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8 de Dezembro – II

O final do século XIV e o século XV marcaram o fim da supremacia absoluta da Igreja de Roma na Europa. Para além da ameaça que o conhecimento científico leigo apresentava, esta viu-se confrontada com a Reforma protestante, despoletada pelo empenho que Leão X devotou à construção da Basílica de S. Pedro, intento iniciado em 1510 pelo papa anterior, Júlio II, que lançara a Indulgência do Jubileu para esse fim.

Leão X concentrou a recolha de fundos para a edificação da sumptuosa Basílica no comércio intensivo de «indulgências», perdão garantido para todos os pecados possíveis e imagináveis, passados, presentes ou futuros, comércio esse que atingiu dimensões e contornos que escandalizaram o então monge agostiniano Martinho Lutero.

Também ajudou à Reforma protestante e consequente perda de poder da Igreja Católica o nepotismo dos papas precedentes, especialmente Alexandre VI (1492-1503), nascido Rodrigo de Bórgia e pai do infamemente conhecido César Bórgia, que deixou Roma refém do caos, da corrupção e da violência, algo absolutamente evidente para Lutero durante o Jubileu de 1500 lançado por este Papa.

O Jubileu seguinte, em 1525, decorreu assim em plena crise religiosa, com as reivindicações de Martinho Lutero a despoletar a crítica e o reconhecimento generalizado em toda a Europa da ganância e corrupção do papado. O queda do poder de Roma acelerou-se com o desmembramento das igrejas, primeiro na Alemanha e Inglaterra e depois em todo o norte da Europa.

O Papa Paulo III (1534-1549), um dos papas mais nepotistas, que separou Parma e Piacenza dos Estados Pontifícios para criar um ducado independente para o seu filho Pier Luigi, esforçou-se por remediar a situação. Para combater o conhecimento científico fora dos auspícios da Igreja formou em 1540 a nova ordem dos jesuítas ou Companhia de Jesus.

Para reafirmar as doutrinas católicas tradicionais e fazer frente à reforma protestante que se tinha espalhado por toda a Europa, com vários reformadores a reinterpretar o cristianismo para além de Lutero, como Ulrico Zuínglio, Guilherme Farel, Filipe Melanchton, João Calvino e João Knox, convocou em Dezembro de 1545 o Concílio de Trento, que marcou a Contra-Reforma.

A última sessão do Concílio de Trento decorreu no dia 4 de Dezembro de 1563. Nesse dia foram lidas todas as decisões tridentinas, formalmente aprovadas pelo Papa Pio IV em 26 de janeiro de 1564.

Para além de reafirmar a doutrina da transubstanciação, defender a concessão de indulgências, aprovar as preces dirigidas aos santos e de insistir na existência do purgatório, a profissão de fé tridentina marca a ascendência de Tomás de Aquino, isto é Aristóteles, no catolicismo. Assim, a doutrina é definida sob um ponto de vista teológico, imiscuindo-se, por outro lado, no domínio científico. A Terra imóvel, centro do mundo, torna-se palavra do Evangelho. Os Santos Padres arrogam-se ao direito de decidirem acerca de tudo, mesmo em matéria «científica», e quem passe para lá destes ditames incorre a partir do Concílio de Trento nas sanções mais severas.

Por outro lado, a preocupação dominante do concílio de Trento, que ignorou totalmente os fiéis e as pessoas em geral, é a afirmação do poder de Roma através da regulação total das sociedades. Regulação intolerante conseguida através de uma doutrina (a «ortodoxia») consagrada numa liturgia rígida e ditando as leis pelas quais as sociedades se deviam reger, condensadas nos 2414 cânones do primeiro Código de Direito Canónico de 1917.

Aos leigos só era reconhecido o direito de «receber» os meios necessários à salvação da alma, ministrados pelos prelados da Igreja de Roma, claro. Considerações de felicidade ou bem estar terrenos são completamente ignoradas.

De forma a assegurar a hegemonia papal e uma vez que as suas ambições de poder temporal absoluto não foram satisfeitas, os papas utilizaram Concílio de Trento para assegurar o poder «espiritual» do Vaticano centralizando todo o poder da Igreja no papado.

(continua)

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