os quais existe um complexo sistema de estudo da precipitação. (Wikipédia).

Os EUA e a Europa, cujos dirigentes dependem dos votos religiosos, traíram a herança laica. Os primeiros esquecem a Constituição outorgada por quem fugiu aos horrores das guerras religiosas da Europa e que trata as religiões em pé de igualdade com as outras associações. Os europeus esquecem que a liberdade de que gozam só foi possível com a paz de Westfália que pôs fim à sangrenta Guerra dos Trinta Anos, em luta contra Roma.

À medida que a laicidade vai enfraquecendo, jorram com a violência da fé os conflitos provocados pelos que não se satisfazem com o deus que lhes coube e insistem em impô-lo aos outros.

A laicidade do Estado, sem tibiezas, é condição sine qua non para a preservação da paz mas as religiões gozam de direitos que lhes permitem semear o ódio e fazer a guerra impunemente.

10 de Março, 2010 Carlos Esperança

Alemanha – ICAR com as calças na mão

Depois da Irlanda é em torno da Igreja alemã que agora se faz luz sobre o assunto dos abusos sexuais, implicando padres, particularmente nos internatos dirigidos por ordens religiosas.

Leia mais …

9 de Março, 2010 Carlos Esperança

Polónia: Vitória do livre-pensamento

Alicja Tysiac tinha processado um jornal católico, Gosc Niedzielny, e o Arcebispo de Katowice porque tinha sido insultada e comparada a uma criminosa por ter defendido o direito ao aborto. O processo, em primeira instância, tinha sido favorável a Alicja Tysiac.

Os clérigos recorreram. Perderam !

[O tribunal superior] rejeitou o recurso e confirmou a sentença da primeira instância favorável a Alicja Tysiac. A revista episcopal e o arcebispo de Katowice deverão publicar desculpas a Alicja Tysiac por a terem comparado aos criminosos nazis e por terem usado contra ela um discurso de ódio. Deverão igualmente pagar 30.000 zlotys (cerca de 8.000 euros) por danos assim como as custas judiciais.

Nota : DA agradece a informação ao leitor Eduardo C. Dias.

9 de Março, 2010 Carlos Esperança

Considerações sobre religiões (2)

O Império Romano foi cimentado pelo cristianismo, mas a Europa moderna – e essa é uma singularidade sua – foi construída pelas suas elites políticas e intelectuais, através da separação da Igreja e do Estado, em contínuo confronto com o catolicismo romano, avesso à modernidade.

Os países dominados pelo cristianismo ortodoxo, onde o direito tem natureza política, não conseguiram a laicidade do Estado e essa é a principal razão para que nenhum país ortodoxo tenha conseguido um Estado moderno.

Mas, talvez a mais dramática das sequelas da moral religiosa tenha sido a obsessão pela repressão sexual que causou a infelicidade, o medo e o trauma do pecado em relação a uma fonte de prazer e de realização humana. E, o pior de tudo, o carácter misógino que impediu a emancipação da mulher, o direito à sua determinação social, profissional e cívica, reprimida pelos mais boçais e cruéis preconceitos patriarcais.

Neste ano do Centenário da República Portuguesa, precisamos de um sobressalto cívico, laico e republicano, que ecoe pelo Planeta e ponha termo às guerras religiosas que a fé faz detonar e ao terrorismo de quem julga cumprir a vontade de um deus cruel, violento e vingativo, uma criação obscena do desvario dos seus crentes.

O diálogo de religiões é uma impossibilidade teórica e prática. Pode – e deve – haver um diálogo de culturas. Aliás, as culturas contaminam-se, no sentido sociológico, e acabam por ser a síntese de várias, o produto da convivência entre comunidades diversas, o resultado da assimilação mútua e recíproca dos usos e costumes de todas e de cada uma.

O diálogo das religiões é diferente, é uma utopia, na melhor das hipóteses e, na pior, uma operação de marketing para facilitar o proselitismo e disfarçar a aversão recíproca. A religião, qualquer que ela seja, considera-se a única que interpreta a vontade divina e exige que todos se submetam à vontade do seu Deus.

Os homens podem entender-se mas os deuses exigem o confronto. O boato de que os livros sagrados são a expressão da vontade divina, ditados por anjos ou intermediados por profetas transforma as palavras em dogmas e os recados de Deus em sentenças de obediência obrigatória.

