Investigação em células estaminais na Europa
No passado dia 15 de Junho os deputados do Parlamento Europeu votaram o aumento do orçamento comunitário para a investigação científica e resistiram aos esforços envidados pelos países mais católico-dependentes para que fosse proibido o financiamento de investigação em células estaminais embrionárias. A decisão teria de ser ratificada pelos ministros da Ciência para depois voltar ao Parlamento para uma segunda leitura.
No início do mês, numa manobra explícita de pressão política para boicotar essa decisão, o expoente da tolerância, honestidade intelectual e demais «virtudes» católicas que dá pelo nome de Alfonso Lopez Trujillo, o cardeal responsável pelo Conselho Pontifical da Família, fez saber que pretende que a excomunhão latae senentiae, isto é automática, seja aplicada aos cientistas que trabalham com células estaminais assim como aos políticos que aprovem leis permitindo a investigação em células estaminais.
As ameaças do Vaticano não surtiram efeito e hoje soubemos que os ministros da Ciência da União Europeia concordaram com a decisão e assim parte do orçamento europeu para ciência será devotado a investigação nesta área. No entanto, a decisão tomada é um compromisso na medida em que os ministros concordaram em não financiar actividades que destruissem embriões excedentários da fertilização in vitro (que terão de ser destruídos com outro financiamento) apenas investigação nas células embrionárias resultantes.
Apenas 5 países votaram contra a decisão – Áustria, Lituânia, Malta, Polónia e Eslováquia.
Há exactamente uma semana o defensor «intransigente» do direito à vida de células indiferenciadas (e doentes terminais sem actividade cerebral) G. W. Bush utilizou o seu veto presidencial para impedir que uma resolução análoga do Congresso americano fosse aplicada.
O ministro português, José Mariano Gago, que já anteriormentes se tinha declarado em favor da investigação em células estaminais embrionárias, foi um dos ministros que votou favoravelmente a proposta.
Esperemos que em breve seja alterada a posição oficial do país, expressa em 2004 por Sebastião Póvoas, membro da Missão Permanente de Portugal junto da ONU e representante da posição nacional perante a instituição, que apoiou a proposta (que não foi para a frente) apresentada às Nações Unidas pela Costa Rica – onde se defendia a proibição da clonagem reprodutiva e da investigação e terapêutica com células estaminais.
Já na altura a comunidade científica nacional expressou a sua indignação por não ter sido consultada. Ou seja, por o governo de então, ter tomada decisão baseada em «uma posição política sobre o tema, que é o despacho político elaborado pelo anterior ministro, Martins da Cruz» que o MNE reconheceu ser «uma posição ultrapassada» em vez de consultar quem de direito.
Recentemente, o Presidente da Sociedade Portuguesa de Células Estaminais e Terapias Celulares (SPCE-TC) urgiu o ministro Mariano Gago para que Portugal finalmente produza legislação sobre o assunto, de preferência «algo tipo modelo inglês ou até espanhol seria o ideal. Este último contraria a célebre discussão sobre a dificuldade de fazer certas coisas nos ‘países católicos’»
A decisão hoje tomada é mais um indicativo que de facto a Europa está no bom caminho, o caminho da laicidade, sacudindo nesse percurso as teias de aranha obscurantistas impostas pela Igreja de Roma.