Vaticano e santidade
O mundo não virou santo quando João Paulo I foi chamado à divina presença, como se diz lá na Casa, 33 dias após ter sido designado papa e poucos dias depois de ter anunciado uma investigação ao Instituto das Obras Religiosas (IOR), também conhecido por banco do Vaticano.
São insondáveis os caminhos do Senhor, como soe dizer-se, a partir do bairro de 44 hectares onde se autenticam milagres e emitem diplomas de beatos e santos que nos dois últimos pontificados inundaram os países obedientes a Roma.
Portugal tem sido, aliás, prejudicado, seja por falta de meios para emolumentos, míngua de orações ou incúria dos bispos. Em Espanha foram beatificados e canonizados centenas de mártires, vítimas dos republicanos, e, na onda, até defuntos pouco virtuosos, em vida, ascenderam aos altares. O erro foi irrelevante pois os milagres são obrados por aspirantes à santidade e só excepcionalmente por santos diplomados. Os milagres são impreteríveis para provas curriculares e dispensáveis aos promovidos.
Após a canonização de Nuno Álvares, adiada durante séculos pela aversão de Castela, vá-se lá saber porquê, abriu novo concurso e já se encontram inscritos vários bem-aventurados que aguardam milagres para prestarem provas.
O último inscrito tem relevância pública, obra pia e admiradores indefectíveis. Trata-se do padre Américo que o bispo de Coimbra, Albino Cleto, quer ver nos altares.
No Domingo, dia 15 de Março, deste Ano da Graça de 2009, o virtuoso bispo exortou os fiéis a, através da oração, pedirem a Deus que «haja milagres» para que avance o processo de canonização do padre Américo. «Que Deus o torne ainda mais exemplar, possibilitando um milagre que adiante a causa da sua canonização. Que nós sejamos capazes ao menos de, em comunidade, pedir a Deus que nos dê santos como este» – disse o bispo na Igreja de Santa Cruz, em Coimbra, na homilia de homenagem ao Padre Américo.
Espanta-me, talvez por descrença, esta necessidade da cunha, tão ao gosto local, tão venal, tão pouco recomendável para um deus que devia estar atento à santidade dos melhores e não às pias recomendações episcopais.
Perfil de Autor
- Ex-Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa
- Sócio fundador da Associação República e laicidade;
- Sócio da Associação 25 de Abril
- Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da A25A;
- Sócio dos Bombeiros Voluntários de Almeida
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- Colaborador do Jornal do Fundão;
- Colunista do mensário de Almeida «Praça Alta»
- Colunista do semanário «O Despertar» - Coimbra:
- Autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras e catálogos;
- Sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores
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