8 de Março, 2010 Ludwig Krippahl

Deus e a pedra

Dizem que Deus é omnipotente. Não explicam como o descobriram nem sequer como se testa se alguém é omnipotente e não apenas muito poderoso. Dizem que é, e pronto. E a omnipotência é problemática, como ilustra o clássico exemplo de Deus criar uma pedra tão pesada que nem ele possa levantar. Se Deus é omnipotente então consegue criar um objecto inamovível. E se é omnipotente consegue movê-lo. Mas se consegue movê-lo é porque não o conseguiu criar inamovível. Ou seja, mesmo quem é omnipotente não pode fazer tudo, ao contrário do que o termo sugere.

Os defensores da omnipotência dizem que este problema se resolve restringindo a omnipotência apenas ao que é logicamente possível e definindo em seguida o âmbito dessa possibilidade. O que foge ao problema, que era precisamente ser preciso encolher a omnipotência para ser menos que “pode fazer tudo”. Mas adiante. Explicam então que se Deus é omnipotente é capaz de mover qualquer objecto. Assim, é logicamente impossível existir um objecto inamovível e, por isso, a incapacidade de Deus criar tal objecto não contradiz a sua omnipotência. Sendo esse objecto logicamente incompatível com um deus omnipotente, conclui-se que um deus omnipotente não consegue criar um objecto que não possa mover.

Como é regra nestas “explicações”, a hipótese parece razoável só até considerarmos alternativas. Por exemplo, se um objecto é inamovível é logicamente impossível movê-lo. E se um Deus é omnipotente pode criar qualquer objecto, mesmo inamovível. E como é logicamente impossível mover um objecto inamovível, a incapacidade de Deus mover tal objecto não contradiz a sua omnipotência. Demonstra-se assim exactamente o contrário do parágrafo anterior: Deus pode criar um objecto inamovível – afinal, é omnipotente – mas não o pode mover porque isso seria logicamente impossível – o objecto é inamovível, por definição – e Deus só pode fazer o que é logicamente possível.

A hipótese de haver um ser que pode fazer tudo cria inconsistências como esta entre poder criar um objecto inamovível e poder mover esse objecto. Para eliminar tais inconsistências basta eliminar uma das hipóteses. Ou consegue criar qualquer objecto mas não consegue mover os inamovíveis, ou consegue mover qualquer objecto e não consegue criar um que seja inamovível. Mas isto não resolve o problema original que é não ser possível ter poder para para tudo. É sempre preciso substituir a noção de omnipotência, que em vez “pode fazer tudo” passa a ser “só pode fazer aquilo que não torne a ideia absurda”.

Ainda assim, ficamos com duas formas diferentes mas perfeitamente equivalentes de eliminar a contradição. E ficamos sem saber se a omnipotência de Deus lhe permite mover qualquer objecto ou se lhe permite criar objectos inamovíveis. Sabemos que ambas não pode ser, mas qual das alternativas é a correcta permanece um mistério. Como tudo o resto, nestas coisas.

O problema principal é que todas estas hipóteses são gratuitas e inúteis. Não há qualquer observação que nos indique se a omnipotência de Deus permite, ou não permite, criar um objecto inamovível. Não há nada que se explique com estas hipóteses. E o mesmo se passa com a própria hipótese da omnipotência.

Há muitas hipóteses que não podemos descartar sem ficar com dados a nu, com coisas por explicar. Se descartarmos a gravitação não percebemos o movimento dos corpos. Sem o electromagnetismo não compreendemos a luz e a electricidade. Sem a evolução não se percebe a diversidade dos seres vivos, e assim por diante. Mas se descartarmos a hipótese de existir um deus omnipotente toda a nossa compreensão daquilo que observamos fica na mesma. Não perdemos nada ao rejeitar essa hipótese.

Além disso, descartar a hipótese que Deus existe resolve uma data de problemas destes. Problemas inconsequentes mas que, como os símbolos do Reiki, infelizmente muita gente leva a sério. O problema de Deus já saber tudo o que eu vou fazer ao longo da minha vida, tornando a minha liberdade numa mera ilusão. O problema de permitir que crianças sofram com doenças e acidentes. O problema de ser extremamente exigente quanto a rituais e comportamento mas não esclarecer qual dos livros sagrados, doutrinas e líderes religiosos é o certo. Todos esses problemas desaparecem, sem qualquer desvantagem, se fizermos à hipótese de Deus o que fazemos com a do Pai Natal.

É uma razão forte para ser ateu. É análoga ao que me leva a fazer contas sem me pôr a somar zero e a multiplicar por um a cada passo. Mesmo que seja logicamente consistente e mesmo que não altere o resultado é tempo perdido e não adianta de nada.

Em simultâneo no Que Treta!