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Mês: Setembro 2007

14 de Setembro, 2007 Carlos Esperança

A ICAR e a cultura

A Igreja católica odeia a cultura como só Maomé odeia o toucinho. O Índex Librorum Prohibitorum vigorou desde 1559, elaborado pelo Santo Ofício a pedido de Paulo IV, até 1966, altura em que Paulo VI o aboliu por se ter tornado inócuo ou contraproducente.

Entre os livros que faziam perigar a alma e arriscar a fogueira, encontravam-se o D. Quixote e os Miseráveis. Talvez os Papas julgassem que o livro de Vítor Hugo fosse sobre o papado!

Quem conhece a História da Igreja católica, desde que se tornou o braço eclesiástico do Império Romano, com Constantino, até se tornar um potentado económico graças à burla da «Doação de Constantino» (piedosa falsificação ordenada por Estêvão II) e às pilhagens feitas aos hereges e aos judeus, não pode deixar de sorrir com a defesa da moral pelo Papa – um excêntrico que exibe colorida e cintilante roupa feminina.

À ICAR deve-se a invenção das bruxas e a perfeição cruel com que as exterminava. As acusações eram uma extensão do sadismo e das fantasias sexuais dos clérigos. As confissões de cópulas com o diabo mostram a crueldade com que eram torturadas.

A igreja católica começou cedo a arte do embuste. Alexandre I (105-115) foi o inventor da água benta, do pão para a consagração e do vinho no cálice. Os milagres de hoje são uma intrujice benigna comparada com a criatividade de papas tão perversos e lascivos como João VIII, Adriano III ou Alexandre VI.

Comparado com os papas medievais e os inquisidores, até Pio IX foi uma pessoa de bem. E se pensarmos que o Vaticano já foi um bordel e antro de assassinatos, simonia e intrigas, podemos dizer que hoje é quase um Estado de direito.

Perante os dominicanos, onde se recrutaram os mais crus inquisidores, podemos dizer que o Opus Dei é quase uma instituição contemplativa e até Santo Escrivá parece justo, comparado com os evangelizadores da América do Sul.

14 de Setembro, 2007 Ricardo Silvestre

Novo Ateísmo: o (novo) parente snob to Ateísmo tradicional?

Em Novembro de 2006, Wired Magazine firmava o conceito de «Novo Ateísmo». Numa peça onde se juntavam três dos «campeões dessa nova vaga», Prof. Dawkins, Prof. Dennet e (brevemente Prof.) Sam Harris, o jornalista Gary Wolf concluía que, «ser um novo ateísta é como ser um profeta que tenta mexer com a sociedade, mostrando uma descrença justificada, criando um consenso activo, com objectivo de atingir as pessoas».

Concordando ou não com a crítica velada que os Novos Ateístas podem querer estar a lutar batalhas messiânicas (com a subjacente ironia por se usar termos religiosos), deixo aqui a opinião de um Novo Ateísta em Portugal.

Como racionalista e cientista que sou, incomoda-me que em Portugal se continue a recorrer a curandeiros e exorcistas. Que se procure o padre da paróquia para aconselhamento emocional ou psicológico. Que se tenha bispos a tentar influenciar a politica dos governos em questões de saúde. Que a EMRC seja paga pelos meus impostos para ensinar fraudes às nossas crianças, etc, etc. Vivemos numa era de conhecimento, de ciência, de progresso racional que levou centenas de anos a conquistar (já para não falar em Portugal o atraso por causa de uma ditadura, apoiada exactamente pela Igreja Católica).

O Novo Ateísmo quer-se como um espaço de abordagem mais técnico, mais racional, mais científico. Mas para quem deve ser direccionado este discurso? Na minha opinião, é muito difícil convencer as pessoas que recorrem nos dias de hoje a agentes de superstição do que o que estão a fazer é irracional (nem elas querem participar em tais conversas).

Não acho que valha a pena colocar todas as energias nessa batalha. Acho que a melhor estratégia é de chegar a um segmento mais jovem, mais esclarecido, mais entendedor, promovendo o entendimento do mundo natural, a curiosidade científica, a capacidade de rejeitar posições dogmáticas. E assim, lançar as sementes que vão permitir um maior afastamento do preconceito e irracionalidade por parte dessa geração e das seguintes. Abra-se o debate.

