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  • 16 de Janeiro, 2009
  • Por Ricardo Alves
  • Religiões

Resposta a um ateu

O ateísmo não é nem uma igreja nem um projecto de uniformização social, e está bem assim. Portanto, não ambiciono discutir qual será «o único ateísmo lógico», ou como um ateu deve viver o seu ateísmo. Mas devo dizer que me espanta ver um ateu a considerar «cruzada ateísta» (e «patética») a circulação de algumas dezenas de autocarros e a publicação, em três anos, de duas dezenas de livros por Dawkins e mais alguns. Para não sair de Portugal, a ICAR tem espaços regulares na TV pública (formais e informais), canais de rádio, professores e capelães pagos pelo Estado, dezenas de revistas e jornais, e nunca dei conta de que o mesmo ateu considerasse tudo isso uma «cruzada católica». Mas enfim. «Cruzada» deve ser exprimir uma convicção minoritária sem subsídios do Estado.

Interessa-me rebater a tese de que as sociedades não podem subsistir sem religião, e que rapidamente encontrariam um substituto se esta desaparecesse.

Primeiro, convém saber do que falamos: a «religião» desempenha muitos papéis diferentes, e a importância relativa de cada um tem variado ao longo da história. A religião enquanto mundividência (o «relegere») caminha para a irrelevância em quase toda a Europa. Há países onde a maioria já é «sem religião» (exemplo clássico, a República checa). E não me parece que se verifique uma adesão em massa à astrologia ou à IURD. A religião enquanto «cola» social informal (o «religare») tem substitutos não religiosos (que me parecem quase todos preferíveis às religiões tradicionais, abraâmicas), dos clubes de xadrez aos clubes desportivos, das sociedades filarmónicas às sociedades científicas, passando por muitos outros espaços associativos não estatais. Será Policarpo preferível à colectividade de chinquilho? Eu acho que não.

Segundo, entre a ICAR e a IURD, a diferença essencial é apenas de número. Uma igreja é uma seita que teve sucesso. Os métodos de recrutamento são os mesmos, mas os primeiros metem-nos a mão na carteira (via Estado), e os segundos não. Além disso, são os primeiros que nos querem dizer como devemos viver, das leis sobre a IVG à concepção de ensino público. Não duvido que os segundos fariam o mesmo do que os primeiros se tivessem peso para tal (como já acontece no Brasil), mas centrar críticas nos pequenos é fácil demais e, isso sim, quase sempre contraproducente.

A religião desaparecerá ou não. O mais importante é que nos deixem viver e exprimir-nos em igualdade de circunstâncias.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

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