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Mês: Março 2007

3 de Março, 2007 jvasco

Ciência e Religião.

O professor Dom Mário Neto volta a contribuir para este blog, após o texto que aqui publicou anonimamente Introdução à Blinologia. No texto que se segue, Dom Mário Neto aprofunda alguns aspectos da Blinologia e disserta sobre o aparente conflito entre a ciência e o revelatum Blínico.

A filosofia natural e o estudo do Sagrado foram inseparáveis durante quase toda a história da humanidade. O conhecimento prático da natureza auxiliava o ritual religioso, desde o cálculo do calendário e dos dias de celebração à construção dos templos. E apesar da filosofia especulativa apresentar algumas hipóteses contrárias ao cânon religioso, até recentemente não eram suportadas por evidências concretas, pelo que os doutos blinólogos tinham liberdade de escolher as doutrinas filosóficas de acordo com as Escrituras. O mérito de filósofos como Platão, Epicuro, Aristóteles ou São Jacinto da Carrasqueira era medido pela concordância com a Palavra dos Blin, ou mesmo com a Frase e o Parágrafo.

No período áureo da escolástica blínica, esta visão de uma relação intima entre Natureza e Escritura levou mesmo à formulação duma noção basilar da blinologia: «A verdade não contradiz a verdade». Alguns críticos acusam-na de ser trivial e inútil, mas esta ideia rapidamente se espalhou pela cultura Europeia, sendo até adoptada por outra religião em voga nessa altura. E, no estudo do Sagrado, muitas vezes o que parece óbvio é profundamente misterioso, como atestam as famosas palavras do imperador Jin Tai aos missionários: «Se essa bolacha é Deus eu sou o rei da China».

Mas nos últimos séculos a experiência prática gradualmente se fundiu com a filosofia especulativa, gerando o que conhecemos hoje como ciência, o que levantou problemas à ideia de uma Revelação única de todos os aspectos da Criação. O relato da origem do mundo na Blínia Sagrada, «No início os Blin criaram a papa de aveia e a Terra», era interpretado literalmente, e a cosmologia blínica descrevia a Terra como flutuando num imenso mar de papa de aveia. Mas, no século XII, Barnabé da Eritreia relatou experiências, com vários tipos de rocha e receitas de papa, que demonstravam a impossibilidade física de tal interpretação. Foi executado em 1198 por heresia, e o Barnabismo foi perseguido com alguma violência, mas a Igreja Blínica sempre foi célere em admitir os seus erros. Mal passados oito séculos e Barnabé foi perdoado e, em parte por estar extinto mas em parte pelo progresso doutrinal da Igreja, o Barnabismo já não é um culto perseguido.

O trabalho de grandes cientistas, de Barnabé a Heisenberg e Einstein, mostrou à Igreja Blínica que temos que considerar verdades a níveis diferentes, se bem que a verdade nunca contradiga a verdade, mesmo que se contradigam. Parte do revelatum blínico está contido no universo em si. Treze mil e quinhentos milhões de anos, incontáveis estrelas e planetas, uma imensidão inimaginável de processos todos organizados de acordo com princípios regulares. Sem ambiguidades, sem margem para interpretações subjectivas, e onde tudo é desvendado objectivamente, sem considerar credo, raça, ou cultura. A compreensão deste universo duplicou a esperança média de vida, permite-nos comunicar instantaneamente com qualquer pessoa e mesmo explorar outros planetas.

