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Treta da Semana: os Mamadus.

Esta semana celebro a promoção do Professor Mamadu (1), anteriormente Mestre Mamadu (2). Ou, se calhar, é outro Mamadu que sempre foi professor (3). Ou outro (4). As moradas são todas diferentes. Não sei se é um a fugir dos maus olhados (ou dos antigos clientes), se é uma invasão de Mamadus ou se é a versão vidente-astrológica do jogo da vermelhinha.

Mas nota-se um franco progresso. Enquanto Mestre, Mamadu era «especialista em destruição de trabalhos de bruxaria e especialista em retorno de afecção, mesmo casos muito complicados». Quanto aos «problemas de amor, dinheiro, saúde entre outros», ajudava a resolvê-los, mas não era sua especialidade (2). Agora está muito melhor. «Especialidade de todos os trabalhos ocultos»(1). É raro encontrar um especialista em tudo, mesmo entre os professores, por isso o esforço de se especializar em todos os trabalhos ocultos fá-lo merecer o novo título.

Alguns podem questionar como é que ele pode ser especialista em tudo se o termo denota uma dedicação especial a alguma parte. Ou como é que ele sabe ser especialista em todos os trabalhos ocultos se os trabalhos são ocultos. Não terá escapado algum, mais escondido? Infelizmente, muitos há que não questionam nem isto nem o resto dos disparates que esta gente vende.

A culpa, em parte, é da reverência excessiva com que lidamos com as crenças. A nossa sociedade enaltece, favorece e protege quem acredita em disparates. Seja que disparate for. Que uma virgem deu à luz, que um condutor de carroças falava com o criador do universo, que este criou o universo em meia dúzia de dias. Acreditar ou, especialmente, representar uma crença, dá estatuto social. Dizer que uma crença é disparatada é visto como uma ofensa ou agressão. E até se considera um direito dos pais treinar os filhos a crer no que quer que os avós tenham impingdo aos pais pelo mesmo processo.

O problema não é só a ignorância. É certo que é mais fácil enganar quem está menos informado, mas mesmo um analfabeto tem relutância em aceitar que o Mamadu resolve tudo e mais alguma coisa só por se dizer «Dotado de Dom hereditário». Mas se uma pessoa é treinada desde cedo a desligar o cérebro quando lida com certas afirmações está muito mais vulnerável. Mesmo que seja formada e informada.

Todos os pais deviam pensar nisto quando transmitem crenças injustificadas aos seus filhos. Pode não parecer nada demais ensinar a criança a acreditar que a hóstia se torna no corpo de um deus ou que o sacerdote merece respeito especial porque sim. Salvo raras excepções, crenças como essas são inofensivas. Mas não é inofensivo treinar alguém a aceitar crenças desta maneira, sem considerar os porquês. É isto que o torna vulnerável aos Mamadus. E Mamadus há muitos, com muitos nomes e profissões. Há Mamadus Alexandra Solnado, Cristina Candeias e Paulo Cardoso. Há Mamadus Jim Jones, David Koresh e Shoko Asahara. Há Mamadus Joseph Ratzinger, Ali Khamenei e Tenzin Gyatso. São muito diferentes, para todos os gostos e feitios, mas são todos Mamadus. São todos especialistas no negócio, pouco oculto, de explorar a credulidade dos outros.

1- Classificados Lisboa, Astrólogo – Grande Medium Vidente
2- Páginas Amarelas, Mestre Mamadu
3- Directório IOL, Professor Mamadu (em Lisboa).
4- Directório IOL, Professor Mamadu (no Porto).

Publicado também no Que Treta!

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