Liberdade para todos
N´O Tempo das Cerejas, Vítor Dias escandaliza-se com o reconhecimento estatal da Igreja da Cientologia.
Não percebo porquê. Tudo aquilo que descreve (aliciamento insistente, corte com os laços familiares, controlo da correspondência privada, redes de influência mundial, crenças extravagantes) é comum a outras organizações religiosas mais respeitadas, como o Islão, os mórmones ou a ICAR. É evidente que haverá diferenças de grau, entre todas estas seitas, quanto aos aspectos referidos, mas não há diferença de natureza. Os numerários do Opus Dei também têm a sua correspondência controlada. Jesus Cristo defendeu a ruptura dos laços familiares. E a crença de que Maomé falou com um «anjo» não é melhor do que a de que a ideia cientologista de que houve uma guerra galáctica há milhões de anos.
Ao contrário de Vítor Dias, não me preocupa particularmente que a Comissão de Liberdade Religiosa tenha dado parecer positivo ao reconhecimento da Igreja da Cientologia (se o deu). O problema é o Estado poder conferir esse reconhecimento, distinguindo as comunidades religiosas umas das outras, hierarquizando-as, e que o faça através de uma Comissão onde se sentam representantes de outras comunidades religiosas.
No meu entender, o melhor seria que o Estado não reconhecesse comunidade religiosa alguma. Existe o direito de associação e o direito de manifestação. Quem quer partilhar a sua «vida espiritual» com outros, pode portanto fazê-lo, dentro do quadro legal, sem necessidade de «reconhecimento» estatal da «especificidade» religiosa. E o Estado não pode negar aos cidadãos a liberdade de seguirem uma dada religião, nem pronunciar-se sobre a validade das crenças religiosas.
Ou será que a liberdade é só para os católicos e islâmicos, mas não para os cientologistas?
[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]