No entanto, este universo comporta-se como se não existissem Blins, como se não tivesse sido criado por uma inteligência superior. Pior ainda, toda a ciência moderna indica que o universo não pode ter sido criado, que surgiu por um acontecimento quântico que não pode ter causa. Como sabemos que a verdade não contradiz a verdade, e como sabemos que os Blins criaram o universo, é evidente que o estudo do universo em si não pode revelar toda a verdade. Temos por isso que separar dois tipos diferentes de verdade. Isto é revelado a todos os que estudam o Sagrado, mesmo os que desconhecem o verdadeiro caminho dos Blins e seguem outras religiões. Dou aqui como exemplo as palavras de Joseph Ratzinger, líder religioso de um culto semi-monoteísta (os três deuses principais vivem como um só numa espécie de simbiose metafísica):

«Uma resposta já foi trabalhada há algum tempo, à medida que a visão científica do mundo ia gradualmente cristalizando[…]. Diz que a Bíblia não é um livro de ciência natural, nem é esse o seu objectivo. É um livro religioso, e consequentemente não é possível obter dele informação científico-natural.»
[tradução minha]

Evidentemente, isto não pode ser tudo. Como reconhece o próprio Ratzinger, e todas as religiões em geral, não basta separar o conhecimento da natureza do conhecimento espiritual. Há que juntá-los de novo numa síntese que abarque quer a nossa natureza física quer o aspecto blínico da nossa existência. Temos assim que considerar uma hierarquia de verdades. No nível inferior temos todo o universo, milhares de milhões de anos de imensidão, e toda a ciência e tecnologia que permite a nossa vida e sociedade moderna. No nível superior, a Blínia Sagrada, compilação da tradição oral de uma tribo do deserto e que, ao contrário de outras compilações de tradições orais de outras tribos do deserto, nos mostra a Verdade e todo o mistério do Sagrado.

——————————–[Ludwig Krippahl]

3 de Março, 2007 Carlos Esperança

Deus é o cão de guarda das religiões

Deus é uma espécie de cão de guarda que rosna, ladra e ameaça morder os ímpios que acham o Papa e os outros dignitários religiosos uns impostores.

Cada religião tem o seu cão de guarda, mas o dono da fé é o biltre que ocupa o primeiro lugar na fila dos clérigos da religião que promove. É o que diz aos outros clérigos como devem ensinar os clientes a rastejar e a esportular o óbolo.

O Papa e os outros avençados do divino não pregam o que dizem que Deus disse, dizem que Deus afirmou o que eles pregam. Os prestidigitadores da fé precisam de um mito que dê credibilidade às intrujices com que se governam e enganam os supersticiosos.

Se Deus existisse não precisava de tantos intermediários, do bando de cadáveres que lhe metem cunhas a troco de esmolas e orações, da caterva de clérigos que desviam os créus para os ofícios pios e as desgarradas litúrgicas.

Deus é uma desculpa para os crimes da fé, para a vocação totalitária das religiões e para o parasitismo do clero.

Os crentes precisam de ser formatados desde a infância para se sujeitarem à fé dos que a promovem e viverem permanentemente das certezas que lhes impõem. Aos ateus, para o serem, basta-lhes um momento de reflexão e a intermitência da dúvida.

3 de Março, 2007 Carlos Esperança

A confissão

(Clique na imagem, para aumentar)

«Deve o cristão confessar-se, pelo menos uma vez por ano, pela Páscoa da Ressurreição».
(Catecismo da ICAR)

2 de Março, 2007 Carlos Esperança

Deus caiu em desgraça

Deus caiu das alturas onde o medo dos homens e os negócios da fé o colocaram. Andou por lá demasiado tempo, graças à propaganda eclesiástica, à repressão do poder secular e à tradição.

Era difícil aguentar o mito nas alturas sem subverter a lei da gravidade. Deus caiu com o Renascimento, o século das luzes e a vitória da liberdade sobre as teocracias e entrou em coma com a secularização e o laicismo.

Apanhado nas malhas da evolução, sem fazer prova de vida, foi-se o mundo esquecendo dele enquanto alguns padres entraram em histeria e outros mudaram de rumo e de ramo. Só o Islão manteve o Deus violento, cruel e apocalíptico, graças à sobrevivência tribal e à concentração dos meios de produção na mão dos clérigos. A vigilância do clero e o medo do Inferno agravaram a devoção, a demência e o martírio.

