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Mês: Dezembro 2006

3 de Dezembro, 2006 Carlos Esperança

O Vaticano é a lavandaria das almas

O Vaticano é uma enorme lavandaria onde se lavam os pecados e se branqueia a alma.

Nas sucursais, espalhadas pelo mundo, basta um padre, que não seja maneta, e uma cruz em bom estado, para branquear os pecados e varrer o lixo da alma dos arrependidos.

A confissão é a barrela da alma. É a limpeza dos pecados que conspurcam uma peça, só visível ao microscópio da ICAR, cuja desinfecção se faz na oficina da marca.

A recitação do credo é a benzina dos pecados veniais, enquanto o acto de contrição é a lixívia dos mortais. Mas, para uma limpeza a seco, sem que a alma encolha ou desbote, nada melhor do que a compra de indulgências e o resgate das impurezas em numerário.

Não há pecado cujo perdão resista a uma esmola avantajada, patifaria que o ouro não indulte, crime que o dinheiro não absolva.

Fica mais caro lavar um sacramento do que um pecado. Anular o matrimónio custa uma fortuna, absolver uma velhacaria basta a esmola, e um pai-nosso para disfarçar a cobiça eclesiástica.

Antigamente, quando havia Purgatório, era a missa o combustível que punha em marcha a alma de um defunto. Com menos de trinta, patinava na lama e não arrancava. Só uma missa rezada por trinta padres tinha força equivalente e era capaz de fazer levantar voo a uma alma atolada no lodo do Purgatório e pô-la a voar em direcção ao Paraíso.

Não há detergente mais eficaz do que o vil metal nem música que desvaneça o divino como os acordes das moedas a tilintar nas bandejas das igrejas. Deus não é o criador do mundo, é o banqueiro e patrão do clero.

O baptismo é a primeira barrela da alma e a extrema-unção a última limpeza das nódoas de um cristão. Com os santos óleos, a alma do defunto voa para o Céu, limpinha, para não ferir a pituitária divina. Vai lavada, passada e engomada com certificado de garantia do asseio que o último sacramento confere.

2 de Dezembro, 2006 Palmira Silva

China executa fundador de seita evangélica

Cultos esotéricos e muitas vezes violentos não são novidade na História da China, como é exemplo a Sociedade do Lótus Branco, um misto entre budismo messiânico (Maitreya) e maniqueismo, que se tornou proeminente pelo seu papel na Revolta do Lótus Branco (1786-1804) que resultou na queda da dinastia Qing. Aliás, estas seitas do milénio, que acreditam na volta de um messias (neste caso Buda Maitreya) estão na base da maioria das quedas das dinastias governantes, desde os «Turbantes amarelos» que derrubaram a dinastia Han até às revoltas de Taiping – a sociedade Nian por trás desta revolta contra a dinastia Qing (1850?64) é considerada uma «reencarnação» do Lótus Branco – e Boxer – mais uma vez fomentada pelo Lótus Branco agora na versão Yihequan (1899-1901), – que abriram caminho ao comunismo.

Na realidade, desde os primórdios da China, que o «Mandado dos Céus», um conceito chinês utilizado pela primeira vez pela dinastia Zhou e depois por todos os imperadores chineses, é invocado para justificar o poder temporal: os governantes são abençoados pelos céus mas se não governarem bem os céus ficam desagradados e o «Mandado» será oferecido a outrem.

O vácuo ideológico deixado pela falência do comunismo neste país tem vindo a ser preenchido por um interesse fanático na religião, especialmente nas comunidades rurais, onde a qualidade de vida é francamente baixa e em que muitas seitas, especialmente evangélicas, prometem saúde – em zonas em que o estado se demitiu das suas responsabilidades em termos de cuidados básicos de saúde- prosperidade e a certeza do «arrebatamento» no Apocalipse que afirmam estar prestes a chegar. Tudo a troco de dinheiro, lealdade à seita e secretismo absoluto.

De facto, como indicou o Francisco, o Estado controla estritamente as religiões, pelo que este interesse pelas religiões traduz-se na clandestinidade da maioria destas seitas, que operam maioritariamente nestas zonas rurais empobrecidas, e onde a competição entre seitas atinge níveis de violência mortais.

