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Dentro da República Islâmica do Irão


O jornalista Rageh Omaar fez uma interessantíssima incursão pelas vivências iranianas na cidade de Teerão, excluindo qualquer contorno político, simplesmente explorando a sociedade através de comuns cidadãos no documentário da BBC “Bem Vindos a Teerão“. Este documentário é uma excelente forma de olhar para a teocracia islâmica do lado de dentro, conhecendo o quotidiano dos cidadãos, uma interessante forma de conhecer valores e culturas diferentes que podem servir muitas vezes como comparação a contextos diferentes.

Entre as muitas histórias de vida incríveis que por lá se contavam, e que demonstram que a vivência na teocracia islâmica não é tão má como se conta, para isso basta seguir os valores islâmicos, como em qualquer outro sistema fascista, regras cumpridas e a vida corre às mil maravilhas, surgem pessoas sorridentes, humoradas, pacíficas e com quotidianos de vida extremamente normais independentemente do prisma de valores com que se olhe.

Rageh Omaar durante a sua estadia em Teerão decide publicar um artigo numa revista iraniana. Algo interessante pois sabia à partida que a censura existe, que os chefes de redacção censuram e adaptam os artigos antes da sua publicação, ou seja, a censura explicita, longe da censura invisível de muitos países ocidentais.

Neste processo consegue-se perceber facilmente como funciona a censura, sem obscurantismos, nem nevoeiros cerrados, tudo incrivelmente transparente, respeito pelas leis islâmicas e tudo funciona na perfeição, desrespeito e surge a moldagem de conteúdos, a transformação de negações em afirmações, no fim diz a mesma coisa por outras palavras, só a percepção do leitor irá mudar o contexto pela envolvência social e valores por ela emanados.

Na moldagem do artigo de Rageh Omaar pouca coisa muda, o analista do artigo procede à mudança de simples coisas de forma mecanizada, algo que identifica como adaptação aos contextos e valores sociais islâmicos, dos quais se salienta as seguintes alterações: mudança de “pessoas que usam máscaras” para “pessoas com várias camadas, indivíduos com múltiplas posturas culturais“; alteração da frase “As mulheres são proibidas de conduzir motas.” para “Só os homens conduzem motas.“; reformulação da frase “Existem muitas pessoas descontentes com o governo.” para “Existem muitas pessoas preocupadas com os problemas sociais.“.

Também na música as coisas se processam de formas semelhantes, os músicos não falam abertamente de censura, apenas identificam que se orientam pelos valores culturais islâmicos, fornecendo exemplos típicos, a não inclusão de temas explicitamente sexuais. Interessante a alusão de um agente musical a uma banda feminina, à qual Rageh Omaar mostra perplexidade perguntando se isso não seria proibido, onde a resposta não podia ser mais interessante, “Muitas pessoas pensam que temos menos margem de manobra do que a que realmente temos.“.

Para além da demência teocrática islâmica existem pessoas, e com vivências muito interessantes e harmoniosas, longe das ideias nucleares e dos barbarismos teocráticos, onde a mais expressiva diferença do ocidente é a relativa honestidade, a censura visível e a discrepância entre a população e as ideologias fascistas religiosas do clero e do governo. Muitos pensam que se está a anos-luz de determinadas pessoas, mas muitas vezes existem pontos de relativa proximidade, tomando como ponto de partida a censura literária por motivos islâmicos no Irão podemos identificar um exemplo idêntico em Portugal por motivos católicos, a censura ao “Evangelho segundo Jesus Cristo” de José Saramago em 1992, países diferentes, culturas diferentes, religiões diferentes, mas algumas posturas iguais, “A apregoada beleza literária, a existir nesta obra, longe de atenuante e muito menos dirimente, constitui circunstância agravante da culpabilidade do réu, seu autor“, disse o arcebispo de Braga, na linha de pensamento igual à do clero islâmico no Irão.

Outro pormenor interessante da cultura islâmica iraniana é a música popular, incrivelmente idêntica à música “pimba” portuguesa. O “humor negro” também por lá acontece, um lutador de wrestling acabou a sua carreira com um deslocamento do ombro enquanto segurava um andor numa procissão religiosa.

BBC: Welcome to Tehran – a journey by Rageh Omaar
Também publicado em LiVerdades

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