Hoje, nas sociedades livres e democráticas, Deus é o papão que assusta as crianças que recusam a sopa, o mordomo invisível do Papa, a quem este atribui a autoria dos despautérios que profere, o abominável mito que os mullahs dizem ser grande e a quem adjudicaram um profeta que deseja ver o mundo rastejar a seus pés.

Se Deus existisse não havia necessidade de o inventar.

2 de Março, 2007 Ricardo Alves

Anticlericalismo não é ateísmo de Estado

«O anticlericalismo não é perseguição a qualquer confissão religiosa ou guerra ao Catolicismo, como crença e como culto, ao seu clero como organização hierarquizada e infalível, encarregada da missão de difundir a fé cristã no Universo. Muito menos comporta a ideia de uma política ateísta, isto é, materialista, de negação e combate aos sentimentos religiosos. Seria absurdo e temerário, inconcebível e revoltante, o Estado tentar aniquilar qualquer crença ou confissão religiosa, todo o culto ou qualquer culto. (…) Não é assim que se compreende o anticlericalismo. O Estado republicano e os seus governos pretendem, simplesmente, proclamar a supremacia do poder civil pelo respeito de todas as religiões e garantir a liberdade de desenvolvimento de todos os cultos, dentro de um Estado que adquiriu a sua plena soberania política e moral.»

(As palavras são de Alberto Xavier, na sua obra de 1912 «Política republicana em matéria eclesiástica»; Alberto Xavier colaborou no governo republicano que legislou a separação entre Estado e Igreja.)

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]
2 de Março, 2007 jvasco

Carros, astrologia, e muita treta.

No Diário de Notícias de ontem [7 de Janeiro] veio noticiado que:

«As companhias de seguros estão a estudar a possibilidade de os signos dos condutores determinarem a forma como conduzem.»

E citam Lee Romanov, que fez um estudo em 100,000 condutores:

«”Fiquei absolutamente chocado. Agora, para mim, é muito menos significativo um condutor mudar de código postal do que pertencer a alguns signos do Zodíaco”, diz Romanov.»

Em primeiro lugar podemos ver a excelência jornalística desta reportagem na tradução de «shocked» para «chocado». Se forem à pagina onde a autora publicita o livro até podem ver uma foto que deixa poucas dúvidas quanto ao seu sexo (aqui). Será que o jornalista nem foi ver o site? Também pode ser culpa do editor, mas certamente não é culpa do editor afirmar que as companhias de seguros estão por trás disto. A autora é dona de um site (InsuranceHotline.com) que dá informações acerca de preços de seguros, e não de uma seguradora, e este «estudo» faz parte do livro que está a vender, intitulado «Car Carma».

Também podemos julgar a magnitude do efeito pela afirmação reveladora: «menos significativo um condutor mudar de código postal do que pertencer a alguns signos do Zodíaco». Para quem pensava que mudar de código postal era uma das principais causas de acidente rodoviário isto deve ser preocupante. Os restantes não terão razão para alarme.

Como escreve o Luis Grave Rodrigues (no Random Precision), é muito improvável que os 100,000 condutores se distribuam de forma exactamente igual pelos 12 signos. Seria importante aqui saber qual a significância estatística destes resultados. Isto, é claro, se fosse coisa para levar a sério. Segundo consta (nos comentários a esta notícia), isto é tudo uma brincadeira da autora para vender o livro:

«The references to astrology are meant to tickle the fancy and Lee had a great time writing this book, purely for your enjoyment.»

Resumindo, a dona de um site sobre preços de seguros escreve um livro que, a gozar, liga a astrologia aos acidentes, e um jornal de grande tiragem em Portugal relata que as companhias de seguros andam a estudar astrologia.

Exactamente:

Que treta!

