Opinião da Igreja Católica? Não, Obrigado!
Depois do Bispo de Roma, o Papa Rotweiller XVI, ter comparado a prática do aborto ao terrorismo, chegou a vez de um colega seu português, de nome António Montes Moreira, ter comparado o aborto à pena de morte, invocando galhardamente os valores da doutrina cristã e da civilização humana.
A inqualificável falta de dignidade e a chocante desonestidade intelectual da Igreja Católica no que concerne ao aborto, tocam mesmo as raias de um incomensurável absurdo.
É esta mesma Igreja, que agora se vem arrogar ter uma palavra a dizer na sociedade portuguesa no próximo referendo sobre a despenalização do aborto, que sempre foi contra qualquer forma de planeamento familiar que não passe pela contagem dos dias ou pela filiação na Opus Dei.
É esta mesma Igreja que, enquanto clama pelos valores da vida humana, organiza queimas rituais de preservativos e assim se torna cúmplice das terríficas taxas de disseminação da SIDA, principalmente em África.
É esta mesma Igreja que não hesita em achincalhar os sentimentos religiosos dos seus próprios fiéis com a publicação de panfletos com a mãe das suas divindades a chorar, a mesma semi-deusa que há décadas utiliza como instrumento e fonte de receita financeira numa das maiores fraudes religiosas de que há memória.
É esta mesma Igreja que carrega consigo um passado de ignomínia, uma História de sofrimento, de sangue e morticínio, que é sinónimo de atraso social, cultural e civilizacional, que se distingue pela sua visão suja e pecaminosa, típica dos mais abjectos tarados sexuais, sobre tudo o que diga respeito a sexo, que sempre sobrevalorizou a sua doutrina e o seu catecismo à própria vida humana, enquanto persiste em desprezar a mulher, quer na sua própria condição quer até como ser humano.
É esta mesma Igreja para quem o sexo é simplesmente sinónimo de «pecado», para quem amar é «pecar», que não concebe que o seu próprio Deus em visita aos homens pudesse ter sido concebido num acto de amor, que não permitiu sequer à mãe desse seu Deus o privilégio de amar, uma vez mais trata a mulher como um mero objecto, um ser humano de segunda ou terceira categoria a quem não permite sequer o livre arbítrio, a escolha ou a determinação do seu próprio corpo, e a quem antes impõem uma opção pré-determinada pela sua doutrina e pelos seus valores medievais, ainda que isso signifique o drama e o risco de vida do recurso ao aborto clandestino.
É esta mesma Igreja, que proclama os valores de um Deus tirano, impiedoso e sanguinário e a quem, borrada de medo, louvaminha em rituais de amesquinhamento absolutamente desprezíveis e indignos de seres humanos com um mínimo de respeito por si próprios, que se acha agora no direito de interferir na sociedade portuguesa, num assunto em que estão em causa estritos valores éticos.
Porque, de facto, é preciso uma lata gigantesca e um desplante sem fim para que um responsável eclesiástico católico venha invocar os valores da doutrina cristã e da vida humana para comparar o aborto ao terrorismo ou à pena de morte, quando essa mesma doutrina cristã admite precisamente… a pena de morte!
Que estes energúmenos de sotaina, com ou sem sapatinhos vermelhos, usem a arma da desonestidade intelectual para explicarem o seu relativismo moral, isso ainda admito.
Afinal, é disso que eles vivem.
O que não consigo entender é a cumplicidade tácita que tanta gente (quero crer, apesar de tudo, que de boa fé) tão cega a acriticamente ainda lhes entrega.
(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)