In memoriam Mario Cesariny
Cruzeiro Seixas,Mário Henrique Leiria, Natália Correia e Mário Cesariny de Vasconcelos na galeria Otollini, por ocasião da exposição «O cadáver esquisito e pinturas colectivas no meio século da Revolução Surrealista», Fevereiro de 1975.
«O Homem só será livre quando tiver destruído toda e qualquer espécie de ditadura religioso-política ou político-religiosa e quando for capaz de existir sem limites»
Mário Cesariny, declarações reproduzidas em «A única real tradição viva», que o próprio Cesariny reuniu no substancial «A intervenção surrealista» (Assírio & Alvim, 1997).
«O ex-surrealista, o rigoroso e ateu e anti-clerical Mário Cesariny de Vasconcelos»* faleceu esta madrugada com 83 anos.
Com Alexandre O’Neil, António Pedro, José-Augusto França, Marcelino Vespeira, Moniz Pereira, António Domingues e Fernando de Azevedo fundou o Grupo Surrealista de Lisboa, um movimento inspirado no lançado, em 1924, pelo francês André Breton – que Cesariny conheceu em Paris quando frequentava a Academia de La Grande Chaumière- que se propunha a «mudar a vida» e «transformar a sociedade».
Um artista polivalente, com uma extensa obra plástica e poética pontuada de um corrosivo humor, Cesariny foi o dinamizador da prática surrealista em Lisboa, não só com a criação do referido grupo como de «antigrupos» – como Os Surrealistas, com Henrique Risques Pereira, António Maria Lisboa, Fernando José Francisco, Carlos Eurico da Costa, Mário-Henrique Leiria, Artur do Cruzeiro Seixas e Pedro Oom – com a mesma orientação mas questionando e procurando um grau extremo de espontaneidade, objectivo que permeia toda a sua obra poética.
Para Cesariny, homossexual assumido, o amor, «a única coisa que há para acreditar», é «o único contacto que temos com o sagrado. As igrejas apanharam o sagrado e fizeram dele uma coisa muito triste, quando não cruel».
*in Pacheco versus Cesariny – Folhetim de feição epistolográfica, Luiz Pacheco, Editorial Estampa, 1974.