Música sacra?
Sempre achei curioso que muita da música reputadamente «sacra» tenha sido escrita por ateus, agnósticos ou panteístas. E mais curioso ainda que se assuma como dado adquirido que os artistas que a compuseram seriam necessariamente cristãos que expressavam em música a sua devoção fervorosa. No entanto, ninguém pensaria que, por exemplo, Botticelli ou Tiziano, o maior pintor da escola de Veneza, que pintaram profusamente cenas da mitologia greco-romana, eram pagãos adoradores de Baco, Vénus, Júpiter e restantes deuses.
De facto seria espantosa a quantidade de Te Deum, Requiem, Missa Solemnis, Stabat Mater e demais música sacra sortida, escrita por não teístas, obviamente sem alguma inspiração «divina», não fora o facto de nesse tempo para um artista sobreviver precisar ou de um patrono rico ou de escrever música por encomenda. Os únicos com dinheiro para tal faziam parte do clero ou da nobreza, a quem convinha estas cultas demonstrações de devoção.
Alguns exemplos de grandes compositores de música sacra não teístas são Ludwig van Beethoven, Berlioz – que a Enciclopédia Católica reclama como «seu» mas na realidade Berlioz era ateísta, como comprovado pelas palavras do próprio na sua correspondência publicada por G. K. Boult (Life of Berlioz, 1903, p. 298) – Johannes Brahms, o compositor do Ein deutsches Requiem, Mozart, Franz Peter Schubert ou Robert Schumann.