——————————–[Ludwig Krippahl]

2 de Março, 2007 Ricardo Alves

Os comentários já estão activados

Caros comentadores: as caixas de comentários estiveram desactivadas por razões que nos são totalmente alheias. Acabo de verificar que o problema já está resolvido, como podem verificar na caixa de comentários deste artigo.
1 de Março, 2007 Ricardo Alves

Eis uma excelente ideia

Nasceu na Alemanha uma organização que promove a apostasia face ao Islão. Chama-se Conselho Central dos Ex-Muçulmanos da Alemanha e irá competir com o Conselho Central dos Muçulmanos pela representatividade das pessoas de origem muçulmana residentes na Alemanha. É liderada pela escritora Arzu Toker (de origem turca) e pela advogada Mina Ahadi (de origem iraniana). Arzu Toker declarou publicamente que «como disse Nietzsche, Deus está morto e é uma alegria assumir as responsabilidades por nós próprios». Já estão as duas sob protecção policial, dadas as ameaças de morte que começaram imediatamente a receber. Cerca de 120 pessoas já apostasiaram publicamente.

1 de Março, 2007 jvasco

Entropia e Criacionismo

A segunda lei da termodinâmica é uma das favoritas do criacionismo. A desordem aumenta, tudo se degrada. É a degeneração, a depravação, a desgraça completa. Desde o Dilúvio que não havia nada tão bom. E se a desordem aumenta constantemente, então no inicio teve que ser tudo criado de forma ordenada, ou seja por um deus.

Logo há partida este modelo tem problemas. Precipitam-se a concluir que é o deus deles, que se tornou homem, morreu na cruz, ressuscitou, ditou os dez mandamentos, e assim por diante, o que é muita coisa para apoiar na segunda lei da termodinâmica. Pior, não resolve nada. Se é impossível diminuir a entropia num sistema isolado, tanto faz se o sistema isolado é Universo ou se é Universo+Deus. Esta «solução» é a versão intelectual de varrer o lixo para debaixo do tapete.

E não passa de um mal entendido. Mas vou começar por explicar o que é a entropia. Se não houver fraude, todos os números da lotaria saem com mesma probabilidade. É tão fácil (ou difícil) ganhar com o 13624 que com o 22222. Mas se considerarmos conjuntos de números já pode haver diferenças. Por exemplo, a probabilidade de ser seleccionado um número com todos os dígitos iguais (dez possibilidades) é três mil vezes menor que a de um número com todos os dígitos diferentes (10*9*8*7*6 possibilidades). É aqui que surge a entropia. Se agitamos um punhado de moedas numa caixa de sapatos, todas as configurações exactas (aquela moeda exactamente assim, aquela outra neste sítio, etc) têm a mesma probabilidade. Mas há muito mais configurações no conjunto das «desordenadas» que no conjunto das «arrumadas no meio da caixa», por isso o mais certo é que as moedas fiquem numa das configurações desordenadas.

Agitamos a caixa até estar tudo o mais desordenado possível. Chegámos ao máximo de entropia deste sistema. Agora a caixa aumenta de tamanho mas as moedas continuam onde estão, desarrumadas no meio da caixa. A desordem é a mesma (as moedas não mexeram), mas o máximo de entropia aumentou porque agora podemos desarrumar ainda mais o sistema espalhando as moedas pela caixa maior. É isto que se passa no nosso universo. A singularidade inicial estava no máximo de entropia para o seu tamanho, mas como o espaço-tempo se expandiu imenso o limite máximo de entropia aumentou, permitindo que a desordem continuasse a aumentar até hoje, e por muito tempo no futuro.

A ciência moderna diz-nos que o universo começou no máximo de desordem. Isto não só torna o criador inteligente desnecessário como torna impossível que ele tenha feito o que quer que seja para influenciar o processo. Depois de varrer o lixo para debaixo do tapete aproveitam para dar um tiro no pé.

——————————–[Ludwig Krippahl]