As autoridades chinesas executaram na passada semana pelo menos 12 membros, incluindo o líder e fundador, da «Three Grades of Servants Church», que com a sua rival «Eastern Lightning» são as duas seitas evangélicas com mais seguidores na China. Os muito agressivos métodos de angariação ( e manutenção) de clientes da primeira, que resultaram na morte de 20 membros da sua rival, estão na base das condenações.

2 de Dezembro, 2006 Carlos Esperança

O Papa na Turquia

Depois de ter colocado respeitosamente uma coroa de flores em homenagem a Kemal Atatürk, o pai da Turquia moderna, que proibiu o uso público dos símbolos religiosos, Portugal espera que B16 repita o gesto em relação a Joaquim António de Aguiar e Afonso Costa, vilipendiados pelo clero da sua Empresa.

Num gesto de coerência, o Papa B16 defendeu a entrada da Turquia na União Europeia e – presume-se -, terá amaldiçoado um cardeal reaccionário de nome Rätzinger, que foi o chefe do Santo Ofício no anterior pontificado, adversário de semelhante ideia.

Na Mesquita Azul, o Sapatinhos Vermelhos, que crê tanto em Deus como os redactores do Diário Ateísta, recolheu-se em oração, virado para Meca, mostrando que sabe geografia e o lado de que Deus sopra.

Antigamente Deus estava em toda a parte, mas a melhoria das condições higiénicas e o aparecimento da lixívia, removeram-no para o Céu, cuja localização se ignora, e para Meca onde o odor das grandes peregrinações ainda o conserva.

Se Atatürk fosse vivo obrigaria B16 a vestir-se como as pessoas normais e a conter-se no tráfico da fé, remetendo as negociações religiosas para a esfera particular. Assim, com o circo mediático montado nesta viagem, as negociações fizeram-se em público e decorreram com a presença da comunicação social.

Cuidado com os dirigentes religiosos. Não é a liberdade que procuram, é a imposição da fé através dos meios persuasivos que ilustram as páginas mais negras da humanidade.

1 de Dezembro, 2006 fburnay

Lembram-se da Laicidade?

Lembram-se da Laicidade?

Muitos portugueses torcem o nariz a tudo o que cheire a laicidade. Acham provavelmente que o laicismo veio para lhes tirar a sua religião e para lhes dizer que não há nada de sagrado na sociedade, para acabar com as procissões e com os seminários.

O Laicismo não serve para nada dessas coisas. Serve para manter a religião afastada dos poderes do Estado para que todos os cidadãos possam viver cada um a sua religiosidade em igualdade de direitos independemente do tipo de culto que praticam.

Mas não só. A Laicidade serve também para proteger as religiões de interferências do Estado. Não cabe ao Estado dizer o que é ou deixa de ser religião, qual delas merece maior atenção nem usar a religiosidade dos cidadãos como factor discriminatório.

A todos os católicos que se esquecem desse outro lado do Laicismo peço-lhes que olhem para a China, onde é o Estado que ordena os bispos católicos independentemente do que os crentes possam pensar disso. Eu até acho possível e legítimo que, em gesto de anátema, alguns crentes decidam por sua mão ordenar um bispo à revelia do Vaticano. Isso já tem acontecido e deu origem a cismas e divisões de cultos. A questão é que não pode ser o Estado a fazê-lo. Na China não há liberdade religiosa porque o Estado não actua de forma laica. Espero que tristes exemplos como este sirvam ao menos para lembrar que a Laicidade é algo de bom para os crentes.

1 de Dezembro, 2006 jvasco

Sorte ou injustiça?

Há quem diga que devemos agradecer a um deus aquilo que temos [..]. Eu tenho muito porque estar satisfeito com a minha vida. Vou ao supermercado e compro o que me apetece, gosto do meu trabalho, tenho saúde, e uma grande família de malta porreira. Tive muito mais sorte que os milhões de doentes, famintos, desabrigados, estropiados, órfãos, que sofrem por todo o mundo. E admito: não é justo. É injusto que uns corram cem metros em menos de dez segundos e outros nasçam sem pernas, ou que uns sejam compositores geniais e outros surdos. Mas ao menos é uma injustiça cega, como a lotaria. Calha a uns como podia ter calhado a outros.

Mas se a lotaria está viciada é uma injustiça terrível e maldosa. Se é por cunha que uns são corredores exímios e outros paraplégicos, que uns vivem felizes e outros sofrem, é revoltante. Se eu vivo bem enquanto outros morrem de fome e doença porque um deus puxou os cordelinhos do universo para me beneficiar à custa deles não estou nada grato. Nem percebo como se pode estar de boa consciência pensando que é assim.

