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Mês: Março 2008

26 de Março, 2008 Ricardo Alves

71% dos franceses querem manter a lei de separação tal como está

Segundo uma sondagem recente, 71% dos franceses querem manter a lei de separação entre a República e as igrejas (de 1905), tal como está. E 77% dizem que «as autoridades religiosas não devem tomar posição publicamente sobre as questões de sociedade». O que prova que a laicidade não é um regime imposto por uma minoria a uma sociedade renitente. Antes pelo contrário.

26 de Março, 2008 Carlos Esperança

CITAÇÃO

PALAVRAS DE RENAN NO SEU LEITO DE MORTE:  «Guardem-me contra o clericalismo, que eu vou entrar no período em que a Igreja costuma apoderar-se, traiçoeiramente, do enfraquecido espírito dos moribundos para os desonrar, arrancando-lhes, pela violência, retratações falsas ou inconscientes.»  Palavras que perfilho também, acrescen­tando:

«Se ainda em vida, ou depois de morto, aparecerem palavras minhas que vão de en­contro às doutrinas que tenho defendido nos meus livros -ou são inventadas por agentes de Roma, ou ditas quando o espírito se haja eclipsado para entrar em demência.»

Agosto de 1955.  TOMÁS DA FONSECA

 Nota: Junto o meu apelo aos de Renan e Tomás da Fonseca – Carlos Esperança

24 de Março, 2008 Mariana de Oliveira

Filme anti-Islão suspenso

Foi anunciada, no passado dia 23, a suspensão do site em que o deputado holandês de extrema-direita, Geert Wilders, ia divulgar o seu filme anti-islâmico.

Não morro de amores pelo islâmismo, assim como não morro de amores por qualquer outra religião. No entanto, reconheço que a liberdade de culto e de religião são valores fundamentais intrínsecos a qualquer Estado de Direito Democrático e, como tal, devem ser defendidos por todos. Ora, apesar de alguns adeptos do islamismo não serem, como todos sabemos, defensores da tolerância e da liberdade religiosa, não podemos, como sociedade que se quer livre e esclarecida, dar cobertura a ideias discriminatórias, sob pena de cairmos nos mesmos erros que criticamos.

A liberdade de que gozamos implica tolerância e respeito pelo próximo. Obviamente que não implica que não discutamos nem critiquemos as posições contrárias às nossas. É essencial que tratemos os nossos opositores com todo o respeito e tolerância com que queremos ser tratados. Isto é uma regra elementar da boa convivência social.

Mensagens de ódio e de preconceito – como as veiculadas pelo vídeo acima mencionado – apenas tornam qualquer troca de ideias infrutífera e pioram o problema da compatibilização da religião (islâmica, neste caso) com a sociedade.

24 de Março, 2008 Carlos Esperança

O Governo, os supermercados e a ICAR

O Governo colocou na agenda a questão da abertura do comércio aos domingos e feriados à tarde, depois do legítimo encerramento, pela ASAE, de seis hipermercados na última Sexta-Feira mais ou menos santa.

O problema está na lei que, para agradar à ICAR, mantém uma interdição anacrónica e beata.

A este respeito, em 25 de Julho de 2001, tornei público o seguinte texto:

«Se o dogma é um insulto à inteligência mas uma vitória para a fé, se agride a razão mas purifica a alma, se fecha os caminhos difíceis da ciência mas abre as largas avenidas da salvação, como é possível haver quem o enjeite? – O Governo português não.

Como diria o Eça, estava o Ministério, moderadamente jejuado, razoavelmente confessado e melhor comungado quando piedosamente se pronunciou sobre o horário do comércio, não se dissesse que o liberalismo económico encontrara em Portugal terreno fértil. Privatizaram-se as seguradoras e os bancos, é verdade; condescendeu-se com a liberalização dos combustíveis e da energia; as comunicações e os cimentos entregaram-se aos privados, mas o Estado chamou a si o horário das mercearias. Nos mares, nas estradas e nos ares circula a iniciativa privada mas respeita-se, na compra do sabão amarelo, o horário das repartições. Não tem horário a gasolina mas têm hora marcada a posta de pescada e o quilo de feijão carrapato.

Andou bem o Governo em proibir às grandes superfícies a abertura de portas ao Domingo. Preferiu a santa missa à venda dos legumes; dificultou a aquisição de frescos mas facilitou a divulgação das homilias; alguns bacalhaus ficaram por vender mas promoveu-se a eucaristia, com hóstias sem código de barras, nem prazo de validade, guardadas sem rede de frio nem inspecção sanitária. Folgam as caixas registadoras nas tardes de Domingo mas agitam-se as bandejas na missa do meio-dia.

Contrariamente ao que eu supunha, não houve, porém, festa nas sacristias, não rejubilou o patriarcado, não aconteceu um lausperene. Nem uma missa de acção de graças. Nem uma noveninha. Provavelmente algum padre-nosso rezado na clandestinidade ou uma ave-maria balbuciada por uma beata enquanto resistia à tentação da carne e ao assédio do marido. A própria Conferência Episcopal desistiu da pastoral da mercearia».

24 de Março, 2008 Ricardo Alves

Celebrar a violação do segundo princípio da termodinâmica

O mito central do cristianismo é a «ressurreição». Cristãos a sério como os do leste da Europa têm na «Páscoa» a festa central do seu calendário. Os católicos, com a sua pitoresca mistura de paganismo, cristianismo e consumismo, criaram uma religião pseudo-cristã que tem no «Natal» a sua festa mais importante.