Esta é uma opinião pessoal, que não compromete, nem reflecte a posição do Diário Ateísta.

13 de Setembro, 2007 Ricardo Alves

Capelanias hospitalares: o que está em causa

A Associação República e Laicidade produziu recentemente um comunicado e dois estudos auxiliares que podem ajudar a dissipar alguma da confusa neblina que a ICAR tem produzido em torno da questão da assistência espiritual nos hospitais.

O que está em causa? Principalmente três questões: as modalidades de acesso aos hospitais de quem presta assistência religiosa ou espiritual, a continuidade da remuneração de quem actualmente presta essa assistência com o estatuto de funcionários públicos (são, exclusivamente, sacerdotes católicos), e a gestão dos espaços de recolhimento espiritual nos hospitais públicos.

Na primeira questão, a situação actual (que resulta de uma lei de 1980), permite que os capelães hospitalares, que são todos católicos, abordem qualquer pessoa que se encontre internada num hospital. A ICAR tem protestado contra uma alegada intenção do governo de tornar a assistência religiosa dependente de solicitação do doente. Acontece que o princípio correcto é justamente o de que só pode ser oferecida assistência religiosa a quem a solicitar expressamente. Se eu estou numa cama de hospital, fragilizado e vulnerável, não quero ser incomodado por padres ou outros sacerdotes. E quem é crente não católico tem o direito de requerer assistência religiosa sem ter o seu pedido «filtrado» por um sacerdote católico.

Em segundo lugar, refira-se que apesar da insistência da ICAR na questão do acesso, aquilo que sem dúvida mais lhes poderá doer será uma diminuição no número de sacerdotes salariados pelo Estado para funções hospitalares. Actualmente, serão cento e sessenta e cinco católicos (zero das outras religiões), o que significa para a República uma despesa anual de cerca de cinco milhões de euros (ou um milhão de contos, em moeda antiga) num momento em que o governo se empenha em diminuir a despesa do Estado. Sinceramente, não percebo por que deve um Estado laico remunerar sacerdotes para fins espirituais. Os crentes podem perfeitamente organizar-se para o fazer.

Finalmente, verifica-se que muitos espaços que são construídos em hospitais públicos para o recolhimento espiritual de todos os utentes são apossados pela ICAR, que os consagra como capelas católicas e seguidamente monopoliza a sua utilização. Existe mesmo o exemplo de um hospital de Lisboa que o capelão quer transformar em santuário. É desejável que estes abusos terminem, e que esses espaços sejam suficientemente neutros e flexíveis para qualquer opção espiritual.

Refira-se ainda que nada na Concordata em vigor (ou sequer na de 1940) obriga à situação actual, com uma lei exclusivamente para católicos (o Decreto-Lei nº 58/80), o que é sem dúvida inconstitucional. O governo deve aplicar a Constituição da República e não esta ou aquela Concordata.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]
12 de Setembro, 2007 Carlos Esperança

Bin Laden

Sempre que aparece, Bin Laden provoca uma onda de pânico em parte da humanidade enquanto outra exulta e anseia por se colocar ao seu serviço, por dar a vida pelo virtuoso e pio muçulmano que desafia os EUA e os países democráticos.

Há naquele biltre, misto de Urbano II e de Hitler, a demência e a maldade de ambos e o mesmo poder de sedução que o converte em condutor de massas, no Messias que os crentes aguardam, no profeta em que acreditam as multidões famintas, humilhadas e desesperadas, vítimas de uma civilização falhada e das teocracias corruptas.

No entanto o místico assassino dirige uma cruzada contra os infiéis – todos os que não lêem o Corão a seu jeito -, com a mesma fria violência com que o Papa Inocêncio III mandou massacrar os cátaros. E não lhe faltará determinação para, à semelhança de Arnaldo Amalarico, em Béziers, quando houver dúvidas sobre quem é ou não é infiel, decidir: «Matai-os a todos. Depois, no Céu, Deus distingui-los-á».