——————————–[Ludwig Krippahl]

1 de Dezembro, 2006 Palmira Silva

Dia Mundial de Luta contra a Sida



Desde que o Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA) foi identificado pela primeira vez há 25 anos, já causou a morte de 25 milhões de pessoas, das quais 2,9 milhões ocorreram este ano. As estimativas da ONUSIDA (Programa Conjunto das Nações Unidas e da Organização Mundial de Saúde sobre o VIH/SIDA ), indicam que existem actualmente 39,5 milhões de pessoas com o vírus da SIDA. Estes números podem ser uma estimativa conservadora já que de acordo com o relatório epidemiológico do VIH/SIDA de 2006 que acaba de ser divulgado, apenas 10 por cento das pessoas infectadas pelo VIH conhecem o seu estatuto serológico.

A epidemia de SIDA é particularmente dramática em África, onde se estima que 2.8 milhões de pessoas foram infectados em 2006. Na África sub-sahariana, cerca de 59% dos infectados são mulheres, o que é extremamente preocupante de per se mas também porque menos de 10% das mães seropositivas têm acesso aos medicamentos que previnem a transmissão do VIH ao filho.

O aparecimento do vírus HIV forçou uma mudança sem precedentes na forma com a sexualidade é discutida na praça pública. Para uma prevenção eficaz desta epidemia, um dos maiores flagelos da história da humanidade, é obrigatório falar sobre sexo – e sobre os preservativos, a forma mais eficaz de deter o progresso das infecções -, obrigação que deveria ser assumida pelas entidades públicas especialmente a nível dos profissionais da saúde (públicos e privados) e educadores.

Mas as indispensáveis campanhas de informação têm sido boicotadas nos países em que os prosélitos de Deus detêm poder político já que estes se opõem tenaz e veementemente a todos os programas de educação sexual e sobre o uso de preservativo, contrapondo como alternativa as respectivas homilias de desinformação e mentiras grosseiras, nomeadamente as mentiras que especialmente a Igreja Católica dissemina sobre a ineficácia do execrado preservativo.

De facto, a condenação católica do uso de preservativos, «tanto como medida de planeamento familiar, como em programas de prevenção da SIDA», associada a campanhas de mentira deliberada sobre o seu uso, nomeadamente em África em que responsáveis locais, para além de organizarem orgias de fé queimando preservativos, asseveram que é o preservativo o culpado pela disseminação da SIDA, tem sido desde sempre alvo de críticas, inclusive da Organização Mundial de Saúde.

De facto, a Igreja Católica e o actual Papa em especial – enquanto Raztinger considerou inadmissível o uso de preservativos – condena o uso do preservativo como profilaxia da SIDA, ou seja, é contrária ao uso de preservativos (e qualquer método contraceptivo), mesmo no caso de casais em que um dos cônjuges está infectado com o HIV.

Decorreu esta semana em Roma a XXI Conferência Internacional do Conselho Pontifício para a Pastoral da Saúde, que decorreu em Roma, sob o tema «Os aspectos pastorais dos cuidados a ter com as doenças infecciosas». No item SIDA ficámos a saber que a «a Igreja tem 26,7% das unidades existentes específicas para o tratamento da Sida» – em África a percentagem é substancialmente maior -, isto é, que em mais de um quarto destas unidades, que deveriam não só tratar como informar, os infectados são desinformados e exortados a não usarem preservativos, garantindo a perpetuação da doença.

Apesar das esperanças dos católicos normais de que o documento de 200 páginas em análise na ex-Inquisição resulte no fim da proibição da Igreja do uso de preservativo por pessoas infectadas pelo vírus (o único ponto em análise), a análise do papado de Ratzinger – que há pouco mais de 2 meses criticou a sociedade ocidental por se preocupar e dispender fundos com minudências, como políticas de saúde ou de combate à exclusão social, em vez no que deveria ser realmente importante: a evangelização – permite-me prever que a Igreja Católica continuará, 25 anos depois do início do flagelo, «o maior obstáculo na luta contra o HIV/SIDA».

Para que os objectivos da ONU de erradicação da doença sejam cumpridos é imprescindível que todos, governos, crentes de boa vontade e não crentes, se empenhem em combater este obstáculo!