É a suposta violação de uma das mais fundamentais leis do universo que os cristãos celebram nesta altura do ano. Se não fosse uma violação de uma lei evidente até mesmo para os pastores semitas de há dois mil anos, não valeria a pena celebrá-la. Não se funda uma religião autoritária a partir de factos evidentes como a queda de uma pedra abandonada no ar, a água correr para a foz, ou ser impossível restaurar um copo partido em mil pedaços. Os chamados «milagres» são quase todos violações grosseiras do funcionamento conhecido da natureza, e é por isso que têm valor e que acreditar neles dá estatuto dentro de uma comunidade religiosa.

Que tratemos com respeito comunidades que exaltam a crença em perfeitos disparates não abona a favor da nossa sociedade.

E como se não bastasse celebrarem uma completa impossibilidade, os nossos vizinhos católicos ainda por cima acrescentaram-lhe uns detalhes grotescos com sangue, cruzes, espinhos e dor, muita dor. Sinceramente, não entendo como se pode celebrar a chegada da Primavera com cerimónias que recordam a dor, ostentam a dor, homenageiam a dor, se deleitam com a dor. Celebrar a Primavera deveria convidar aos primeiros passeios pelo campo ou pela praia, em boa companhia e depois de bem servido de mesa.

No fundo, as nozes com chocolate são uma escolha mais racional do que a crucificação. E não enganam ninguém.

23 de Março, 2008 Ricardo Alves

Vaticano confirma: Bin Laden foi injusto

Conforme eu já afirmara, o repúdio do Vaticano pela liberdade de expressão sempre foi inquebrantável, e portanto as acusações de Bin Laden foram injustas. É a própria sala de imprensa do Vaticano quem agora recorda que o Papa esteve do lado do islamismo durante a crise dos cartunes:

  • «O Papa e o Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso censuraram a campanha satírica contra o Islão em mais de uma ocasião» (Zenit).
23 de Março, 2008 Carlos Esperança

Hoje é dia de Páscoa cá no burgo

A Páscoa é pelos motivos que um homem quiser. Os judeus celebram a saída do Egipto e os cristãos comemoram a ressurreição de Cristo. Com o tempo, perdem-se a memória do plágio e os motivos da festa.

Hoje é dia Páscoa – dia em que JC ressuscitou dos mortos, com quem esteve a estagiar. Depois andou por aí, como alguns políticos, visitou quem quis e foi visto pelos que acreditaram ou, melhor, pelos que acreditam que houve quem o visse.

Ontem, ainda o ícone da lenda cristã fazia de morto, já os pantagruélicos festins tinham lugar para gáudio da indústria da restauração. Hoje, com o número da ressurreição feito, está tudo fechado. Quis um sítio para tomar um café e não encontrei quem mo servisse.

Despregado do sinal mais onde se finou, JC estagiou num túmulo, como toda a gente, e, para animação do negócio pio a que deu origem, subiu ao Céu e sentou-se à mão direita de deus-pai, um troglodita de mau feitio cuja biografia vem, em toda a sua crueza, num livro pouco recomendável e de origem duvidosa – o Antigo Testamento.

Para mim, que há muito deixei de acreditar nas pias fantasias e elucubrações católicas, é-me indiferente que JC se tenha dedicado à carpintaria, para continuar o negócio de família, ou se tenha afeiçoado à pregação e aos milagres, ao tempo o mais promissor segmento do sector terciário de uma economia rudimentar.

O que me dói, independentemente dos laivos politeístas da ICAR, com um deus-pai, o deus-filho, a mãe do filho, a pomba e muitos outros filhos da mãe cujos cadáveres eleva à condição de santos, o que me dói – dizia –, é não ter um sítio para tomar café.

Se a Páscoa da Ressurreição servisse para fazer o número de um morto que se cansa da posição, dá uns passeios e emigra para o Céu, mas não fechassem os Cafés, eu não estaria aqui a amaldiçoar a beata gazeta dos industriais da restauração.

Aprecio mais um bom café do que uma ressurreição bem feita. 

22 de Março, 2008 Carlos Esperança

Origens europeias

Seria estultícia negar a influência das religiões e guerras pias que dilaceraram a Europa e que, tal como a cultura helénica e o direito romano, a moldaram. Seria, no entanto, perigoso esquecer que foi a anemia da religião que tornou possível a liberdade, que foi a perda do poder temporal da Igreja católica e da sua influência política que tornaram possível o espaço de liberdade em que, pesem embora as desigualdades e injustiças sociais que ainda persistem, se transformou a Europa.

A violência sagrada foi sempre filha da fé e dos interesses que à sua volta gravitam. Da Irlanda do Norte ao Chipre e à ex-Jugoslávia quantas mortes se devem aos desvarios da fé e à competição pelo negócio das almas?

Persistir nas referências religiosas da Europa e na sua consagração constitucional não é apenas redundante, é uma provocação às religiões excluídas, um braço de ferro com a laicidade e um desafio à secularização que permitiu a exclusão religiosa dos motivos de confronto no espaço civilizacional europeu.

Há uma conquista civilizacional de que todos beneficiamos, crentes, ateus e agnósticos, o carácter laico do Estado e a lógica separação das Igrejas. O proselitismo incorrigível dos crentes é um perigo que espreita das madraças de cada seita, dos púlpitos de todas as religiões.

Quem nos defende da obsessão que alguns sentem de salvar todos os outros? Por que motivo não se contentam com a salvação própria deixando na paz das perpétuas chamas os que se desinteressam da salvação da alma, apesar dos mimos e das ameaças?