Loading

Mês: Agosto 2008

3 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Domingo de Verão (crónica)

Veio quente este primeiro domingo de Agosto com os corpos a aliviarem-se da roupa e dos preconceitos, mais receptivos às hormonas do que aos pios ensinamentos da Igreja.

As praias regurgitam de gente que, adorando o sol, procuram a sombra, divinizando a virtude se entregam ao vício, fazendo a apologia dos bons costumes se dão à relaxação, procurando nos corpos alheios o êxtase que o tacto, a visão e o paladar propiciam.

Não há conselhos pios, homilias devotas, jejuns ou penitências que refreiem a louca sofreguidão do amor, rolando por entre rochas através da areia, corpos fundidos num arrebatamento, línguas sequiosas em busca da transfusão de saliva que, em vez de os aquietar, excita, partindo em busca de outras descobertas e novos fluidos.

Andam os padres um ano inteiro a pregar a castidade, as delícias do Céu e os castigos de Deus e vêm as hormonas, como tsunami fortuito, a ofender a moral e os bons costumes. Ficam as sotainas a apanhar mofo com padres dentro, desertas as sacristias com a água benta a cultivar bactérias e as igrejas abandonadas ou como meros adereços para fotos de casamentos.

As religiões inventaram deuses avessos ao prazer, alérgicos ao sexo e à carne de porco, seres misóginos que desconheciam a psicologia humana e o êxtase dos sentidos. É por isso que cobrem de ridículo os seus padres a pregarem a moral para maiores de oitenta anos, enquanto nos cafés, esplanadas, jardins, campos e praias, corpos à solta partem à procura de outros, com mãos ágeis, olfacto atento, olhos vivos e paladar guloso percorrendo a geografia do prazer numa louca correria de quem sabe que é breve a vida e não se repete.     

3 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Bento 16 e a virgindade

«O Vaticano deu o primeiro passo para a beatificação da jovem espanhola de 22 anos assassinada em 1992 por Pedro Luis Gallego, que queria violá-la. Se a elevação aos altares acontecer, será a primeira mártir da era moderna, pela defesa da virgindade em nome da fé cristã».

 

Longe de mim acreditar que o actual Papa é um crente. É demasiado culto e inteligente para acreditar na virgindade de Maria, na infalibilidade papal e na transubstanciação da hóstia por acção dos sinais cabalísticos da praxe.

Este Papa é um gestor, um homem de negócios que conhece a clientela e que desistiu da mais sofisticada, para manter a mais primária e rudimentar. Em marketing escolhem-se os segmentos de mercado. Não se discute com um biólogo a capacidade reprodutiva do Espírito Santo nem com um obstetra a virgindade depois de um parto por via baixa.

Os milagres, cada vez mais frequentes e fúteis, não são o número para que se convidem cadáveres ou se aliciem crentes alfabetizados. B16 sabe que as canonizações rendem grossos cabedais ao Vaticano e atraem ouro, jóias e euros para as caixas de esmolas dos taumaturgos quer se trate de um torturador franquista, canonizado por lapso ou de uma descrente como Madre Teresa de Calcutá, desde que fosse cúmplice com o papa no ódio ao preservativo.

A virgindade é uma virtude que a ICAR resolveu estimular no seu santo ódio e nojo ao orgasmo e à sexualidade em geral. Esgotada a lista de franquistas destinados ao altar, é agora a vez de procurar novas minas de santos para manter o entusiasmo dos fiéis.

Marta Obregón foi assassinada numa tentativa de violação. Como a jovem era dada à oração, a violação e o assassínio não mereceram a atenção do Papa. Para ele só contou a heróica renúncia à alegada perda da virgindade. Mais uma santa. O deus do Papa serviu-se de um canalha para fazer uma santa. Com a ajuda de um embusteiro.

2 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

João Paulo II e o ateísmo

Creio que há uma dívida de gratidão dos ateus para com João Paulo II (JP2), dívida que o extinto polaco involuntariamente mereceu.

JP2 era um Papa que acreditava na existência de deus, na navegação celeste de anjos e virgens, suficientemente supersticioso para afiançar que os mortos obravam milagres.