Não tenhamos ilusões. Bin Laden converteu-se num ícone que a rua muçulmana adora. Ele não é apenas o estratego que conduz uma guerra gloriosa, é o justiceiro que vai derrotar os maus e conduzir os seus devotos ao paraíso, aos rios de mel e à volúpia das 70 virgens cansadas de esperar.

O frio e cínico devoto é hoje um fenómeno de massas, o ideólogo de milhões de crentes, o mártir que fanatiza e seduz franjas de todos os estratos sociais, em todas as latitudes, sem exclusão de raças. Ele representa uma ideologia planetária, é o apóstolo do único Deus verdadeiro que um rude pastor de camelos importou para regiões tribais com erros de tradução e hábitos de brutalidade.

O fascismo islâmico é uma mancha de óleo que alastra em todas as direcções. O Corão é o Mein Kampf da horda de assassinos beatos e Bin Laden o seu Führer.

12 de Setembro, 2007 Ricardo Silvestre

«Velho» conselho.

Num comentário ao meu post relativo às declarações de Ratzinger sobre a teoria da evolução, Bernardo Motta do blogue «Espectadores» (http://espectadores.blogspot.com/) aconselha-me a que «Leia, por favor, o que o São Tomás diz sobre a simplicidade de Deus» (para mais detalhes ver a secção de comentários do post acima referido).

Uma coisa que nunca me deixa de surpreender é este estilo de lógica. «Para saber mais sobre deus, por favor consulte um teólogo». À, sim? E porquê? E porque não perguntar a um taxista? Ou a um cozinheiro? Ou a um engraxador? Quais são os factos indisputáveis, a ciência sólida, a metodologia concreta que São Tomas, ou Teresa de Avila, ou Blaise Pascal detêm para demonstrar deus (já para não falar quando se metem a falar de cosmologia, ou a biologia, ou de geologia)? A leitura da Bíblia? Uma reflexão profunda? As vozes dentro da sua cabeça? Qual a diferença entre um teólogo e um calceteiro?

Por favor, que os teólogos apresentem as suas provas sobre deus para uma revisão técnica e imparcial, e depois então, presto atenção a este estilo de sugestão.

12 de Setembro, 2007 Ricardo Alves

«Dalai Lama»: um ex-ditador

O senhor Kenzin Gyatso (conhecido por «Dalai Lama») estará em Lisboa de hoje até domingo. É apresentado simultaneamente como o principal representante de um país invadido e oprimido pela ditadura chinesa, e como um líder religioso. É, desde logo, lamentável que exista essa confusão: seria preferível que não se confundisse a promoção dos direitos fundamentais dos tibetanos com a propaganda de uma opção espiritual. Mas é, portanto, da maior conveniência recordar o Tibete de que ele foi o monarca absoluto: uma teocracia feudal, em que ele era simultaneamente líder político e religioso, onde os mosteiros possuíam a quase totalidade da terra, assim como toda a autoridade política, judicial e policial, a maioria dos camponeses eram mantidos em servidão (senão mesmo em escravatura), o rapto de crianças pelas ordens religiosas era considerado normal, e os castigos corporais (amputação de mãos, furar olhos, chibatadas) eram a forma mais corrente de administrar «justiça». O Tibete governado pelo ditador Kenzin Gyatso era, portanto, uma teocracia opressiva e miserável. O Tibete ocupado pela China, contudo, sofreu um genocídio criminoso (morreram, provavelmente, centenas de milhares de pessoas), e ainda hoje existem limitações inaceitáveis à liberdade de religião (mesmo se os maiores rigores do ateísmo de Estado já foram, felizmente, abandonados). A administração dos mosteiros, assim como a admissão de monges e freiras, é hoje controlada pelo Estado chinês, e muitos religiosos que desafiam este totalitarismo estatal são presos e torturados. A doutrinação dos recalcitrantes é sistemática e compulsiva. Infelizmente, nada disso é diferente do que se passa noutras regiões da China. E a condenação da ocupação chinesa não desculpa a «romantização» do regime teocrático que o senhor Kenzin Gyatso liderou no Tibete.