Não passou pela cabeça do crédulo polaco que o ridículo e os escândalos faziam pior à Igreja do que as mentiras que pregava. Acreditar que a santinha de Balazar se alimentou de hóstias consagradas durante mais de uma década, sem comer nem beber e em anúria, seria motivo de interdição das funções, por falta de siso, a quem não tivesse a profissão de santo.

JP2 era o rural poliglota, casto, fiel à ICAR, protegido do Opus Dei e protector da CIA, que acreditou que o comunismo era obra do diabo. Só um rústico podia acreditar que os regimes ditatoriais de esquerda são obra do demo e os de direita fruto da vontade divina.

As suas viagens eram um espectáculo coreografado para atrair multidões e esconder o vazio da Igreja e a mentira de deus. No Vaticano era dos poucos que lia a Bíblia e que acreditava nas suas fábulas.

Foi graças aos espectáculos mediáticos e à crença de que deus existia que promoveu o seu próprio culto. Quanto aos milagres que rubricou e aos numerosos santos que criou, levou o ridículo aos cinco continentes, entusiasmou os crédulos e divertiu os ateus.

JP2 foi um produto do marketing, tão genuinamente convencido de que tinha uma missão divina que se chegou a acreditar que figurava num segredo de Fátima inventado para combater a República e prolongar o obscurantismo português.

Antigamente os santos eram poucos e os milagres fruto da tradição oral. Quando JP2 industrializou a criação de santos e passou a certificar milagres, vulgarizou as mentiras da ICAR e escarneceu os santos antigos que o tempo tinha consagrado.

Fez mais pelo ateísmo o papa polaco a rezar do que os investigadores a divulgarem a ciência.  

1 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

A Espanha e a ICAR

A Espanha, país onde nunca entrou a Reforma mas onde a Contra-Reforma assumiu as mais desvairadas formas de violência, mantém, ainda hoje, bispos maioritariamente reaccionários, nostálgicos do fascismo e dispostos a enfrentar o poder legal.

Curiosamente a Espanha católica com que sonham os bispos é mais anticlerical do que crente. A pungente nota eleitoral do episcopado, em 31 de Janeiro, pedindo aos eleitores para que votassem no partido que «defenda o casamento entre homem e mulher», isto é, no PP, saldou-se por uma derrota que reconduziu o PSOE ao poder.

Rouco Varela, frio cardeal de 71 anos que trocou o funeral do irmão mais velho por um encontro com o Papa, é o velho franquista e entusiasta do Opus Dei que destila ódio de estimação ao PSOE e um azedume pio perante a o processo de secularização espanhola.

O combate político nos jornais católicos, no púlpito e nas ruas de Madrid, em manifestações raivosas contra o PSOE, fizeram dele um dos maiores derrotados das últimas eleições legislativas espanholas.

No dia seguinte à derrota que o humilhou e que contribuiu para a progressiva laicização de Espanha, quando os dados eleitorais já eram irreversíveis, anunciou que rezava por Zapatero e, que «A Conferência Episcopal Espanhola reza para que o Senhor lhe conceda a sua luz e a sua força no desempenho das responsabilidades de que o povo o incumbe, ao serviço da paz, da justiça, da liberdade e do bem comum dos cidadãos».

Quanto às orações bem sabe o rancoroso cardeal da sua ineficácia e quanto à justiça, liberdade e bem comum, respondeu-lhe o eleitorado.

No País dos reis católicos, a igreja que «evangelizou» os índios da América do Sul, que torturou hereges, expulsou judeus e apoiou o assassínio metódico dos republicanos pelos franquistas, é a Igreja que vive da generosidade do Governo, das largas verbas que este lhe concede, com a advertência do PSOE de que «os privilégios não são eternos».

1 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Paraguai – O Vaticano ajoelhou-se

Em decisão inédita, o papa Bento 16 concedeu ao presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, a “perda do estado clerical”, o que permitirá ao ex-bispo assumir o poder, no próximo dia 15, sem violar as leis do Vaticano.

Segundo comunicado lido pelo núncio apostólico no Paraguai, Orlando Antonini, a medida foi tomada “pelo bem do país”. “É a primeira vez que isso é concedido [a um bispo]. Foi aceite porque o povo o escolheu e sua condição clerical é incompatível com a de presidente”, disse Antonini, cuja função corresponde à de embaixador do Vaticano.