Nota final: a vida não é só desgraças, e existe o ridículo da religião budista para nos animar. No Público de hoje, um senhor chamado Stewart Walters garante-nos que a «estratégia» chinesa de «controlar a próxima reencarnação do Dalai Lama» estará condenada ao «fracasso». Porquê? Sentem-se bem nas cadeiras antes de ler: «o Dalai Lama já disse claramente em várias ocasiões que, se a situação no Tibete se mantiver, a sua reencarnação terá lugar fora do Tibete e longe do controlo das autoridades chinesas». Pronto, já podem rir.
12 de Setembro, 2007 Ricardo Silvestre

Intromissões

O lider de 1.1 bilião de pessoas diz que o debate sobre criacionismo e evolução é «absurdo», uma vez que «evolução pode coexistir com fé». Mais, a mente iluminada de Ratzinger acha que «evolução parece real» mas que não explica «de onde vêm todas as coisas» (http://www.msnbc.msn.com/id/19956961/)

Para além do ridículo de ter um fantasista a falar de ciência, esta tentativa de aproximação das cúpulas decisórias do Vaticano à disciplina de biologia só mostra a arrogância e o despeite daquele que é um dos agentes de entrave ao progresso científico.

O que o papa Benedict está a fazer é, explicar a pessoas como Richard Dawkins ou Edward Larson, «vocês os cientistas podem perceber muito sobre evolução, fosseis, ADN, progressão orgânica, fisiologia animal, mas a verdade é que somos nós que temos a explicação para a origem das coisas. Vocês até podem dar um cenário quase real, mas sem a nossa contribuição, a evolução não pode ser totalmente entendida».

Para além do óbvio, ou seja, a religião não tem qualquer autoridade para estar a emitir tais dilates, esta tentativa de conciliação com o método científico é leviana e prejudicial para a ciência. É como dizer a um estudante de biologia,«não se esforce para encontrar o princípio das coisas, assuma apenas que houve uma força superior que as criou».

O que é preocupante, é ver como a Igreja Católica se esforça para comer da mesma gamela que os Cristãos Americanos, e começa agora a tentar também minar o avanço cientifico com apelos à ignorância, disfarçados de concordatas de complemento.

11 de Setembro, 2007 Carlos Esperança

Marrocos – Eleições legislativas

A agenda mediática portuguesa ignorou praticamente as eleições em Marrocos cuja política é relevante para a Europa e de grande interesse económico para Portugal.

Em monarquias absolutas as eleições não passam de imitação grosseira do acto cívico que as democracias repetem regularmente, pelo que a abstenção de 63% do eleitorado encontra aí uma das suas justificações. A única surpresa eleitoral de Marrocos foi a vitória relativa do partido conservador e nacionalista (Istiqlal), fiel à monarquia alauita.

Não há democracias onde a cidadania dependa do poder discricionário de um monarca ou da violência tribal das teocracias. Em Marrocos o rei pretende conciliar o seu poder absoluto e a liderança religiosa com a abertura política –, equação difícil de resolver.

Marrocos está aqui ao pé de Portugal e o que aí se passa não é indiferente à Europa e, sobretudo, à Península Ibérica com democracias recentes e debilmente consolidadas, afirmando-se graças à protecção da União Europeia que dissuade os nostálgicos de Franco e Salazar.

Os países do Magreb abastecem de mão-de-obra e rejuvenescem a população europeia, mas, as alterações étnicas e culturais demasiado rápidas que induzem, são um elemento social perturbador e fonte de medos que recentes atentados terroristas islâmicos, embora frustrados, vieram aumentar.

Se Marrocos e Argélia se transformarem em democracias serão a retaguarda protectora do sul da Europa. Caso contrário, convertem-se na vanguarda do terrorismo islâmico, em santuário da al-Qaeda e numa ameaça permanente para novas tragédias fomentadas pelo proselitismo islâmico.

A Europa, que sofreu sangrentas disputas religiosas, que a dilaceraram, está a facilitar o poder religioso em vez de aprofundar a laicidade que a tem poupado à violência dos que julgam ganhar o Paraíso convertendo os outros à sua fé.

É mau confundir a liberdade religiosa, que deve ser defendida, com a mistura do Estado e das Igrejas, que deve ser combatida.

Resultados eleitorais: RTP